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Créditos tributários decorrentes das taxas e comissões das plataformas de deliveries

Por Bruno Junqueira e Lymara Franco Lemos
Atualização:
Bruno Junqueira e Lymara Franco Lemos. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Há mais de um ano vivenciando a pandemia do novo coronavírus, todos os setores da economia foram afetados, em maior ou menor monta, e tiveram que se adaptar para continuarem em funcionamento, mesmo com o baixo movimento e o medo constante.

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Neste contexto, os empresários dos ramos de bares, restaurantes, farmácias e pequenos comércios encontraram nas plataformas de serviços de entregas delivery uma importante ferramenta de atendimento das demandas dos clientes e um caminho para a amenização da crise financeira enfrentada pelo comércio.

No entanto, para contratar a maioria destes serviços de entregas oferecidos em plataformas digitais é preciso arcar com uma taxa de adesão e comissão, como no caso do iFood - 12% a 27% sobre cada pedido, mais a mensalidade e taxa de entrega. Outras empresas cobram somente uma porcentagem de comissão, como é o caso da Uber Eats - 30% sobre cada pedido -, sem contar nos adicionais de taxa de cartão de crédito, administração e suporte.

Como se já não bastasse a repartição do produto financeiro recebido por pedido, com o surgimento das plataformas digitais, o Fisco Federal, em sua sanha arrecadatória, tem se aproveitado dessas operações para majorar a base de cálculo dos tributos direcionados ao Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Tal ato se mostra manifestamente inconstitucional e ilegal, tendo em vista que as quantias repassadas para o aplicativo digital não se incluem no conceito de faturamento ou receita dos estabelecimentos comerciais.

Para melhor elucidação, é importante observar a previsão legislativa para essas contribuições, bem como a evolução jurisprudencial que deitou luzes acerca do conceito de "receita bruta".

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As contribuições para o PIS e a Cofins estão previstas na Constituição Federal nos artigos 195, § I e 239 e suas respectivas cobranças foram instituídas pelas leis complementares nº 70/1991 (Cofins) e nº 07/1970 (PIS), bem como pelas leis ordinárias nº 9.715/98 e nº 9.718/98, cuja base de cálculo de ambas é a totalidade das receitas operacionais auferidas pela pessoa jurídica.

Ato contínuo, frente aos ditames da Constituição da República de 1988, a base de cálculo do tributo deve refletir com exatidão o fato gerador ou suporte fático.

Assim sendo, observa-se que nestas exações a hipótese de incidência se limita à receita bruta das vendas, que pode ser definida pela expressão faturamento.

Contudo, tem ocorrido a inclusão na base de cálculo dessas contribuições os valores de comissões e taxas, que são repassadas às plataformas digitais como se integrassem o faturamento das empresas envolvidas. Entretanto, tais montantes apenas transitam por suas contabilidades, sem auxiliar no aumento de patrimônio e, por consequência lógica, também não elevam suas receitas ou faturamentos, sendo imediatamente repassados para os aplicativos, ou, a depender da modalidade de contratação, já são descontados pela plataforma.

Dessa forma, considerando que a cada venda efetuada por meio de uma plataforma digital sejam cobradas as contribuições ao PIS e a COFINS sobre o valor total da operação de venda, é possível constatar a majoração indevida da base de cálculo destas contribuições e, portanto, o descumprimento do princípio da capacidade contributiva, insculpido pela Assembleia Nacional Constituinte de 1988 no ordenamento jurídico-tributário pátrio.

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Apesar disso, não se pode admitir que, em razão da multiplicidade de tributos que venham a incidir sobre a mesma base de cálculo, advenha um aumento da base imponível, que é constitucionalmente contemplada.

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Isto porque a base de cálculo tem que guardar correspondência à perspectiva mensurável da hipótese de incidência do tributo. Dessa forma, não se pode admitir que as contribuições do PIS e Cofins incidam sobre uma grandeza que não se exprime no conceito técnico de faturamento.

Repita-se: a base de cálculo deve refletir com exatidão o fato gerador do tributo ou suporte fático!

Lado outro, para não restarem dúvidas quanto à utilização dos termos "receita bruta" e "faturamento", o Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou a sua jurisprudência no sentido de que "a receita bruta e o faturamento, para fins de definição da base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins, são termos sinônimos e consistem na totalidade das receitas auferidas com a venda de mercadorias, serviços ou de mercadorias e serviços, referentes ao exercício das atividades empresariais", precedentes nos recursos extraordinários 346.084-6/PR, 684.092/PR e AgR ARE 1.210.308/RS.

Com efeito, conforme entendimento consolidado pelo Pretório Excelso no julgamento do RE nº 346.084-6, é inconstitucional o § 1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98, que ampliou o conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação contábil adotada, ou seja, tanto a receita quanto o faturamento pressupõem riqueza própria do contribuinte e não de terceiros, como é o caso das quantias repassadas para as plataformas digitais.

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A corroborar com esse entendimento, ainda podemos aplicar, por analogia, o entendimento consagrado pelo STF no julgamento do RE nº 574.706/PR de 15 de março de 2017 - com repercussão geral reconhecida -, que afastou a inclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo do PIS e da COFINS, justamente por se tratar de montante que apenas transita na contabilidade do contribuinte, sem integrar o seu patrimônio ou faturamento, configurando-se ônus fiscal.

Caso essas cobranças indevidas continuem ocorrendo, além da ilegalidade, estaremos diante do instituto do "bis in idem", que consiste na hipótese do mesmo ente federativo tributar duplamente o mesmo fato gerador - algo que somente é permitido se autorizado constitucionalmente, uma vez que as taxas e comissões constituem receita bruta dos aplicativos e são tributadas em suas apurações.

Conclui-se, portanto, que é possível aos contribuintes que se utilizem de plataformas digitais para vender suas mercadorias, pleitear a exclusão dessas exações da base de cálculo do PIS e da COFINS, bem como requerer a restituição dos valores indevidamente cobrados nos últimos cinco anos.

Por fim, impende destacar que essa possibilidade se aplica a todas as empresas, independentemente do regime tributário adotado, inclusive às empresas do Simples Nacional, cuja exclusão poderá se dar de toda a base tributável considerada como receita bruta.

*Bruno Junqueira, advogado tributarista e sócio do escritório BLJ - Consultoria Tributária e Empresarial

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*Lymara Franco Lemos, advogada tributarista no escritório BLJ - Consultoria Tributária e Empresarial

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