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Código de Defesa do Consumidor: 28 anos depois

Por Diógenes Farias de Carvalho e Vitor Hugo do Amaral Ferreira
Atualização:
Diógenes Carvalho e Vitor Hugo Do Amaral Ferreira. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O cenário que compreendeu o século 20 passou a delinear novos direitos, o que permitiu falar em direito ambiental, biodireito, direito espacial, direito da comunicação, direitos humanos e direito do consumidor. Existe uma multiplicidade de paradigmas que explica a construção da sociedade. O pensamento humano e a ciência aliados à tecnologia fizeram do homem um animal pensante e dominador por excelência. As suas descobertas aliadas ao saber e à necessidade de sentir-se cada vez mais eficaz levam-no a cometer exageros, tornando-os reféns, muitas vezes, das suas próprias invenções.

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Os fenômenos da atualidade são dominados pela mundialização e a globalização, as consequências da pós-modernidade atingem as relações humanas de forma significativa. A contemporaneidade traz a reflexão: mais do que máquinas, precisamos de humanidade. A frase de Charles Spencer Chaplin, esclarece o sentimento pós 28 anos de vigência do Código de Defesa do Consumidor.

Neste contexto, somos todos consumidores, mesmo em menor ou maior potencialidade, por que constituímos uma sociedade, por ora é da tecnologia, da informática, da produção, do acúmulo de capital, mas, por certo, sempre é de consumo. Ao passo em que somos chamados à sociedade de consumo por instrumentos de marketing, campanhas publicitárias milionárias, concessão de crédito facilitada, estamos sujeitos ao assédio de consumo.

Chegar aos 28 anos reflete momentos em que o CDC cuidou de reconhecer direitos básicos, qualidade dos produtos e serviços, buscou proteger a saúde e segurança, foi em busca do cumprimento das ofertas, questionou os apelos da publicidade, fez alerta às práticas abusivas e a responsabilidades pelos danos gerados, criou mecanismos e instrumentos que qualificam e facilitam a defesa do consumidor. Aqui uma saudação ao Código: louváveis os seus primeiros 28 anos!

Outros tantos anos nos esperam, depois de 28 anos é tempo de alerta. O futuro irá exigir cuidado, ainda maior, em relação ao crédito fácil e o consequente superendividamento do consumidor; a organização de políticas para os resíduos do consumo; entendimento sobre a vulnerabilidade agravada; a crescente e emblemática relação humana com a inteligência artificial; maior ênfase à disciplina de direito do consumidor nos bancos acadêmicos.

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Precisamos refletir sobre o fortalecimento dos espaços de defesa do consumidor, em especial a articulação do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. Nas relações de consumo, a defesa de direitos não se viabiliza apenas com a vigência do Código de Defesa do Consumidor (CDC). A efetividade depende essencialmente de ações concretas.

O direito, não raramente, precisa ser lapidado, necessita encontrar na sociedade sua aplicação, oportunizando não apenas justiça por meio do Poder Judiciário, mas por vias menos morosas, mais céleres, ágeis. Um outro alerta, as vias administrativas não podem cair no descaso, sob pena de falharmos em nossa representatividade em defesa ao consumidor.

Os Procons foram criados para legitimar um espaço modelo de solução de controversas em matéria consumerista. Nos próximos anos, há receio que a fragilidade de instituições não preparadas em promover a educação e a defesa do consumidor possam banalizar o objetivo do Código de Defesa do Consumidor. Enquanto tivermos espaços desestruturados, estes poderão ser mais vulneráveis que os próprios consumidores; as agências reguladoras, aparelhadas com o propósito de negligenciar direitos, acabam por legitimar abusos, sem servir ao equilíbrio do mercado, onerando os vulneráveis.

Se for assim, teremos fracassado!

Outra importante mobilização diante dos 28 anos está na aprovação dos projetos de lei que visam a atualização do Código de Defesa do Consumidor. A vulnerabilidade do consumidor permite falarmos em atendimento às suas necessidades, respeito à dignidade, saúde e segurança, à proteção de seus interesses econômicos, à melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo.

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A atualização do CDC em matéria referente ao comércio eletrônico - PL 3514/2015 - reforça, a exemplo do feito na Europa, os direitos de informação, transparência, lealdade, cooperação e segurança. As alterações incluem um rol de novas práticas abusivas, consolida o direito de arrependimento, e regula a possibilidade de retificação de erros na contratação. Falamos aqui de pagamentos de produtos e serviços à distância, da proteção dos dados do consumidor, privacidade, direito à intimidade.

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Importante ressaltar que a política que acelerou o consumo às margens do crédito, é também culpada pelo naufrágio das famílias brasileiras. O superendividamento acentuou a exclusão social na medida em que o discurso em favor do consumo alimentou sonhos da ascensão. A mais forte das expectativas de tratamento do tema é aprovação do PL 3515/2015. O debate necessário passa pela mudança de hábito, associam-se à pauta o consumo e o crédito responsável. Infelizmente foi preciso chegar à ruína econômica do consumidor para se pensar em sua recuperação.

A sociedade e o direito travam, em seu tempo, uma eterna jornada de (des)encontros, ao passo que a evolução da primeira traz ao direito a missão de regulá-la. Agora, 28 anos depois, podemos celebrar conquistas e lutar por avanços, fazer valer o mando constitucional em que é dever do Estado, na forma da lei, promover a defesa do consumidor. Para tanto, anos prósperos exigirão um Estado-Juíz que reconheça direitos; um Estado-Executivo que fortaleça a política pública de defesa do consumidor; e um Estado-Legislativo que promova a atualização da norma.

Vida longa ao Código de Defesa do Consumidor! Dias de maior efetividade, esclarecimento, operacionalização de direitos e combate aos retrocessos: o desafio dos próximos anos.

*Diógenes Carvalho, presidente do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon)

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*Vitor Hugo Do Amaral Ferreira, diretor do Brasilcon

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