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De consultor a fazendeiro, o 'homem da mala' de Sérgio Cabral

Carlos Miranda, ex-assessor, sócio e casado com uma prima do peemedebista, recebeu R$ 13 milhões em consultorias suspeitas em sete anos do governo Cabral; após renúncia e inicio da Lava Jato, ele abriu uma agropecuária e virou dono de fazenda

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Foto do author Julia Affonso
Por Ricardo Brandt , Julia Affonso e Mateus Coutinho
Atualização:
 

Em fevereiro de 2007, início do governo Sérgio Cabral (PMDB), no Rio, seu ex-assessor parlamentar Carlos Miranda abriu a GRALC Consultoria Empresarial. Em sete anos da gestão - encerrada em 2014, com a renúncia -, a empresa recebeu R$ 13 milhões em consultorias, muitos desses repasses de firmas suspeita de serem fantasmas.

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Cabral e Miranda foram presos na quinta-feira, 17, alvos da Operação Calicute, última fase da Lava Jato, que integrou pedidos de prisão do juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, e do juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal, em Curitiba. Os dois foram sócios em uma empresa, a SCF Comunicação e Participações.

O ex-governador do Rio é acusado de receber propinas milionárias de empreiteiras sobre obras no Estado que contaram com recursos federais. Carlos Miranda sereia o principal operador de propinas de Cabral, no esquema que, segundo o Ministério Público Federal, foi chefiado pelo peemedebista e teria movimentado R$ 224 milhões de corrupção. Só o ex-governador, seria beneficiário de R$ 7,5 milhões de propinas, que incluía mesadas de R$ 350 mil da empreiteira Andrade Gutierrez e mesadas de até R$ 500 mil da Carioca Engenharia.

 

"Carlos Miranda deixou o ramo de consultoria que lhe rendeu em sete anos ao menos R$ 13 milhões, em 2014, após a renúncia do ex-governador Sérgio Cabral, de forma concomitante com o advento da Operação Lava Jato e passou a ser fazendeiro no interior do Estado do Rio de Janeiro", informa o pedido de prisão de Cabra e Miranda, feito pelo Ministério Público Federal, do Rio.

Peça-chave. Peça central para levar Cabral ao banco dos réus é Carlos Miranda. Suspeito de controlar a "contabilidade paralela" do esquema cuja liderança é atribuída ao ex-governador peemedebista, Carlos Emanuel de Carvalho Miranda era sócio, ex-assessor de confiança e quase da família - ele foi casado com uma prima de primeiro grau.

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Presos na mesma cela, no Complexo de Bangu, na zona oeste do Rio, Carlos Miranda era o quem buscava em mochilas as propinas nas sedes das empreiteiras, usava seus escritórios para receber os valores, comprava jóias para o ex-governar e chegou até a cuidar das declarações de Imposto de Renda de Cabral.

 

"Mais do que apenas casado com a prima do ex-governador e de ter sido seu sócio, Carlos Miranda é o contador da organização criminosa em conjunto com Carlos Bezerra. A confiança que Sérgio Cabral deposita em Carlos Miranda é tanta que ele delega até mesmo a transmissão de sua declaração de imposto de renda, como restou comprovado após a quebra do sigilo fiscal de ambos."

Carlos Miranda trabalha com Cabral, formalmente, em cargos públicos de confiança pelo menos desde 1988, segundo o pedido de prisão. Os dois foram sócios em uma empresa de comunicação durante o mandato do peemedebista como senador, 2003 a 2006.

O "homemda mala" também sócio de um irmão de Cabral na LRG Consultoria e Participações. A empresa de consultoria de Carlos Miranda, a GRALC, em 2014 passou a se chamar LRG Agropecuária.

 

Lavanderia. A GRALC Consultoria, atual LRG Agropecuária, é um dos caminhos que a Lava Jato percorre para chegar ao total de propinas movimentado por ele para Cabral. A empresa tem como sócio, Sônia Ferreira Baptista, também ex-assessora parlamentar de Sérgio Cabral, no Senado.

