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Combustível ao populismo tributário

Por Samir Nemer
Atualização:
Samir Nemer. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Recentemente o Congresso Nacional aprovou projeto de lei que cria um teto para o ICMS incidente sobre combustíveis, energia, telecomunicações e transporte coletivo. O objetivo é limitar o imposto, o mais importante dos Estados, para estes setores, classificando-os como produtos e serviços essenciais.

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O PLP 18/2022 dispõe que os Estados e Distrito Federal não podem aplicar a alíquota máxima do ICMS para tais bens e serviços, mas sim, pelo menos, a alíquota média, que varia entre 17% e 18%, dependendo do Estado.

Na maioria dos Estados, há três faixas de ICMS: a primeira, de 7% a 12% para produtos básicos, via de regra do setor alimentício; a segunda, entre 17% e 18% aplicáveis aos produtos em geral; e a terceira, com alíquotas que variam de 25% a 30%, incidentes sobre produtos considerados supérfluos e para energia elétrica, telecomunicações e combustíveis.

Em levantamento realizado nas normas estaduais que tratam sobre o ICMS, é possível constatar que as alíquotas superam 30% no que diz respeito aos bens e serviços objetos do projeto de lei. Com exceção do item "transporte público",  em que todos os Estados adotam como limite de incidência do ICMS a alíquota básica, nos demais itens (combustíveis, gás natural, energia elétrica e comunicações), as alíquotas chegam à 32%. Com a sanção pela Presidência da República, as mudanças propostas entram em vigor imediatamente e a queda na arrecadação será brusca.

A bem da verdade trata-se de uma tentativa de resolver o problema dos sucessivos aumentos de preços jogando a bomba no colo dos governadores para se livrar da cobrança da população, em ano eleitoral.

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Os Estados não possuem margem para renunciar a R$ 115 bilhões de arrecadação que deixarão de entrar em seus cofres e, mesmo havendo previsão de compensação, além só vir a partir de 2023 para muitos deles, também sempre há o risco de não ocorrer à contento, basta ver o imbróglio criado pela Lei Kandir em que durante décadas a União não compensou os Estados corretamente por conta da desoneração das exportações, só vindo ser resolvida a questão dado o acordo celebrado entre União, Estados e Distrito Federal, homologado pelo Plenário do STF.

Além disso, o preço dos combustíveis não será reduzido com populismo, pois Governadores têm sobre suas cabeças uma espada, que é a Lei de Responsabilidade Fiscal, além da evidente necessidade de verbas para os mais variados custeios prioritários, como saúde, segurança e educação.

Os excessivos aumentos nos preços dos combustíveis são frutos da Política de Paridade às Importações (PPI) praticada pela Petrobrás e da desvalorização do real frente ao dólar. Há um grande problema estrutural do setor no Brasil: mesmo sendo produtor de petróleo, o país também é importador de diesel em razão de limitações operacionais das refinarias, e estas importações são impactadas pela alta do dólar. Então, de forma geral, vendemos petróleo bruto ao exterior a 10 dólares o barril e importamos diesel a 90 dólares... nem precisa ser bom de matemática para constatar que a conta não fecha!

Na prática a redução nos preços dos combustíveis será mínima e, até arrisco dizer, dificilmente chegará ao consumidor final, seja por conta da política de paridade internacional praticada e da desvalorização do real frente ao dólar, seja porque eventual redução será absorvida ao longo da cadeia produtiva.

E para além do aspecto econômico, sob o ponto de vista jurídico são questionáveis as alterações por conta da lei de responsabilidade fiscal, da autonomia federativa dos Estados e em razão da competência exclusiva de Resolução do Senado Federal em fixar as alíquotas máximas do ICMS, conforme prevê a Constituição.

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O caminho é conjugar o aumento da capacidade operacional das refinarias, com a aprovação da Reforma Tributária que prevê a simplificação e redução de burocracia e custos, mas que atualmente dormita em alguma gaveta profunda na Comissão Mista sobre o tema, no Congresso Nacional.

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No curto prazo, o melhor seria destinar os dividendos que a União recebe da Petrobras como acionista majoritária - somente até julho o Governo receberá  R$ 32 bilhões -, para amortecer os aumentos, através de auxílio, se for o caso, para parcelas da população que de fato necessitam.

Quando os impostos e royalties se somam ao lucro destinado à União, a Petrobras transferiu aos cofres federais R$ 447 bilhões desde 2019 (início do atual governo)até março deste ano, o que corresponde a aproximadamente cinco vezes o orçamento do Auxílio Brasil previsto para 2022, em torno de R$ 89 bilhões.

De nada adianta impactar as contas públicas e passar por cima do pacto federativo, se a raiz do problema é estrutural e regulatória. O país vai priorizar quem anda de trem a R$ 7,00 a passagem ou quem anda de carro a R$ 7,00 o litro? O problema é quem pega trem todo dia não tem voz nem consegue bater à porta de quem toma as decisões no Planalto Central.

*Samir Nemer, advogado tributarista e sócio do FurtadoNemer Advogados

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