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Debate sobre estratégia de segurança cibernética precisa avançar

Por Wilson Sales Belchior
Atualização:
Wilson Sales Belchior. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

É um desafio exponencial, atualmente, o cenário da segurança cibernética enquanto proteção de sistemas de informação, networks, computadores, dispositivos móveis, softwares, servidores, datacenters contra-ataques digitais que afetam dados sensíveis, transações bancárias, fluxos de negócios, promovendo acessos não autorizados, com danos variados que prejudicam utilizadores e pessoas. Porém, esse cenário deve acompanhar a velocidade das transformações tecnológicas para assegurar a integridade e a privacidade de dados, gestão de riscos e incidentes, conformidade técnica, legal e regulamentar, procedimentos, controles internos, padrões de governança e campanhas educativas.

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A publicação do Decreto nº 10.222/2020 com a Estratégia Nacional de Segurança Cibernética ("E-Ciber") representa um passo importante para ajustar o Brasil à transformação digital dos fluxos econômicos globais em um cenário de hiperconectividade entre empresas, órgãos públicos, pessoas naturais e softwares. Esse cenário ressignifica o ambiente de negócios, as cadeias de produção, as relações de consumo, a transmissão e o acesso às informações, em meio a uma íntima relação entre tecnologias da informação e comunicação e os mais variados aspectos da vida em sociedade. São eles que fazem funcionar a economia e os setores estratégicos, mostrando a premência de serem estabelecidas as diretrizes de governança e aperfeiçoamento da segurança cibernética no país.

O conteúdo da E-Ciber associa-se a um planejamento estratégico na área, dependendo de iniciativas diversas para concretizar objetivos e ações previstas no Decreto. É o que se observa, por exemplo, pela opção de adequar a estrutura do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República através de um lei específica, para que se viabilize a atuação nacional na condução da governança em segurança cibernética. E mais: reconhecimento no eixo "dimensão normativa" da indispensabilidade de elaborar legislação sobre a temática, que estipule diretrizes para todas as partes interessadas, concretizando um marco legal que supra a insuficiência de normas, ao mesmo tempo que alinhe as ações de governança e conformidade; vínculo entre a implementação de ações estratégicas e a atuação de órgãos e entidades da Administração Pública Federal; necessidade de os órgãos públicos e entidades do setor privado "identificarem, planejarem e executarem as ações de sua competência"; intenção de serem firmados acordos bilaterais de cooperação, participação do país em esforços internacionais, negociação de tratados de assistência jurídica mútua e iniciativas de estruturação normativa futura e inclusão de novas tipificações de crimes cibernéticos no Código Penal.

Mas, deve ser sublinhada a relevância de organização das bases para um debate nacional sobre a questão urgente da segurança cibernética por intermédio de conjunto amplo de recomendações sobre um modelo de governança cibernética, ciber-resiliência (compreensão do risco no planejamento estratégico de instituições e organizações), arcabouço legal, participação, parceria e colaboração entre as partes interessadas. Isso com incentivo à cooperação internacional e ao desenvolvimento de soluções inovadoras, as quais demonstram que estes são aspectos relevantes para o país nessa área, a fim de que se atenda, dentre outros objetivos anunciados no Anexo, "um crescimento econômico guiado pela inovação, de modo inclusivo e sustentável".

Na perspectiva das principais ações para a segurança cibernética no quadriênio 2020-2023, poderia ter sido acrescentado um detalhamento das fases de implementação da Estratégia Nacional, incluindo formas de avaliação, desenvolvimento, adaptação, revisão e aperfeiçoamento, linha do tempo para execução, previsão orçamentária, aproximando-se, por isso, de um plano de ação para concretizar os objetivos elencados no Anexo, com a participação de todos os stakeholders, organizando as oitenta e oito iniciativas previstas nas dez ações estratégicas, de forma semelhante ao que está previsto para os planos nacionais na Política Nacional de Segurança da Informação.

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Essa especificidade também poderia ter sido adotada quanto à gestão de riscos. Apesar de o Anexo reconhecê-la como "um dos principais pontos de sustentação da governança cibernética" e um fator chave de proteção, as recomendações são muito amplas - particularmente no que se refere a estabelecer rotina de verificações e compartilhar informações sobre incidentes e vulnerabilidades, contudo sem esmiuçar diretrizes gerais que norteiem a formulação de metodologias próprias de instituições públicas e privadas, como é feito, por exemplo, pelo Bank for International Settlements para infraestruturas do mercado financeiro na área de ciber-resiliência. E, também, pela The European Union Agency for Cybersecurity ao propor uma avaliação nacional de riscos, baseada na identificação, análise e avaliação, com foco em infraestruturas críticas de informação. Na Política Nacional de Ciberseguridad no Chile, em que a gestão de riscos orienta o desenvolvimento de uma infraestrutura de informação robusta e resiliente, há integração de uma agenda de políticas públicas com responsáveis e prazo para execução, além de conter uma descrição de riscos e ameaças.

Espera-se, por isso, que as discussões sobre a segurança cibernética no Brasil avancem no sentido de execução dos objetivos e ações estratégicas. A expectativa é que haja um amplo debate com todas as partes interessadas para que as próximas etapas de implementação da E-Ciber gerem resultados positivos para o país.

*Wilson Sales Belchior é sócio do Rocha, Marinho e Sales Advogados e conselheiro da OAB

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