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Crise x crise: como sobreviverão as empresas em recuperação judicial

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Por Gabriela Espósito da Silva Ribeiro
Atualização:
Gabriela Espósito da Silva Ribeiro. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Estamos diante de um cenário jamais visto pelo Brasil, onde, em pleno século XXI, o mundo paralisou e se mobilizou em prol da saúde, em razão da pandemia instaurada pela doença covid-19.

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O necessário isolamento social para barrar o contágio (lockdown) apesar de beneficiar a saúde trouxe consequências terríveis para a economia mundial.

Isso porque empresários de pequeno, médio e até grande porte tiveram que "fechar suas portas", trabalhar na modalidade home office, e até mesmo dispensar muitos de seus funcionários.

Um efeito dominó se instaurou. Bancos e demais instituições fomentadoras particulares cortaram linhas de crédito; fornecedores suspenderam a importação e exportação de produtos e matéria-prima e clientes cancelarem seus pedidos.

Assim, as empresas estão suportando grande prejuízo financeiro, não tendo como arcar com suas despesas básicas (aquelas inerentes ao funcionamento da atividade empresária), Bancos e demais credores, e até mesmo com os tributos.

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Nesse sentido, o Governo Federal e os Governos Estaduais providenciaram medidas, por meio de suas instituições financeiras, a fim de minimizar a crise e auxiliar não apenas as pessoas naturais (físicas), mas também os empresários.

O BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento) está ofertando linha de crédito (capital de giro) para negócios com faturamento anual de até R$300 milhões, com limite de financiamento de até R$ 70 milhões por ano.

Classificando as empresas com base na Receita Operacional Bruta Anual, se encaixam em micro empresas aquelas com receita até R$ 360 mil; pequenas empresas aquelas com receita entre R$ 360 mil e R$ 4,8 milhões; e médias empresas aquelas com receita entre R$ 4,8 milhões e R$ 300 milhões.

Para disponbilização do mencionado crédito, o BNDES contará com agentes financeiros credenciados, que podem ser bancos ou uma agência de fomento (lista de instituições disponível no site do BNDES).

Ainda, o BNDES disponibilizará R$ 40 bilhões para dois meses de pagamento da folha de micro, pequenas e médias empresas, nos termos da classificação acima (por receita) com taxa de juros prefixada de 3,75% ao ano e até 30 meses para pagamento, com carência de seis meses para cobrança de juros. Todavia, para ter o benefício, a empresa não poderá demitir, por dois meses, os empregados com salários financiados.

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O Banco do Brasil também disponibilizará R$ 48 bilhões para empresas, distribuídos entre linhas de capital de giro, investimento e antecipação de recebíveis, para companhias de todos os tamanhos.

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No agronegócio, serão R$ 5 bilhões a mais para linhas de comercialização, R$ 15 bilhões para financiamento à produção agropecuária, R$2 bilhões para investimento e R$ 3 bilhões para capital de giro.

Para os produtores rurais, importante destacar que o Banco do Brasil já confirmou estar aberto para atender pedidos de prorrogação dos vencimentos de dívidas por 60 dias, desde que se trate de contratos vigentes e até então adimplidos, limitados aos valores já utilizados.

A Caixa Econômica Federal também dará apoio às micro e pequenas empresas, com redução de juros de até 45% nas linhas de capital de giro, e com taxas a partir de 0,57% ao mês.

Também será disponibilizada carência de até 60 dias nas operações parceladas de capital de giro e renegociação; linhas de crédito especiais, com até seis meses de carência, para empresas que atuam nos setores de comércio e prestação de serviços, mais afetadas pelo momento atual; e linhas de aquisição de máquinas e equipamentos, com taxas reduzidas e até 60 meses para pagamento.

