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Diante dos impactos da covid-19 nas franquias empresariais, negociar é preciso

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Por Paulo Brancher , Fabio Kujawski e Isabela de Sena Passau Alves
Atualização:
Paulo Brancher, Fabio Kujawski e Isabela de Sena Passau Alves. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Com a redução do funcionamento de lojas e shoppings em todo o país, fornecedores de bens e serviços buscam alternativas para a manutenção do atendimento aos seus clientes sem o contato pessoal com estes ou com uma restrição severa na forma de interação pessoal. Embora a nova realidade seja temporária, o momento demanda rápida adaptabilidade nas diferentes indústrias.

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A questão pode ser ainda mais sensível para aqueles envolvidos em formatos de comércio que exigem padronização em vendas, como o franchising. A relevância do modelo de negócio para o mercado é grandiosa: em 2018, o setor faturou R$174,84 bilhões, com mais de 1,34 milhão de postos de trabalho e 160 mil unidades franqueadas em operação, mantendo a trajetória crescente em 2019, conforme informações disponibilizadas em website da Associação Brasileira de Franchising.

Contudo, o fato é que a abrupta substituição do ambiente presencial pelo virtual nas franquias pode ocasionar significativas perdas para toda a rede. Isso porque as atividades online comumente são conduzidas apenas pelo próprio franqueador ou seu máster franqueado, já que, neste caso, não é necessária uma estrutura comercial descentralizada.

No entanto, é possível pensar alternativas para os negócios tanto do franqueador, como do franqueado, neste novo cenário. As regras e cláusulas contidas nos documentos que integram o sistema de franquia são bastante específicas e foram, recentemente, modificadas, conforme a nova Lei de Franquias (13.966/2019). Mas as regras e princípios do Código Civil permanecem com a mesma relevância nas relações de franquia, tais como a função social do contrato, a boa-fé objetiva e, especialmente, o equilíbrio contratual.

O equilíbrio contratual tem previsão em diversos artigos do Código Civil brasileiro, cobrindo cenários de descompasso nas relações já estabelecidas. Em especial, as teorias da imprevisão e da onerosidade excessiva guardam relação com os contratos de execução continuada, como é o caso das franquias. É importante alertar que se a prestação de uma das partes se tornar desproporcional e/ou excessivamente onerosa, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, a parte que se sentir prejudicada poderá pedir a revisão ou a resolução do contrato, conforme os artigos 317 e 478 do Código Civil. Contudo, a recomendação geral é a de, antes de buscar a rescisão, priorizar tentativas como negociar, revisar e ajustar o contrato com vistas a manter a relação jurídica já estabelecida, com base no princípio da conservação dos negócios jurídicos.

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Por isto, é fundamental que os franqueadores possam usar este momento em benefício da manutenção da boa relação com sua rede de franqueados, pautada em um comportamento de boa-fé e reafirmação da função social do contrato, sob um olhar de busca de uma execução contratual alcançável e realista para ambas as partes.

Nesse sentido, medidas que podem ser adotadas pelo franqueador ou negociadas entre as partes variam entre a flexibilização e aditamento temporário ao contrato de franquias e de aluguel, quando aplicável;  eventual renegociação ou suspensão de royalties e alugueres; a previsão de premiação extraordinária a franqueados de regiões que conseguiram aumentar a demanda online; bem como ações de treinamento e incentivo ao marketing digital.

Outras alternativas também têm se mostrado efetivas, como a concessão temporária de maior prazo, suspenção ou redução das taxas de manutenção como fundo de propaganda; previsão contratual de determinação de percentual do valor de venda de cada compra online seja enviado para franqueados, podendo inclusive permitir que o consumidor opte pela loja de relacionamento a qual deva ser direcionado o valor da venda.

Como visto, são diversas as medidas jurídicas e comerciais que podem ser adotadas em caráter temporário para mitigar os efeitos causados pela brusca, porém inevitável, evasão de consumidores para transações no ambiente online durante a pandemia, mantendo a relação entre os parceiros.

Além disso, muito embora o franqueador não tenha responsabilidade sobre o insucesso de seu franqueado, a voluntária antecipação, evitando-se disputas para revisão dos contratos de franquia em vigor, pode afastar custos indesejados com judicialização, além de manter os franqueados motivados a continuar no sistema e estimular o espírito de cooperação dentro da rede.

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Portanto, o caminho mais indicado para a tentativa de continuidade das relações de franquia, neste período sensível e atípico, é o da flexibilização e busca por um ponto em comum. Envidar esforços e medidas razoáveis neste sentido poderá refletir na economia de tempo e custos com litígios, em decorrência da preponderância das vendas online nas franquias durante a pandemia. Até porque, vale lembrar que, assim como toda crise, esta também chegará ao seu fim e é melhor poder contar com os parceiros já estabelecidos para uma futura e esperada retomada dos negócios.

*Paulo Brancher, Fabio Kujawski e Isabela de Sena Passau Alves são, respectivamente, sócios e advogada do escritório Mattos Filho

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