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Covid-19 e execução de contratos com a administração pública

Por Henrique Frizzo e Bruno Duarte
Atualização:
Henrique Frizzo e Bruno Duarte. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

As consequências práticas da pandemia de covid-19 já são sentidas nos mais diversos setores econômicos. Tanto é assim, que um dos resultados já notados é uma queda acentuada na emissão de poluentes na atmosfera.

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Muito se tem discutido sobre os efeitos jurídicos da pandemia na execução de contratos e performance de obrigações, que podem se tornar mais custosas ou até mesmo impossíveis nesse momento.

No caso específico de contratos com a Administração Pública direta e indireta, eventuais atrasos ou inexecuções contratuais geram consequências específicas e dramáticas, incluindo: rescisão unilateral; aplicação de multas; determinação de devolução de valores por danos ao erário, declaração de inidoneidade e proibição de contratar futuramente com a Administração Pública. Além disso, há menos flexibilidade para negociações e alterações contratuais com entes públicos do que em negócios entre privados.

Recomenda-se, portanto, que as empresas analisem detalhadamente os termos e condições de seus contratos públicos ao vislumbrar riscos de atraso, onerosidade excessiva, ou de impossibilidade de execução de obrigações com a Administração Pública (temporária ou permanente).

É necessário avaliar as determinações específicas de cada contrato público. Em geral, no entanto, é possível evitar os efeitos de atraso ou inexecução contratual, inclusive com potencial suspensão do contrato, quando decorrentes de caso fortuito, força maior ou fato do príncipe.

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Embora a definição específica desses conceitos seja objeto de eterno debate no mundo jurídico, eles podem ser entendidos como a ocorrência de eventos imprevisíveis e fora do alcance do contratado, que retardam ou impedem a execução contratual.

Ocorrências de eventos de caso fortuito ou força maior devem ser comunicados ao ente contratante. As informações públicas sobre a crise da covid-19 devem ser mencionadas (como a declaração de pandemia pela OMS), mas não são suficientes para evitar potenciais sanções contratuais. É também necessário demonstrar como a situação afetou especificamente a execução do contrato, tornando sua continuidade impossível ou excessivamente onerosa no momento.

Empresas com contratos públicos em vigor devem, também, analisar a potenciais aumentos relevantes em seus custos para execução contratual. Em geral, nos casos em que a administração pública reconhece a ocorrência de caso fortuito ou força maior, também é possível pleitear o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, permitindo a equalização dos custos/prejuízos financeiros assumidos pelo contratado.

Outro mecanismo importante a ser considerado é a possibilidade de se requerer a rescisão dos contratos públicos, sem aplicação de sanções ao contratado, devido à ocorrência de caso fortuito ou força maior. Essa medida, no entanto, somente é recomendada em situações nas quais a pandemia de covid-19 geraria impactos extremos. Uma vez que se trata de crise com alcance global, a administração pública poderia ter dificuldades de realizar novos contratos com outras partes. Nesses casos, poderia haver maior resistência por parte dos entes contratantes em reconhecer a ocorrência de caso fortuito ou força maior, além de se gerar potenciais danos à imagem das empresas - especialmente quando seus contratos públicos se relacionam à prestação de serviços essenciais à população.

Já há, no atual cenário de crise, fortes elementos jurídicos para a declaração e reconhecimento de situação de caso fortuito ou força maior nos contratos públicos, desde que demonstrados os efeitos específicos sobre a performance das obrigações assumidas pelo contratado.

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A recente Portaria Interministerial nº 5/2020, dos Ministérios da Justiça e Saúde, pode reforçar esse entendimento, uma vez que define situações nas quais o cumprimento de medidas determinadas pela administração pública para o enfrentamento da pandemia de covid-19 será compulsório, sob pena de aplicação de sanções cíveis, administrativas e criminais. Nessa hipótese, a própria administração pública será responsável pela impossibilidade do cumprimento contratual.

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No caso específico de concessões de serviços públicos, deve-se também realizar análise específica das matrizes de risco. A tendência nos contratos de concessão mais recentes é de reconhecer como risco da administração pública apenas a materialização de eventos de caso fortuito ou força maior cujos efeitos ultrapassem um período específico e que não sejam objeto de seguros contratáveis pelo concessionário.

Por fim, recomenda-se às empresas que possuem contratos vigentes com entes da administração pública, que analisem imediatamente as potenciais consequências da pandemia na execução contratual, acompanhando a situação e tomando as devidas medidas assim que possível.

Além das questões jurídicas, e da melhor prática (obrigatória em muitos contratos) de se informar o contratante imediatamente sobre eventos que podem afetar a execução contratual, é possível que, após o fim das crises geradas pela pandemia se apresentem pleitos baseados em caso fortuito/força maior aos entes públicos, incluindo pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro. Diante das potenciais consequências do acúmulo desses pedidos, há o risco de que a administração pública e, até mesmo, o Poder Judiciário, passem a se tornar cada vez mais refratários em acatar tais argumentos.

*Henrique Frizzo e Bruno Duarte, sócio e associado, respectivamente, do escritório de advocacia Trench Rossi Watanabe

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