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Crivella diz que juíza que mandou fechar Avenida Niemeyer 'tem uma beleza de parar o trânsito'

Comentários 'machistas' do prefeito do Rio sobre Mirela Erbisti, da 3.ª Vara da Fazenda, provocam reações do presidente do Tribunal de Justiça do Estado e de entidade de magistrados contra 'tentativa de intimidação'

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Por Pepita Ortega e Pedro Prata
Atualização:

O desembargador Claudio de Mello Tavares, presidente do Tribunal de Justiça do Rio, disse nesta segunda, 7, que o prefeito Marcelo Crivella (PRB) 'ataca a democracia' ao criticar a juíza Mirela Erbisti, da 3.ª Vara da Fazenda Pública.

Senador Marcelo Crivella. Foto: Beto Barata/Agência Senado

Ela determinou o fechamento da Avenida Niemeyer em maio último após um deslizamento de terra.

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Em evento na zona oeste do Rio na quinta, 3, Crivella chamou a magistrada de 'teimosa'.

Ele afirmou. "A juíza tem seus 40 anos e é muito bonita, tem uma beleza de parar o trânsito, mas não precisa praticar, né pessoal?"

O prefeito ainda comentou. "A juíza que fechou a Niemeyer é uma juíza que se chama Mirela, ela tem um site na internet que se chama 'Togadas e tatuadas', ela ensina as mulheres a se vestir, como conseguir um namorado, é uma coisa interessante".

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A juíza Mirela Erbisti deferiu o pedido do MP para interditar Avenida Niemeyer. Foto: Instagram/@mirela_erbisti/Reprodução

Os comentários do prefeito provocaram nota de repúdio da Associação dos Magistrados do Estado do Rio. Para a entidade, trata-se de 'uma tentativa do prefeito de pressionar o Judiciário para reverter uma decisão judicial legítima'.

"O caminho certo para se questionar a decisão de fechar a avenida teria sido o recursal", defendeu o desembargador Claudio Tavares por meio de nota. "Ataques pessoais à figura do julgador remetem a tempos obscuros da nossa sociedade. A insatisfação de um governante municipal divulgada na mídia, diante de uma decisão judicial até o presente momento mantida pela instância recursal, consiste em grave ataque à democracia."

Além considerar o 'ataque grosseiro' como 'uma tentativa do prefeito de pressionar o Judiciário para reverter uma decisão judicial legítima, confirmada em segunda instância', a Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro considerou o 'teor machista' da declaração como um agravante.

 Foto: Instagram/@mirela_erbisti/Reprodução

"É inadmissível que um político em cargo público tão importante trate desta forma alguém que, por dever do ofício que exerce, o tenha contrariado", reagiu enfaticamente a juíza Renata Gil, presidente da Associação dos Magistrados do Rio.

A associação ainda defendeu a 'independência' da magistratura brasileira. "Qualquer tentativa de intimidação à Justiça e a seus magistrados será firmemente repudiada por esta Associação e sua presidente."

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A Avenida Niemeyer é uma importante ligação entre a zona sul e a zona oeste, e sofreu com deslizamentos de terra na encosta do morro Dois Irmãos no primeiro semestre do ano. Em fevereiro, duas pessoas morreram quando um deslizamento atingiu um ônibus. Já em maio, novo deslizamento fechou a via e atingiu uma casa, mas ninguém se feriu.

Deslizamento de terra, em fevereiro, deixou duas pessoas mortas na Avenida Niemeyer. Foto: Tânia Rego/Agência Brasil

Por causa dos deslizamentos, o Ministério Público do Rio de Janeiro ajuizou medida cautelar para que o Estado e o município do Rio interditassem o tráfego de veículos no local e vistoriassem o local.

A juíza Mirela Erbisti deferiu o pedido, considerando que 'tragédia não tem data marcada para acontecer nem pode ser adiada em respeito ao prazo do artigo 10 do Código de Processo Civil'.

"O fechamento incontinenti da Avenida Niemeyer é medida imperiosa até que sejam tomadas medidas capazes de garantir a segurança dos cidadãos que ali residem ou por ali transitam."

No dia 25 de setembro, a 13.ª Câmara Cível do TJ do Rio julgou tutela antecipada pedida pela prefeitura para reabrir a avenida. Dois desembergadores decidiram conceder parcialmente o efeito suspensivo ao recurso. O desembargador Agostinho Teixeira pediu vista do processo, o que suspendeu o julgamento.

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Confira a nota da Associação dos Magistrados do Estado do Rio

"A Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (AMAERJ) repudia as declarações preconceituosas dirigidas pelo prefeito do Rio, Marcelo Crivella, à juíza Mirela Erbisti, da 3ª Vara de Fazenda Pública da Capital.

O ataque grosseiro à magistrada representa mais uma tentativa do prefeito de pressionar o Judiciário para reverter uma decisão judicial legítima, confirmada em segunda instância.

O discurso machista do prefeito agrava ainda mais a questão. É inadmissível que um político em cargo público tão importante trate desta forma alguém que, por dever do ofício que exerce, o tenha contrariado.

O Poder Judiciário é um sólido pilar do Estado Democrático de Direito. A Magistratura brasileira é independente. Qualquer tentativa de intimidação à Justiça e a seus magistrados será firmemente repudiada por esta Associação e sua presidente."

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Confira a nota do Tribunal de Justiça do Rio

"A separação dos poderes configura verdadeiro pilar do Estado Democrático de Direito. O Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, reconhecido, anos a fio, como o mais eficiente do país, reafirma que a decisão judicial submete a todos, notadamente aos agentes públicos que exercem mandatos eletivos. A via recursal é a forma correta para combater decisões judiciais das quais se discorda. Ataques pessoais à figura do julgador remete a tempos obscuros da nossa sociedade. A insatisfação de um governante municipal divulgada na mídia, diante de uma decisão judicial até o presente momento mantida pela instância recursal, consiste em grave ataque à democracia. O interesse público está acima de interesses pessoais, políticos e religiosos."

COM A PALAVRA, O PREFEITO MARCELO CRIVELLA

A reportagem buscou contato com o prefeito e aguarda manifestação. O espaço está aberto para posicionamento.

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