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Corte do ICMS pelo Estado de SP é medida retrógrada que ameaça toda a população

Por Bruno Sobral
Atualização:
Bruno Sobral. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Em março de 1999, entrou em vigor um convênio estabelecido entre todos os governos estaduais no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Válido para todo o Brasil, definia lista com centenas de produtos médico-hospitalares que ficavam isentos do pagamento do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços). A decisão alinhou o Brasil com a política fiscal adotada pela maioria dos países, que consiste em isentar de impostos o setor de saúde com o objetivo de tornar os serviços de assistência mais acessíveis à população.

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Em outubro de 2020, o governo do Estado de São Paulo, indo na contramão desse espírito, decretou o fim dessa isenção. Fez isso de forma unilateral, à margem do Confaz e contrariando a legislação que vigora nos demais estados da Federação. Em nome das empresas prestadoras de serviços de saúde, conjuntamente com outras entidades do setor de saúde, a CNSaúde tem alertado as autoridades paulistas sobre o impacto que esse aumento dos impostos teria sobre os custos da assistência médica e sobre o sistema de saúde como um todo.

Os produtos que eram isentos e sobre os quais passou a incidir, em 1º de janeiro, a alíquota de 18% de ICMS, representam cerca de 14% dos custos hospitalares. São artigos de enorme importância para o tratamento de algumas das doenças que mais afligem a população e que terão os seus preços majorados. Entre eles estão órteses e próteses ortopédicas, stents, cateteres, marca-passos e válvulas cardíacas, rins artificiais e oxigenadores e, até mesmo, medicamentos oncológicos.

No diálogo que procuramos estabelecer com o Governo de São Paulo, mostramos que o aumento de custos atinge hospitais que já estão vivendo uma crise financeira em decorrência do esforço de combate à pandemia. Em razão da emergência, os hospitais tiveram que destinar seus leitos aos pacientes da Covid-19 e arcaram com o cancelamento de outros tratamentos e cirurgias, o que ocasionou perdas de receita de, pelo menos, 17%. Além disso, foram afetados pelo súbito e agressivo aumento nos custos de equipamentos de proteção, como luvas, máscaras, aventais e, também, equipamentos como respiradores, usados no atendimento às vítimas da pandemia.

Diante desse quadro, o fim da isenção do ICMS virá a agravar a situação crítica em que se encontram especialmente os pequenos e médios hospitais e poderá levar ao fechamento de diversos desses estabelecimentos. Na última década, cerca de 34 mil leitos em hospitais privados fecharam em todo o Brasil. Só no Estado de São Paulo foram fechados 4,5 mil leitos privados neste mesmo período.

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O governo paulista se mostrou, até o momento, insensível à nossa solicitação, muito embora, o que é positivo, tenha atendido às reclamações feitas pelas empresas farmacêuticas e agrícolas, reduzindo a cobrança do ICMS sobre os medicamentos genéricos e os produtos da cesta básica. Manteve-se, portanto, a aplicação dos 18% de ICMS sobre as órteses, próteses e materiais especiais abrangidos pelo acordo do Confaz.

Ao avaliar as consequências dessa política, é importante lembrar que ela irá aumentar os custos dos planos de saúde para a população, o que provocará um êxodo de consumidores da saúde privada para as filas do SUS. Ou seja, boa parte do que o Governo paulista planeja ganhar cobrando impostos sobre produtos médicos vai se perder com custos maiores para o sistema público de saúde.

Na população de São Paulo, 4 em cada 10 habitantes pagam por planos de saúde. A medida do governo paulista penalizará, num primeiro momento, os habitantes do Estado que consomem serviços de saúde privada e, também, as empresas do setor instaladas em São Paulo. É muito provável, no entanto, que o Estado mais rico da Federação, ao romper com essa medida unilateral o acordo com os outros estados, desencadeie um processo de cancelamento das isenções nas demais unidades da federação e acabe por penalizar a população brasileira como um todo.

O fim da isenção do ICMS para produtos médicos, em suma, é uma medida regressiva, por aplicar impostos a artigos essenciais para a assistência à população e é especialmente inoportuna por fazê-lo em meio à mais grave crise que o país enfrenta na área de saúde, fragilizando a rede de atendimento privado que tanto alivia a pressão sobre os serviços públicos de saúde.

*Bruno Sobral é secretário executivo da Confederação Nacional da Saúde (CNSaúde)

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