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Desembargador do TRT no Rio propôs esquema de propinas a Witzel e Pastor Everaldo, disse delator à PGR

Ministério Público Federal listou em denúncia contra governador suposta tratativa entre Marcos Pinto da Cruz, do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, com Edmar Santos, então secretário de Saúde do Rio e delator da investigação

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Por Pepita Ortega , Paulo Roberto Netto , Fausto Macedo/SÃO PAULO , Rafael Moraes Moura/BRASÍLIA e Caio Sartori/RIO
Atualização:

O desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, Marcos Pinto da Cruz, é acusado pelo Ministério Público Federal de cooptar o governador do Rio, Wilson Witzel, e o presidente do PSC, Pastor Everaldo, para atuarem em esquema de desvio de verbas em troca de propina.

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As acusações constam na denúncia protocolada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Witzel por corrupção e lavagem de dinheiro. O governador foi afastado do cargo nesta sexta, 28, por 180 dias. A mesma investigação prendeu Pastor Everaldo, acusado de instituir uma 'caixinha' de propinas dentro do governo estadual. Marcos Pinto da Cruz não foi denunciado.

As relações entre o desembargador e Witzel foram relatadas pelo ex-secretário de Saúde, Edmar Santos, que firmou delação premiada com a PGR. O delator relata ter encontrado Marcos Pinto da Cruz em um café dias após o magistrado se encontrar com o governador no Palácio Guanabara, em setembro do ano passado, ocasião em que disse ter sob sua responsabilidade no TRT 'algumas questões trabalhistas de empresas da área da saúde'.

No café, Marcos da Cruz prometeu propinas a Edmar Santos. O esquema envolveria organizações sociais (OS) com dívidas trabalhistas judicializadas e que tinham valores a receber do Estado a título de 'restos a pagar'. Ao invés do Estado quitar diretamente às (OS), seria feito um depósito judicial para a quitação dos débitos trabalhistas das empresas.

Segundo Edmar Santos relatou à PGR, o esquema seria vantajoso para as organizações sociais porque é uma oportunidade mais rápida de receber valores devidos pelo Estado.

A proposta, contudo, só daria certo se as organizações sociais contratassem a advogada Eduarda Pinto da Cruz, irmã do magistrado, que ficaria responsável por repassar parte dos honorários pagos pelas organizações sociais aos integrantes do grupo criminoso.

Edmar Santos disse que, 'diante da oferta', levou a proposta ao 'grupo do Pastor Everaldo, que estava estruturado para outros esquemas' envolvendo desvios de verbas públicas. O interlocutor do pastor seria Edson Torres, considerado pela Procuradoria como seu operador administrativo.

"Na ocasião ficou acertado que aceitavam a promessa da vantagem indevida, tendo Edson Torres se comprometido a arrumar uma advogada para servir de elo com o escritório de Eduarda Pinto da Cruz, o que efetivamente fez, tendo indicado uma advogada de nome Leila", aponta a PGR.

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O desembargador Marcos Pinto da Cruz, do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, no Rio. Foto: TRT-1 / Divulgação

A proposta, contudo, não vingou. Uma semana depois da primeira reunião com Edmar Santos, o desembargador Marcos Pinto da Cruz cobrou o então secretário de Saúde que nenhuma organização social havia aceitado participar do esquema.

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Na ocasião, disse o delator, o magistrado destacou que 'sua pressa se dava em razão do recebimento de vantagens indevidas por ele e que parte dos valores ilícios seria pago ao governador Wilson Witzel'. A cobrança foi levada à Edson Torres, que prometeu resolver o 'problema'.

Edmar Santos também relatou ter sido cobrado diretamente por Witzel em reuniões no Palácio Guanabara.

"A cobrança feita pelo governador e o fato de ter sido ele quem apresentou o colaborador a Marcos Pinto da Cruz deixou claro, para o colaborador, que Wilson Witzel estava participando do esquema criminoso, tendo aceitado a promessa de vantagem indevida feita pelo desembargador", acusou a PGR.

