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Covid-19 e os impactos na saúde do homem: precisamos falar sobre isso

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Por Leonardo Seligra
Atualização:
Leonardo Seligra. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A pandemia trouxe muitos desafios e, desde o início, diversas mudanças no cenário mundial aconteceram, sobretudo nas questões sanitárias e em fatores econômicos, mas também consequências físicas e psicológicas, decorrentes do isolamento social, tanto individualmente quanto coletivamente. Porém, um assunto que é pouco discutido, talvez por conta da sustentação e disseminação dos tabus, é sobre os distúrbios da sexualidade, tão igualmente afetados por este momento em que vivemos. Alguns casos de disfunção erétil foram relatados em homens infectados, além de situações em que, devido a tempestade inflamatória causada pelo coronavírus e a afinidade do vírus por locais como os testículos, também foram descritos casos de queda dos níveis hormonais de testosterona e consequente queda de libido. Porém, em alguns estudos, o que se mostrou mais preocupante foi a mudança de comportamento em relação as práticas sexuais.

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Devido as restrições e ao confinamento houve um aumento no consumo de pornografia em quase 25% dos casos. Os casais que moram juntos observaram queda no número de relações sexuais e, além disso, observou-se também um aumento nas queixas de estresse e ansiedade, piora na qualidade dos relacionamentos, evidenciando diversos problemas que, por vezes, culminaram em divórcios. Pior para relacionamentos mantidos à distância ou em casas separadas. Vale ressaltar que já foram descritos, cientificamente, diversos benefícios do sexo em relação à saúde como um todo, melhorando as condições físicas devido às ações hormonais e condicionamento cardiopulmonar, mas também o bem-estar emocional, de humor, diminuição da ansiedade e do estresse e, consequentemente, disposição para a prática de atividades cotidianas. E assim sendo, não tendo relações adequadas, não temos como alcançar plenitude e equilíbrio saudável.

As relações interpessoais deixaram de ser prioridade e colocadas em segundo plano, tanto pelos indivíduos que carregam medos e ansiedades na proliferação do coronavírus, mas também pelas instituições, uma vez que viagens, festas e encontros foram controlados ou cancelados. No entanto, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) o conceito de saúde é o conjunto bem equilibrado entre bem-estar físico, mental e social confirmando, assim, a importância do indivíduo em harmonia com seu corpo e mente. A OMS lista diferentes formas de melhorar tanto a percepção, quanto a conscientização sobre saúde do homem. Entre as cruciais, se faz necessária a promoção de ações que informem, eduquem e garantam mais saúde e bem-estar para o homem em ambientes de trabalho e na comunidade em geral. Neste momento, tanto representações da sociedade médica, quanto outros personagens como a mídia, grupos religiosos e representações sociais, têm papel fundamental em criar, apoiar ou incentivar ações que permitam a conscientização da população masculina para os cuidados com a saúde.

No Brasil, os homens vivem, em média, sete anos menos do que as mulheres e têm mais doenças do coração, câncer, diabetes, colesterol. Diante disto e como uma forma de conscientização, desde 2017, a Sociedade Brasileira de Urologia realiza uma campanha nacional #VemProUro cujo objetivo é chamar atenção das famílias para os cuidados com a saúde dos meninos desde as primeiras idades. Culturalmente, vão ao pediatra somente na fase infantil e quando crianças, mas com o aproximar da fase adulta, abandonam à ida ao urologista, diferentemente das meninas, que continuam indo regularmente ao ginecologista. Importante dizer, também que, nós médicos, não tratamos de doenças, mas sim, cuidamos de pessoas.

Quando falamos de saúde masculina estamos nos referindo a toda jornada do indivíduo iniciando na adolescência até a senilidade. Os indicadores comportamentais possuem grande peso na saúde do indivíduo como a mentalidade de assumir riscos e, também, a alta reincidência de condutas relacionadas à "masculinidade" que se fazem bastante presentes. Esse perfil masculino favorece os números preocupantes da estatística de saúde.

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Falar sobre sexualidade, infelizmente, ainda é tratado como um dos grandes tabus da humanidade, ainda pior, quando falamos dos problemas de sexualidade daqueles indivíduos masculinos criados na cultura do "homem não chora" mitigados de seus sentimentos como sequelas da masculinidade tóxica. Somado a isso, as pessoas diminuíram a busca de atendimento médico para consultas preventivas e assim piorando as condições de doenças crônicas já existentes.

Impacto da pandemia na saúde reprodutiva e sexual

Na primeira fase, a preocupação seria se o vírus poderia ser transmitido sexualmente e, em caso positivo, se poderia causar alguma consequência à prole. Nessa fase muito se discutiu, inclusive, sobre adiamentos da programação de gestação, natural ou por tratamentos de reprodução assistida. A preocupação, em acesso, sobre os métodos anticoncepcionais adequados e ao comportamento sexual foram vistos como incertezas. Hoje sabemos não haver riscos de transmissão sexual pelo sêmen, mas sim, pelo contato físico e transmissão via respiratória, porém, alterações no sêmen de homens infectados ocorrem apesar de serem transitórias. As gestantes, por sua vez, apresentam risco de doença mais grave, apesar de não transmitirem a doença pela gravidez ou amamentação. Hoje também sabemos, por meio das pesquisas, que a vacina não traz alterações ao sêmen. Mas, as questões sexuais são ainda mais estudadas, visto a complexidade da origem dos distúrbios serem físicas, psicológicas e/ou sociais, e tudo isso ocorreu com a pandemia.

Apesar dos esforços e avanços em relação às sequelas do coronavírus e em aspectos respiratórios e fadiga, além das questões econômicas, não podemos ignorar os possíveis efeitos pós-traumáticos da pandemia e, eventualmente, uma onda de problemas psíquicos e emocionais. É importante lembrar que o indivíduo é um ser biopsicossocial, e que a saúde sexual colabora com esse equilíbrio de maneira muito mais importante do que se imagina, devendo ser foco em nossas ações dentro e fora dos consultórios.

*Leonardo Seligra Lopes é diretor de Comunicação da SBU-SP, médico urologista,  mestre em Ciências da Saúde, assistente da disciplina de Urologia do Centro Universitário FMABC

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