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O Banco Desenvolve SP, que incentiva o empreendedorismo e a geração de emprego e renda, disponibilizará, para empresas do Estado de São Paulo, com faturamento anual entre R$ 81 mil e R$ 90 milhões, R$ 200 milhões em créditos e condições especiais de financiamento. As taxas de juros da linha de capital de giro foram reduzidas de 1,43% para 1,20% ao mês. O prazo do financiamento subiu de 36 para 42 meses, e a carência foi de três para nove meses.

O Governo de São Paulo também disponibilizou, para micros e pequenos negócios (MEIs, MEs, LTDAs e EIRELIs) urbanos e rurais, linha de crédito por meio do Banco do Povo, com redução da taxa de juros de 1% para 0,35% ao mês e prazo para pagamento alongado de 24 para 36 meses, já incluindo o prazo de carência, que aumentou de 60 para 90 dias.

O Banco disponibilizará R$ 25 milhões, e as linhas de crédito vão de R$200 até R$ 20 mil.

Parece-nos, pelos dados acima, que há sim preocupação com o empresário e manutenção da atividade empresária. Porém, as linhas de crédito não estão sendo cedidas para empresas que já estavam em crise, que se agravou ainda mais com a situação atual. Estamos falando das empresas em recuperação judicial.

Recuperação judicial é um regime especial, concedido pelo judiciário, nos termos da Lei 11.101/05, para que empresas em dificuldade financeira, que preencham os requisitos legais, possam renegociar seus débitos diretamente com os credores por meio de apresentação de plano de recuperação judicial, a ser debatido e aprovado em assembleia geral, onde serão previstas novas condições de pagamento, possibilitando a quitação dos débitos e vida nova à empresa.

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Ocorre que, naturalmente, as empresas que ingressam com recuperação judicial ficam sem linha de crédito com os Bancos, pela sua taxa de inadimplência, e muitas vezes por estarem negativadas ou protestadas.

Não seria diferente agora, já que os Bancos privados mantiveram a prática de negar crédito à empresa em recuperação judicial. Então, pergunta-se, qual a postura do Governo em relação à essas empresas?

Não se pode permitir que em um momento de crise, onde todos estão se ajudando, as empresas em recuperação judicial que já estão mais vulneráveis que as demais, passem despercebidas pelas autoridades, sendo certo que nenhum banco está pronto para atender ou responder os questionamentos dessas empresas no momento.

O próprio judiciário está voltando os olhos para a vulnerabilidade, se é que podemos chamar assim, da empresa em recuperação judicial, com a flexibilização das obrigações, primando pela preservação da empresa, um dos, se não o mais importante princípio previsto pela lei.

No processo recuperacional nº 1000809-97.2018.8.26.0177, em trâmite perante a Vara única de Embu-Guaçu/SP, foi possível até mesmo suspender o pagamento de  serviços de energia elétrica, água, luz, gás e internet, pelo período de quatro meses, demostrando que o caixa das empresas em recuperação judicial estão sendo afetados de forma mais pesada.

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E não poderia ser diferente. Nos termos dos indicadores econômicos da Serasa Experian, entre janeiro e fevereiro de 2020, tivemos 175 pedidos de recuperação judicial, e no ano de 2019, 1.387 pedidos, o que demonstra que muitas das empresas brasileiras já enfrentavam situação financeira caótica.

Não restam dúvidas que o Governo precisa nortear essa classe de empresas, com disponibilzação de crédito específico, ou incluindo as empresas em recuperação judicial nas beneficiárias dos créditos já criados, evitando uma onda de falências nunca vista por falta de assistência.

Como não temos posição firme sobre o tema, fica a incógnita e reflexão para que as autoridades possam enxergar as empresas em recuperação judicial, que enfrentam crise dupla e não têm, repita-se, até o momento, nenhuma posição clara sobre os benefícios dos quais poderão usufruir, em relação à disponibilização de crédito para manutenção da atividade empresária, pois, embora em recuperação judicial, ainda cumprem sua função social com a geração de empregos, fomento da economia e pagamento de tributos, merecendo toda a atenção e cuidado.

*Gabriela Espósito da Silva Ribeiro é advogada da DASA Advogados

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