Muitos críticos do combate à corrupção trazem consigo narrativas bastante enfáticas ora no sentido de que um pouco de corrupção é normal e representa a "realpolitik"; ora sustentando que a Operação Lava Jato, muito embora tenha recuperado alguns bilhões de reais, por outro lado destruiu centenas de milhares de empregos; ou ainda que combater a corrupção é importante, mas a economia vem primeiro.
Antes de mais nada, é preciso ficar claro que existem várias frentes de combate à corrupção: uma por parte dos órgãos de investigação policial e acusação; outra com o julgamento de crimes por parte do Poder Judiciário; outra ainda com a atuação do Congresso Nacional na formulação de leis e atos normativos que dão suporte ao combate a esse mal. E ainda, na esfera da política governamental, com a adoção de políticas públicas por parte dos governos (Poder Executivo, portanto) voltadas a debelar o desvio de dinheiro público ou os malfeitos com o dinheiro do contribuinte.
É em relação ao enfrentamento da corrupção como política de governo que nos concentramos nesse breve texto.
Não obstante os críticos, a ciência econômica reconhece relação intrínseca e direta entre os melhores índices de desenvolvimento humano - IDH e países onde os níveis de corrupção são baixos.
Registra a economista Maria Cristina Pinotti que "a corrupção, além de minar os pilares das democracias, produz efeitos profundamente negativos sobre a economia. Na base tanto da corrupção como da pobreza estão instituições incapazes de proteger o bem-estar da maior parte da população. Não há desenvolvimento econômico sem instituições que garantam o respeito aos contratos, a busca da eficiência econômica, transparência, meritocracia e eficiência no setor público." ("Corrupção: Lava Jato e Mãos Limpas", págs. 86 e 87).
Não por acaso que quando se analisam os índices de percepção da corrupção - IPC, apurados pela Transparência Internacional (dados de 2020 com escala de 0 a 100 pontos, sendo 100 pontos o máximo da integridade), os 5 melhores países avaliados são economias extremamente desenvolvidas e com índices baixíssimos de pobreza: Dinamarca (88), Nova Zelândia (88), Finlândia (85), Singapura (85) e Suécia (85). Já os piores dessa lista do IPC 2020 são: Venezuela (15), Iêmen (15), Síria (14), Somália (12) e Sudão do Sul (12).
Já o Brasil segue em patamar bastante ruim, tendo apresentado 38 pontos no ano de 2020, abaixo da média de 39 pontos para os BRICs (39), abaixo da média regional para a América Latina e o Caribe (41) e mundial (43). E ainda mais distante da média dos países do G-20 (54) e da OCDE (64).
Aliás, se o Brasil quer se tornar membro da OCDE tal como solicitado no ano de 2017 e ainda pendente de resposta - ingresso esse que que sem dúvida representa um maior desenvolvimento econômico mediante o acesso a acordos comerciais e interações mais diretas com as nações desenvolvidas do mundo --, o país precisa melhorar seus índices de percepção à corrupção.
Tenha-se presente que o IPC de 2020 não leva em consideração os significativos retrocessos no combate à corrupção verificados ao longo do ano de 2021 no Brasil, como as decisões que anularam importantes processos da Operação Lava Jato, alteração legislativa que desfigurou a Lei de Improbidade Administrativa, além de outras decisões que ampliaram a impunidade como por exemplo o deslocamento para a Justiça Eleitoral (não especializada e normalmente sem estrutura para tanto) para julgamento dos crimes conexos aos crimes eleitorais (Caixa 2 de campanha, que na realidade é o crime de falsidade ideológica no âmbito eleitoral), permitindo em muitos casos, em razão da demora, a prescrição.
Voltando ao tema central desse breve artigo, é fundamental reconhecer que há relação direta entre desenvolvimento econômico (e, portanto, erradicação da pobreza) com o combate à corrupção como política pública.
Os órgãos de investigação, acusação e julgamento precisam continuar a desempenhar seu papel no combate à corrupção. O Congresso também precisa retomar a agenda anti corrupção.
Mas é imperioso que o combate à corrupção seja uma prioridade e um compromisso permanente por parte do Poder Executivo (Governo) como implementador de políticas públicas, justamente para recolocar o Brasil na rota correta do desenvolvimento econômico.
Assim, candidaturas presidenciais verdadeiramente comprometidas com o combate à corrupção são as únicas que poderão colocar o Brasil no rumo certo. Combater a corrupção não é um fetiche, não é uma ideia fixa, não é um capricho, nem tampouco um fim em si mesmo. Combater a corrupção é resgatar a ética e erradicar a pobreza. Combater a corrupção é permitir o desenvolvimento econômico do país, levando o dinheiro público à ponta que dele precisa.
*Marcelo Knopfelmacher, advogado criminalista