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Dispensa e inexigibilidade de licitação

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Por Edgar Guimarães
Atualização:
Edgar Guimarães. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A Administração Pública não produz todos os bens e serviços necessários ao atendimento dos interesses públicos primários e secundários, tendo, na maioria das vezes, de se socorrer no mercado, contratando particulares, pessoas físicas ou jurídicas, com capacidade para suprir estas demandas.

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Diferentemente dos particulares que gozam de total liberdade quando pretendem adquirir, alienar, locar bens, ou ainda contratar a execução de determinada obra ou a prestação de determinado serviço, a Administração Pública, por celebrar contratos no interesse de terceiros, no caso, dirigidos à satisfação do interesse público, deve anteceder suas contratações de uma competição que assegure igualdade de condições na disputa a todos os interessados que demonstrarem capacidade para executar satisfatoriamente as prestações contratuais. Essa competição é denominada de licitação.

A licitação, dentro dessa ideia, consiste no processo administrativo por meio do qual a Administração Pública, assegura a igualdade de participação a todos os possíveis interessados, seleciona a proposta mais vantajosa ao interesse público, conforme regras previamente definidas e divulgadas.

No plano infraconstitucional este panorama, por óbvio, não poderia ser diferente. Assim, a Lei nº 14.133/2021 estabelece normas gerais de licitação e contratação para a Administração Pública direta, autárquica e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e abrange, igualmente, os órgãos do Poder Legislativo e Judiciário da União, dos Estados e do Distrito Federal e os órgãos do Poder Legislativo dos Municípios, quando no desempenho de função administrativa, bem como os fundos especiais e as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela Administração Pública.

Assim, ao contratar com terceiros, impõe-se ao poder público a obrigatoriedade de instaurar previamente a competição entre os eventuais interessados, por meio da licitação pública. A contratação direta, ou seja, sem licitação, se constitui, então, em exceção a esta regra de caráter geral.

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Com base nessa ordem de ideias, a licitação não é o único caminho pelo qual a Administração Pública celebra contratos. Não se deve olvidar, como afirmado, que a regra a ser observada quando o Poder Público contrata com terceiros é a instauração prévia da licitação. Todavia, pode o caso concreto se subsumir a uma das hipóteses legais de licitação dispensada, dispensável ou inexigível, fato este que autoriza o afastamento do processo licitatório permitindo a consequente contratação direta[1].

Só faz sentido o legislador excepcionar a aplicação de uma regra que decorre diretamente da Constituição quando essa regra não se revela a solução ótima para o atendimento de uma determinada situação fática.

O artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal consigna expressamente o dever de licitar e determina que a licitação é a regra geral a ser observada por ocasião das contratações públicas, mas, por outro lado, o mesmo dispositivo constitucional remete o operador do direito à legislação ordinária ao mencionar as exceções a este dever, ou seja, a contratação direta.

Com base nessa competência outorgada pela Carta da Republica, a Lei nº 14.133/2021 consigna três categorias de contratação direta: a licitação dispensada, dispensável e inexigível. Ditas categorias apresentam, cada qual, marcas determinantes da sua aplicabilidade e até mesmo no que respeita a certos aspectos jurídicos e procedimentais.

A licitação dispensada trata de casos de alienação de bens móveis e imóveis, taxativamente fixados na lei, que permitem, a juízo da autoridade competente, a não realização da licitação. Assim, mesmo diante da possibilidade de instaurar o processo licitatório, o legislador oportunizou o seu afastamento.

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As hipóteses referentes à esta primeira categoria estão arroladas no art. 76 (licitação dispensada) e correspondem a situações que autorizam o agente público a, de plano, não licitar.

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As disposições constantes do art. 75 dizem respeito a licitação dispensável e, em sua maioria, comportam a opção entre licitar e dispensar o certame, sempre mediante a devida, suficiente e necessária motivação. Isso fica claro quando se infere situações consignadas neste artigo em que o legislador, objetivando assegurar maior agilidade à contratação, por exemplo, previu o afastamento do processo licitatório, ainda que presente a possibilidade concreta de sua instauração.

Cabe salientar, ainda, que o rol apresentado pelos incisos do art. 75 da Lei nº 14.133/2021 é taxativo, ou seja, só é possível dispensar a licitação se o caso concreto se subsumir adequadamente a uma daquelas hipóteses legais.

Por fim, o art. 74 dispõe que a licitação é inexigível sempre que houver inviabilidade de competição. Neste caso, o dever de licitar é afastado de forma absoluta e peremptória, ou seja, se a competição é inviável, por conseguinte, a licitação é materialmente impossível de ser instaurada.

Em apertada síntese: (i) na licitação dispensada, basta a ocorrência de uma das hipóteses do art. 76 da Lei nº 14.133/2021 para autorizar o afastamento do dever de licitar; (ii) em se tratando de licitação dispensável, prevista nos incisos do art. 75 da Lei nº 14.133/2021, a rigor, existe a possibilidade de realizar a licitação, todavia, privilegiando outros valores jurídicos, entendeu o legislador ser o caso de reconhecer que a dispensa do dever de licitar revela-se opção mais conveniente e vantajosa; e (iii) consoante dispõe o art. 74 da Lei nº 14.133/2021, a licitação será inexigível quando ficar evidenciada a inviabilidade de competição, tornando o processo licitatório materialmente impossível de ser instaurado.

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Por fim, é necessário posicionar a contratação direta a partir dos vetores fornecidos pela hermenêutica e, também, o conjunto de princípios aplicáveis e que cumprirão a relevante finalidade de possibilitar que a interpretação das regras que lhes são peculiares seja feita de modo harmônico com as demais que constituem o regime jurídico a que pertencem.

*Edgar Guimarães, advogado, pós-doutor em Direito pela Università del Salento (Itália), doutor e mestre em Direito Administrativo pela PUC/SP, Autor e palestrante da Editora Fórum

[1] Conforme artigos 74, 75 e 76 da Lei nº 14.133/2021 e artigos 29 e 30 da Lei nº 13.303/2016.

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