PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

Consultor registrou em diário negociação de propina de R$ 45 mi para Renan, Gim e Jucá

João Batista Gruginski, investigado na Operação Zelotes, anotou dados sobre suposto repasse de R$ 15 milhões para cada político

Foto do author Andreza Matais
Foto do author Julia Affonso
Por Andreza Matais , Fabio Fabrini , Ricardo Brito e Julia Affonso
Atualização:

Renan Calheiros. Foto: Ed Ferreira/Estadão

O consultor João Batista Gruginski, investigado na Operação Zelotes, registrou em diário que participou de reunião com os lobistas José Ricardo Silva e Alexandre Paes dos Santos, o APS, na qual este último mencionou uma suposta negociação de propina com os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL), Romero Jucá (PMDB-RR) e o então senador Gim Argello (PTB-DF) em torno de uma emenda a medida provisória. O suborno citado alcançaria R$ 45 milhões, R$ 15 milhões para cada um dos políticos.

PUBLICIDADE

No diário, o consultor ele narra com detalhes a reunião que teve com dois parceiros de negócios, APS e José Ricardo Silva. Os três trabalhariam para viabilizar interesses da MMC Automotores, que fabrica veículos Mitsubishi no Brasil, e a CAOA, que monta modelos Hyundai, ambas instaladas em Goiás. O objetivo das empresas seria conseguir a edição, pelo governo, e a aprovação, pelo Congresso, de normas que lhes assegurassem benefícios fiscais. A Operação Zelotes, do Ministério Público, Polícia Federal e Receita Federal, indicou que a ação envolveu pagamento de propina a agentes públicos.

O ex-senador Gim Argello. Foto: Ed Ferreira/Estadão

Gruginski estava contrariado na reunião, registrada em seu diário, porque se sentia escanteado do negócio pelo parceiro José Ricardo. "APS vira-se diretamente para mim: 'Sabe aquela emenda que você preparou? Estão negociando por quarenta e cinco (Gim Argelo, Renan e Romero Jucá-Relator), quinze para cada. A mesma emenda. Exatamente'. Pergunto: 'Com a mesma justificativa?' 'Sim. Está desproporcional'", escreveu na página referente ao dia 16 de abril de 2010.

Em outro trecho, o consultor voltou ao tema: "Não é sensato que o JR (José Ricardo), caso me considerasse mesmo parceiro no trabalho, não tenha tomado a iniciativa de me dar a notícia dos quarenta e cinco milhões. Mas, como o APS considera-se parceiro, foi abrindo o jogo, logo que entrou na sala." Ele cita o valor quatro vezes no diário.

Romero Jucá. Foto: André Dusek/Estadão

Gruginski conta que só participou da reunião em que os senadores foram mencionados porque APS chegou quando ele estava com José Ricardo. Ele escreveu: "Logo a seguir entra o APS: 'Vim voando de Goiânia, ontem, quando você (José Ricardo) me ligou falando do caso da emenda de interesse da CAOA/MMC. Ainda à noite fui falar com o Fernando (César Mesquita) - lá do Senado, assessor do presidente'". Fernando César Mesquita é acusado pelo Ministério Público Federal de receber propina para levar a senadores os pleitos dos lobistas pelas MPs.

Publicidade

[veja_tambem]

Ainda no diário, o consultor contou que José Ricardo ficou "à flor da pelo" quando APS falou na frente dele sobre a emenda que tentou desviar o assunto "com a história de que a MP a que se destinou a emenda (471/2009), segundo parceiros de São Paulo, custou R$ 6 milhões para campanha." Os "parceiros de São Paulo", segundo ele, são o casal Mauro e Cristina, sócios da Marcondes & Mautoni consultoria,também suspeitos de participarem do esquema de compra de MPs. O consultor não disse no diário nem em depoimento à PF a qual campanha José Ricardo se referiu.

Gruginski admitiu ao Estado que ele próprio redigiu a emenda mencionada pelos lobistas na reunião, para atender à CAOA e à MMC. A primeira tentativa de incluí-la foi na MP 471/2009, editada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com assinatura do então senador Francisco Dornelles (PP-RJ), atual vice-governador do Rio de Janeiro. Essa medida provisória, contudo, foi aprovada sem nenhuma emenda. O objetivo era estender para a região Centro-Oeste os mesmos benefícios fiscais concedidos às montadoras de veículos instaladas no Norte e Nordeste.

Gruginski não quis comentar com o Estado sobre detalhes do que redigiu em seu diário. Em depoimento à Polícia Federal, ele explicou que trabalhou com Dornelles de 2001 a 2002, quando ele era ministro do Trabalho, e que, assim que redigiu a minuta da emenda à MP, a levou ao senador, que aceitou apresentá-la para discussão no Senado. Ele afirmou na oitiva não se recordar de ter "especificado ao senador que a emenda apresentada era uma demanda da SGR em razão do contato da MMC/CAOA". Gruginski negou ter oferecido propina ao senador.

Emenda semelhante foi reapresentada um ano depois pelo senador Gim Argello à MP 512/2010, ocasião em que os lobistas teriam, na versão de Gruginski, mencionado valores a Gim, Renan e Jucá. Menção ao depoimento foi divulgada nesta quarta-feira, 27, pela "Folha de S.Paulo".

Publicidade

Gim. Em depoimento à PF, obtido pelo Estado, Gim Argello disse que a emenda apresentada por ele foi redigida pelo seu gabinete e que "nunca lhe foi oferecido pagamento ou vantagem para que propusesse emendas às MPs".

Procurado pelo Estado, Renan disse, por meio de sua assessoria, que não conhece Gruginski e que jamais autorizou, credenciou ou consentiu que terceiros utilizassem seu nome. Gim e Jucá não atenderam a telefonemas da reportagem.

As montadoras negam irregularidades.

A assessoria da MMC Automotores não retornou a contato da reportagem.

O advogado da CAOA, José Roberto Batocchio, disse que nunca houve contato da empresa com APS, José Ricardo ou Gruginski. Ele alegou que as informações sobre a participação da montadora no suposto esquema são falsas. "A CAOA nunca contratou ninguém para fazer qualquer coisa nesse sentido. Não temos controle sobre as sandices que as outras pessoas falam", afirmou.

Publicidade

O advogado disse ainda que não há possibilidade de pagamento de propina a parlamentares ou quaisquer outras pessoas por parte da montadora, o que um trabalho de investigação comprovaria. "Follow the money. Cadê o dinheiro? É um festival de inverdades. Refuto, com a maior de todas as ênfases", acrescentou.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.