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COP26: a Amazônia não serve a um grupo econômico; serve a todos os brasileiros, a toda a humanidade

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Por Dom Leonardo Ulrich Steiner
Atualização:
Dom Leonardo Ulrich Steiner. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Alcançar os objetivos do Acordo de Paris e assegurar que decisões concretas sejam tomadas na COP26 é um apelo que grande parte da humanidade faz nestes dias em que acontece em Glasgow (Reino Unido), a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas.

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Sabemos que o caminho das Conferências climáticas tem sido sofrido, mas também alentador. Os diálogos têm demonstrado as realidades gritantes e as necessidades urgentes de mudança no modo de viver e do conviver com a terra. A barreira a superar é sempre econômica; é dinheiro. Os interesses econômicos estão a devastar a terra e os povos originários. A poluição do ar, das águas, a devastação das florestas, a destruição pelo garimpo, está ligada ao lucro, ao dinheiro.

Não interessa o futuro, a vida dos povos, dos pobres, o desaparecer de culturas, da beleza, da poesia, da harmonia, da humanidade. Nesse sentido é urgente uma mudança de cultura ambiental, no mundo, mas especialmente no Brasil. Na COP, há necessidade de metas mais ambiciosas a curto prazo quanto ao CO2, há urgência de um fundo ecológico que ajude na preservação das florestas e na recomposição das mesmas e é urgente, urgentíssimo, despoluição do ar e das águas dos rios e do mar. "Desplastificar" as águas; os animais estão a morrer de plástico!

Certamente, se os países todos buscassem educar para a ecologia, despertar para o cuidado da casa comum, teríamos mais chance de uma terra também habitável no futuro. A ecologia não deveria estar ligada à compreensão de dominação e lucro, mas à compreensão de cuidado e cultivo.

A COP21, celebrada em Paris em 2015, foi marcada pela Encíclica Laudato Sì de Papa Francisco. Presente nos debates, fundamentando a necessidade de metas. Os encontros, os debates entre delegações foram decisivos para chegar a um acordo que fosse aceito pelos países participantes. É sempre difícil negociar quando existem realidades nos diversos países que exige mudança em relação ao cuidado do meio ambiente.

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Apesar dos retrocessos depois da COP21, essas Conferência são importantes por manterem viva a discussão e a busca de soluções em relação às mudanças climáticas. Se formos analisar as conferências, veremos um caminho onde se vai construindo consensos e buscando metas. Temos governos que negam a necessidade de uma responsabilização em relação à casa comum, por negarem a ciência, mas a ciência se impõe sempre mais nas discussões.

As COP são oportunidades para manter a discussão, o diálogo, a reflexão, aprofundando sempre mais a questão da mudança climática. Especialmente importante a escuta dos povos mais atingidos pelas mudanças, os povos mais agredidos pela devastação das florestas. As ações não caminham como desejamos, nem mesmo conforme a necessidade, apesar do perigo que estamos a correr. Mas, no futuro não poderão dizer que não buscamos, que não propomos, que não escutamos o gemido da terra e dos povos, que não tentamos superar a crise em que nos encontramos.

A promessa do governo brasileiro de eliminar o desmatamento ilegal até 2030 soa como um bom propósito. O que temos ouvido, visto e sentido é o descaso em relação ao meio ambiente, especialmente em relação a Amazônia. Não que o Cerrado esteja protegido e a Mata Atlântica, o Pantanal e outros estejam a salvo. O descaso é grave. As políticas, o desmonte dos órgãos ambientais, como também do órgão de relação com os povos indígenas, saltam aos olhos e demonstram que os pobres e o meio ambiente podem ser menosprezados e descartados.

O que nos mantém na atenção, na discussão, na reflexão é a própria sociedade através dos povos indígenas e ribeirinhos, dos cientistas atentos, das igrejas, de entidades que cuidam do meio ambiente, dos meios de comunicação que percebem a necessidade de mudança de rumo. O garimpo tem sido uma destruição, não apenas das matas, mas também das águas. As populações indígenas e ribeirinhas acabarão eliminadas pelo alto índice de mercúrio no organismo devido as águas contaminadas dos rios.

No Compêndio da Doutrina Social da Igreja encontramos uma sabedoria que nos ajuda a entender a necessidade do empenho de cada um para a tutela dos outros e do meio ambiente: "A caridade social leva-nos a amar o bem comum e a buscar efetivamente o bem de todas as pessoas, consideradas não só individualmente, mas também na dimensão social que as une". Está em jogo toda a obra criada e toda a humanidade. Somos chamados a caminhar juntos. O isolamento, a ideologia fechada leva à morte e pode levar à destruição do planeta terra.

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A insistência da Igreja na Amazônia, o Sínodo da Pan-Amazônia, o texto pós sinodal Querida Amazônia, estão a indicar o caminho comum. Existe um patrimônio cultural, religioso, social, ambiental a ser cultivado. A Igreja que está na Amazônia deve ser capaz de suscitar novos caminhos, renovar as estruturas, organizações sociais, incentivar ordenamentos jurídicos que preservem o meio ambiente, demonstrar a beleza, a poesia, a arte, a convivialidade da Amazônia.

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Hoje temos necessidade de demonstrar a agressividade despudorada em relação à Amazônia, pelo interesse econômico. É urgente estar na atenção de que a Amazônia não serve a um grupo econômico; serve a todos os brasileiros, a toda a humanidade. Ela tem uma incidência enorme quanto ao equilíbrio do meio ambiente do planeta terra. A Igreja estará junto aos povos originários ajudando a conservar as suas culturas e aprender com eles. Buscará se inculturar e inculturar a espiritualidade, a fé. A Igreja da Amazônia caminha na esperança; de esperança em esperança! Apesar de todas as agressões e destruições, ela mantém viva a esperança de um futuro melhor, imagem do Reino que anuncia.

*Dom Leonardo Ulrich Steiner, arcebispo metropolitano de Manaus

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