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Crise: oportunidade para melhorar o sistema de proteção empresarial

Por Flavio Galdino
Atualização:
Flavio Galdino. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Há anos tramitam no Congresso Nacional diversos projetos de lei de otimização da proteção da atividade empresarial. Recentemente eles foram reunidos no Projeto 6229/05 que vem sendo heroicamente relatado pelo deputado Hugo Leal e pela senadora Simone Tebet. Foram realizados dezenas de debates e audiências públicas e o projeto foi aprimorado e aproximou-se do consenso. O ministro Toffoli constituiu um comitê no âmbito do CNJ e as sugestões do Judiciário foram colhidas e incorporadas. O Projeto está maduro e o deputado Rodrigo Maia já considerava o tema uma prioridade para o Legislativo em 2020.

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Instaurada a crise, foram apresentados acréscimos para fazer frente à avalanche de problemas que a crise do novo coronavírus está trazendo ao sistema.

Particularmente, tenho diversas críticas ao Projeto como um todo, notadamente quanto à participação do Fisco no processo, que não parece estar bem equacionada e tende a gerar problemas operacionais. Em outras situações seria excelente aprimorar a legislação emergencial com diversas melhorias, mas a vida ensina que o ótimo pode ser inimigo do bom. Países como a Alemanha e a Austrália foram ágeis e já editaram leis - em alguma medida as leis de emergência desses países procuram proteger a atividade empresarial e se aproximam do modelo brasileiro de favor debitoris.

Urge que o Congresso Nacional aprove e a Presidência sancione a lei com brevidade. E que o Poder Judiciário aplique a lei com rapidez e segurança para fazer frente aos efeitos da crise do novo coronavírus.

Por evidente, o projeto não esgota as necessidades emergenciais da Nação. Há inúmeros temas que demandam atenção em momentos críticos, normalmente no sentido de flexibilizar a rigidez de determinados marcos regulatórios, como sejam a redução do furor consumerista, que estimula a contratação e a litigância irresponsáveis, e a atenuação dos critérios anticoncorrenciais, pois momentos assim podem demandar níveis mais elevados de concentração econômica, dentre outros que transbordam a analise a que nos propomos aqui. Entretanto, pelo menos mais dois temas merecem atenção detida.

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Em primeiro lugar, é preciso regular com seriedade a chamada insolvência pública, como acontece em diversos Países. Tivemos um processo de impeachment em razão de irresponsabilidade financeira. A lei de responsabilidade fiscal é desafiada todos os dias e o teto de gastos - que é indispensável em momentos de normalidade econômica - sofre ataques de todos os lados. Parece que a lição não foi aprendida.

Órgãos públicos ineficientes não podem ser mantidos, inclusive e principalmente entes municipais que se multiplicam de forma desordenada. Trata-se de entidades nitidamente inviáveis e que se tornam cabides de empregos de governantes que tangenciam a improbidade. Há em tramitação uma PEC que permite a incorporação compulsória de municípios que não apresentem viabilidade econômica e urge que seja deliberada pelo Congresso.

Além disso, é necessário desenvolver um sistema de decretação de insolvência de órgãos públicos que impeça a infinita e inaceitável sanha de endividamento público, em que um Prefeito deixa as dívidas para o próximo e nenhum deles paga, eternizando a vergonhosa fila dos precatórios.

Em segundo lugar, impõe-se o estabelecimento de um sistema de insolvência individual da pessoa física. Segundo os dados do Sebrae, 99% dos estabelecimentos comerciais brasileiros são micro-empresas. Elas empregam 52% dos trabalhadores com carteira assinada. É plausível que haja pelo menos igual número na informalidade, isto é, pessoas que empreendem sem se valer de alguma forma jurídica. O encerramento de uma atividade empresarial formal ou informal que tenha sido mal-sucedida continua sendo uma via-crúcis intolerável. É preciso ter agilidade na recolocação de quem teve uma infelicidade financeira.

Em uma palavra: a reabilitação econômica tem que ser rápida. Enquanto uma pessoa se vê na condição de pária econômico, ela gera despesa ao invés de gerar receita. Vivendo na informalidade e litigando contra os credores por longos anos, a sua atividade gera muito mais custos para burlar a economia formal e não gera tributos para a coletividade.

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Se vale um depoimento: em mais de vinte anos de atuação profissional advocatícia focada em litígios e reestruturação empresarial, nunca vi uma insolvência individual funcionar direito - as próprias falências empresariais também funcionam mal. Impõe-se a adoção de um sistema ágil de insolvência individual e reabilitação financeira. Momentos de crise são dolorosos, mas também são oportunidades para resolver problemas agudos e crônicos.

*Flavio Galdino é advogado e professor da Faculdade de Direito da Uerj

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