Apesar das cobranças, o grupo liderado pelo Pastor Everaldo não chegou a um acordo sobre 'a divisão dos ganhos' com o desembargador. O magistrado, irresignado, teria então oferecido a Edmar Santos que atuasse no esquema sozinho - neste cenário, o delator ficaria com 10% de propina sobre os valores a serem recebidos pelas organizações sociais. O magistrado também ficaria com 10%, sendo que, parte desse valor também seria direcionada a Witzel.

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"Em face da nova proposta de recebimento de vantagem indevida, o colaborador não negou nem aceitou a oferta, tendo mantido o assunto em aberto", afirmou a Procuradoria.

Investigações miram ex-presidente do TRT por decisão favorável a empresa de Mário Peixoto

Ao aprofundar as investigações sobre o desembargador Marcos Pinto da Cruz, a PGR apontou que o suposto esquema proposto pelo magistrado a Witzel e Pastor Everaldo já estava em funcionamento, ao menos, desde 2018 e teria contado com suposta atuação do ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho, desembargador Fernando Antonio Zorzenon da Silva. Os magistrados não foram denunciados.

As investigações miram um ato editado por Antonio Zorzenon em dezembro de 2018 em favor da Atrio Rio Service Tecnologia e Serviços, empresa que atua no mercado de saúde e ligada ao empresário Mário Peixoto, preso pela Lava Jato por integrar 'esquema complexo de uma rede de corrupção' no setor da Saúde no Rio desde 2012.

A empresa também era defendida no processo pelo escritório da irmã do desembargador Marcos Pinto da Cruz, a mesma que, segundo Edmar Santos, seria escalada para atuar no repasse de propinas no esquema proposto a Witzel.

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Extratos bancários da Átrio Rio Service identificaram quatro pagamentos, feitos entre junho de 2018 a janeiro de 2019, ao escritório de advocacia da irmã do desembargador Marcos Pinto da Cruz. Os pagamentos coincidem com decisão favorável do presidente do TRT à empresa ligada a Mário Peixoto.

A PGR reforça a suspeita ao apontar que, entre novembro de 2018 e maio de 2019, o desembargador Marcos Pinto da Cruz recebeu 'grande fluxo de recursos' transferidos da conta de sua irmã, 'denotando ser o real destinatário dos recursos provenientes da Atrio Rio Service'.

"No mesmo período, Marcos Pinto da Cruz fez saques em espécie no montante de R$ 675 mil, tendo dado, após ser questionado pelos funcionários do banco em que mantém sua conta, a pífia desculpa de que pretendia guardar recursos em sua residência", aponta a PGR. "Para justificar as transações financeiras atípicas, Marcos omitiu o fato de ser desembargador do Trabalho, pessoa politicamente exposta, afirmando ser advogado e que seus recursos provém, principalmente, de suas atividades jurídicas".

COM A PALAVRA, O TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO A Presidência do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ) esclarece que ainda não foi comunicada oficialmente pelas autoridades públicas sobre investigações em curso no Ministério Público Federal que visam a apurar condutas de agentes públicos e particulares relativas a possíveis desvios de recursos no âmbito do estado do Rio de Janeiro, conforme se depreende de informações que vêm sendo divulgadas pela imprensa desde a última sexta-feira (28/8).

A despeito disso, em função das notícias veiculadas quanto à existência de possível irregularidade em procedimento para a centralização de execuções no âmbito do TRT/RJ, e considerando o disposto no artigo 8º da Resolução nº 135/2011, do Conselho Nacional de Justiça, a Presidência informa que, por meio de despacho proferido no sábado (29/8), determinou a intimação dos membros do Tribunal citados nas referidas reportagens, para que apresentem manifestação, no prazo de cinco dias.

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A Presidência do Tribunal assegura que adotará as providências necessárias para que os fatos sejam apurados dentro da legalidade, seguindo os princípios da responsabilidade e da ética, bem como do contraditório e da ampla defesa.