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Uma das suspeitas, é a que a movimentação de recursos da empresa leve a outros pagamentos de propinas. Os procuradores do Rio destacaram que chamou a atenção na análise da agenda telefônica de Carlos Miranda "a existência de números de representantes de outras empreiteiras".

No entanto, não foi identificada a origem da relação comercial, "inclusive através da declaração de Imposto de Renda da GRALC". "Cita-se, por exemplo, os registros em nome de: Fernanda - constando como pertencente à empresa EIT (empreiteira); Nadia - constando como pertencente à empresa FW (empreiteira); Rreginaldo - constando como pertencente à empresa OAS (empreiteira)."

 

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"É de se ver que Carlos Miranda teve sua carreira desenvolvida em sua íntegra como funcionário público comissionado, por indicação política do amigo Sérgio Cabral", afirmam os procuradores. "Após a posse do político como governador do Estado do Rio de Janeiro, abriu a GRALC Consultoria, empresa que tem como objeto social um vasto espectro de atividade como prestação de serviços de consultoria assessoria elaboração de projetos nas áreas de economia, finanças, gestão empresarial, treinamento, recursos humanos, suprimentos, organizações e métodos, marketing, promoção e organização de eventos podendo adquirir cotas e participações em outras sociedades."

Para os investigadores, "o sucesso no empreendimento chama a atenção". Quebra de sigilo bancário da Receita, sobre a GRALC, apontou que a empresa tinha um único empregado e passou a "receber imediatamente após seu registro na Junta Comercial pagamentos por consultoria na razão de milhares de reais por mês e finda seu faturamento junto à renúncia de Sérgio Cabral do cargo de governador do Estado do Rio de Janeiro".

"Causa espécie, ainda, o fato de que grande parte do faturamento da principal empresa foi proveniente de um mesmo grupo econômico/familiar composto das seguintes empresas do ramo de concessionárias de veículos", diz a força-tarefa.

 

Fantasmas. Foram identificados ainda pagamentos suspeitos para a consultoria de Carlos Miranda, de empresas diferentes, com atividades totalmente distintas, realizaram pagamentos em valores iguais, "desconsiderando a ideia de consultoria de acordo com cliente".

"Pela análise dos e-mails de Carlos Miranda, inclusive aqueles vinculados à sua empresa, constatou-se que não há sequer uma mensagem tratando de assuntos da consultoria que tanto lhe rendeu recursos. E nem se diga que Carlos Miranda não tratava de seus assuntos por e-mail", informa o MPF.

 

Propinas. Na investigação que levou Cabral a cadeia, ele teria recebido, por meio de Miranda, dinheiro em espécie, segundo relataram pelo menos seis executivos, três da Andrade Gutierrez (Rogério Nora, Clóvis Primo e Alberto Quintaes) e três da Carioca Engenharia (Eduardo Backheuser, Rodolfo Muntuano e Tânia Fontenelle).

Os delatores afirmaram que Miranda foi a pessoa indicada por Sérgio Cabral e pelo ex-secretário do Governo do Rio Wilson Carlos para receber propina de 5% dos valores das obras contratadas pelo Executivo fluminense com as empreiteiras.

Trecho do pedido de prisão do Ministério Público Federal. 

"Os depoimentos foram uníssonos em afirmar que Carlos Miranda era a pessoa a quem Sérgio Cabral confiou a coleta e transporte dos valores de propina exigidos das empreiteiras", aponta o Ministério Público Federal. Alberto Quintaes relatou que 'os pagamentos de propina exigidos pelo governo do Estado referiam-se a todas as obras em curso que estavam sendo executadas pela Andrade Gutierrez, dentre elas a do Maracanã, PAC Favelas e Arco Metropolitano'. O executivo declarou na delação premiada que pagava Carlos Miranda em dinheiro vivo.

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