A 1.ª Turma Recursal da Justiça Federal do Paraná colocou em pauta para a sessão da próxima quinta, 7, uma ação na qual a União foi condenada a indenizar, em R$ 20 mil, o juiz Marcos Josegrei da Silva responsável pela Operação Carne Fraca - deflagrada por ordem de Josegrei pela Polícia Federal em março de 2017 para investigar suposto esquema de fraudes no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento envolvendo alguns dos maiores frigoríficos do País.
A sentença contra a União, proferida em maio em primeira instância, é decorrente de críticas do ministro Gilmar Mendes, que chamou o magistrado de 'ignorante, sem qualificação, imbecilizado, analfabeto voluntarioso, inimputável e estrupício'.
O valor da indenização deverá ser ainda corrigido com juros de 1% ao mês desde a data da 'última ofensa' - 14 de agosto de 2018, diz sentença de primeiro grau.
Na petição inicial, Josegrei indicava que algumas colocações de Gilmar, feitas durante julgamento no STF, 'extrapolavam os limites aceitáveis da crítica'.
O magistrado alegou que a Lei Orgânica da Magistratura (Loman), de 1979, e o Código de Processo Civil dispõem que o juiz responderá por perdas e danos quando proceder com dolo e pedia indenização de R$ 50 mil da União.
Em defesa, a Advocacia-Geral da União indicou que Josegrei assumiu a condição de pessoa pública e assim estaria 'suscetível a críticas das mais diversas naturezas'.
Segundo a sentença, a AGU ainda abordou os efeitos da Operação Carne Fraca na economia e alegou que o ministro do STF sempre comentou as consequências da atuação profissional de Josegrei, 'sem jamais fazer qualquer consideração sobre sua pessoa ou vida privada'.
A decisão de primeira instância, da juíza Giovanna Mayer, da 5.ª Vara Federal de Curitiba, pondera que 'o magistrado, como agente público, tem poder, para julgar, mas o mesmo não é irrestrito e está sujeito a limites'.
Ao avaliar o primeiro caso, referente a julgamento em que os ministros do Supremo discutiam a competência do juízo de primeiro grau para apreciar as ações cíveis de improbidade, Giovanna considerou que Gilmar fez 'crítica depreciativa sobre o trabalho de Marcos Josegrei fora dos autos'.
A magistrada indicou que o ministro chamou o juiz da Carne Fraca de 'ignorante, sem qualificação, imbecilizado, analfabeto voluntarioso e inimputável' e que, mesmo que não houvesse menção direta ao nome de Josegrei, seria possível identificá-lo, 'uma vez que não havia outro responsável pela Operação'.
"A crítica, portanto, foi proferida fora dos autos, o que configura um ato contrário ao dever prescrito na Loman."
Já com relação ao segundo caso, no qual o ministro se pronunciou em ação sobre 'remédio constitucional referente à decretação da prisão preventiva dentro da Operação Carne Fraca', Giovanna considerou que a crítica foi feita dentro dos autos, mas, segundo ela, Gilmar teria ferido outro artigo da lei dos juízes.
A magistrada fez referência a dispositivo que fala que é dever do magistrado 'tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça'.
Ela registrou ainda um artigo do Código de Processo Civil, que diz. 'É vedado às partes, a seus procuradores, aos juízes, aos membros do Ministério Público e da Defensoria Pública e a qualquer pessoa que participe do processo empregar expressões ofensivas nos escritos apresentados.'
Na avaliação de Giovanna, as críticas de Gilmar poderiam ser feitas 'de maneira respeitosa, mas não foi o que aconteceu - o ministro nominou o juiz e o chamou de estrupício'.
"A prática demonstra que quando uma decisão é questionada, criticada ou reformada, usa-se expressões como 'decisão teratológica', 'não andou bem o juiz', 'o julgamento foi precipitado', 'a decisão é temerária', etc. Até mesmo por uma questão de educação e respeito com os outros, não se pessoaliza a crítica. Prezar pela institucionalidade do País é também tratar com respeito todos aqueles que trabalham - bem ou mal - para o funcionamento das instituições", concluiu a juíza.