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Covid-19: órgãos de persecução penal versus postura preventiva da iniciativa privada

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Por Redação
Atualização:
Daniel Laufer e Maria Francisca Accioly. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Ao tempo em que médicos e enfermeiros se dedicam para salvar as vítimas acometidas pela pandemia do novo coronavírus, os órgãos de repressão penal, nomeadamente o Ministério Público e a Polícia Judiciária, cumprem o seu papel ao verificar - de lupa em mãos - a observância dos ditames legais dos contratos públicos de fornecimento de insumos médico-sanitários e das doações próprias do momento presente.

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A Lei nº 13.979/2020, popularmente conhecida como "Lei do Coronavírus", e a Medida Provisória 961/2020 disciplinam, respectivamente, (i) o procedimento para aquisição de bens, serviços e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública e (ii) a autorização de pagamentos antecipados nas licitações e nos contratos em determinados valores bem como a adequação dos limites de dispensa de licitação, entre outras medidas.

As normas contidas nestas disposições legais têm como objetivo nortear os gestores públicos e os contratados durante o estado de calamidade pública. Salutar, a partir daí, que a iniciativa privada observe rigorosamente as disposições legais e proteja seus negócios documentando adequadamente os acordos e tratativas com as Prefeituras, Governos Estaduais e União para evitar que eventual contrato seja submetido à investigação e, ao cabo, conclua-se pela inadequação às regras então flexibilizadas pelo ordenamento jurídico provisório.

Como exemplo da relevância dada ao tema tem-se a produção de material técnico pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina com o fito de orientar os gestores públicos quando da contratação direta, inclusive indicando de forma clara os requisitos para a correta dispensa de licitação: a) demonstração de uma situação concreta, grave e atual que reclame atendimento urgente, sem o qual seria comprometida a segurança de pessoa ou se exporia bem público ou particular ao risco de sofrer dano irreparável; b) nexo de causalidade entre a situação emergencial e a contratação visada e c) demonstração da adequação dos bens contratados aos fins emergenciais que justificaram a contratação, bem como a demonstração da razoabilidade dos valores pagos pela Administração. (informações disponíveis no site do MPSC)

Neste contexto, a chave para um contrato hígido e sem qualquer celeuma de ordem criminal (v.g. crimes contidos na Lei 8.666/93 e o delito de peculato) parte do arquivamento de uma série de documentos aptos a demonstrar a regularidade e legalidade das práticas, vendas e contratações, inclusive desde o início das tratativas.

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Os mesmos cuidados devem estar presentes nas hipóteses de doação de recursos ou insumos para o atendimento da pandemia, evitando-se que o órgão de persecução penal interprete tal prática como indiciária de crimes de corrupção ou ainda de atos de improbidade administrativa.

Diversas foram as operações policiais já deflagradas sobre desvios de recursos relacionados à covid-19, tais como as operações Alquimia (PB), Virus Infectio (AP) e Favorito (RJ), o que confirma a prontidão e interesse dos fiscalizadores/investigadores sobre o assunto.

A flexibilização de regras, a inclusão de conceitos abertos e amplos na legislação, a informalização e a  desburocratização de práticas negociais para atender a urgência darão, correndo-se aqui o risco do vaticínio, origem a inúmeros casos de compras superfaturadas sem licitação, entrega de produtos com defeito ou mesmo em desconformidade com os requisitos médicos e técnicos exigíveis. Trata-se, porém, de postura que a administração pública precisa assumir a fim de dar agilidade no combate à disseminação de um vírus bem mais ágil que a burocracia estatal.

Nada mais certo do que se evitar o desvio de dinheiro público, na casa dos milhares de reais, por meio de medidas fiscalizadoras e punitivas. Dos órgãos de persecução penal se aguarda, como sempre, firmeza e atuação, sob o signo da legalidade, contra os malfeitores. Já do empresariado, para além do cumprimento dos deveres ínsitos a sua posição, sugere-se prudência e cautela na assinatura e administração dos contratos, resguardando os seus direitos e obrigações por meio de práticas transparentes e acompanhadas da documentação suporte. Em caso de dúvidas por parte do agente investigador restará mais facilmente demonstrável a correção e legalidade adotadas.

*Daniel Laufer e Maria Francisca Accioly, advogados criminalistas, são sócios da Accioly, Laufer Sociedade de Advogados

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