Por fim, a Presidência do TRT/RJ informa que a administração do Tribunal está à disposição das autoridades competentes para colaboração com as investigações em qualquer fase, assegurando seu total interesse no esclarecimento dos fatos.

COM A PALAVRA, O DESEMBARGADOR FERNANDO ANTONIO ZORZENON DA SILVA

Sou desembargador do trabalho oriundo da magistratura de carreira, cujo início ocorreu em 1981 com a aprovação no concurso público de provas e títulos para juiz do trabalho substituto do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ).

Em 2017 fui eleito e empossado pelos meus pares no cargo de presidente do TRT/RJ para o biênio janeiro/2017 a janeiro/2019. Durante esses quase 40 anos, minha carreira foi pautada na mais absoluta retidão, não havendo um único ato sequer tomado fora dos estritos limites legais, especialmente durante o exercício da presidência do tribunal, cargo da mais alta responsabilidade na minha trajetória profissional.

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A mídia tem noticiado investigação a respeito de um Ato por mim editado enquanto presidente do TRT/RJ em favor da Empresa ATRIO RIO SERVICE TECNOLOGIA E SERVIÇOS LTDA, que atua na área de saúde do Estado do Rio de Janeiro e seria ligada, segundo noticiado, ao empresário Mário Peixoto.

Pois bem, cumpre-me esclarecer que o TRT/RJ, no ano de 2007, por meio do Provimento Conjunto N. 1/2007 da Presidência e Corregedoria Regional, institui o plano especial de execução, destinado às empresas que comprovem que o volume de penhoras ou ordens de bloqueio de valores mensais decorrentes do cumprimento de decisões judiciais ponha em risco o regular funcionamento da atividade empresarial, mediante requerimento dirigido ao presidente do tribunal.

Desde então, inúmeros planos de centralização de execução foram deferidos pelos diversos presidentes que se sucederam ao longo desses anos, sempre, por óbvio, quando preenchidos os requisitos exigidos e precedido de parecer técnico da equipe de centralização da Coordenadoria de Apoio à Efetividade Processual do TRT/RJ. Destaque-se os planos especiais de execução concedidos aos grandes clubes de futebol do Rio de Janeiro.

Dentre os pedidos de centralização da execução protocolados durante minha gestão como presidente do tribunal, foram deferidos apenas os que preencheram os requisitos necessários.

O plano especial de execução concedido à empresa ATRIO RIO SERVICE TECNOLOGIA E SERVIÇOS LTDA, por meio do Ato N. 198/2018 (em anexo), cumpriu rigorosamente os trâmites e requisitos legais, contando, inclusive, com parecer favorável do Ministério Público do Trabalho, que recomendou a concessão do plano à referida empresa haja vista a razoabilidade da medida.

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Esclareço que, como é a regra no direito processual, os autos do processo que deferiu referido plano de execução são públicos e estão à disposição, no TRT/RJ, de quem desejar consultá-los.

Frise-se, inclusive, que a execução da forma menos gravosa tem previsão legal no artigo 805 do Código de Processo Civil.

Frise-se, ainda, que o presidente do tribunal apenas defere ou indefere o pedido de centralização, passando, caso deferido, à gestão do juiz gestor regional da efetividade da execução trabalhista.

Os valores mensais a serem pagos pela empresa beneficiada com o plano especial de execução são previamente fixados, publicizados e depositados em conta judicial à disposição do juízo centralizador.

No caso específico da empresa ATRIO RIO SERVICE TECNOLOGIA E SERVIÇOS LTDA, os valores constam no artigo 4o do mencionado Ato N. 198/2018. Dessa forma, reitero que a concessão do plano especial de execução trabalhista à empresa ATRIO RIO SERVICE TECNOLOGIA E SERVIÇOS LTDA, em dezembro de 2018, deu-se em obediência estrita aos ditames legais e parecer favorável do Ministério Público do Trabalho.

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É o que me cabia informar.

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