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Cármen dá 24 horas para Heleno e Ramagem explicarem orientações da Abin a Flávio Bolsonaro

Ministra disse que o caso 'é grave' e aponta para descumprimento de decisão do Supremo, que proibiu o compartilhamento de informações de inteligência para atender interesses pessoais ou privados

Por Paulo Roberto Netto
Atualização:

A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, cobrou informações do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, e do diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, sobre as orientações elaboradas para auxiliar a defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no caso das 'rachadinhas'. A ministra fixou o prazo de 24 horas para receber respostas.

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Reportagem da revista Época publicada na sexta, 11, e confirmada pelo Estadão, aponta que a Abin de Ramagem produziu dois documentos em que detalha o funcionamento de suposta organização criminosa na Receita Federal que, segundo a defesa de Flávio, teria feito uma devassa nos dados fiscais do senador. Em um dos documentos, a finalidade descrita é 'Defender FB no caso Alerj'.

Entre as sugestões listadas pela agência estão a demissão de servidores do Fisco e da Controladoria-Geral da União (CGU), órgão responsável pela fiscalização da administração pública.

A Época mostrou nesta segunda, 14, que um dos servidores citados foi exonerado 'a pedido' há duas semanas e outras duas sugestões foram seguidas pela defesa: apresentação de um pedido de Lei de Acesso à Informação para colher provas de que o perfil de Flávio foi acessado indevidamente pela Receita e a apresentação de uma notícia-crime na Procuradoria-Geral da República.

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Em despacho, Cármen afirmou que o caso 'é grave' e aponta para descumprimento de decisão da Corte, que firmou entendimento de que a Abin somente pode fornecer dados quando comprovado o interesse público da medida e sob controle do Judiciário, ficando vedado o repasse de informações de inteligência com objetivo de atender interesses pessoais ou privados.

"O quadro descrito pelo autor da Petição é grave. Este Supremo Tribunal Federal afirmou, expressamente, na decisão da medida cautelar, a ilegitimidade de uso da máquina ou de órgãos estatais para atender interesses particulares de qualquer pessoa", anotou Cármen. "Para apreciar os pedidos apresentados pela autora são necessárias informações do Diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência e do Ministro do Gabinete de Segurança Institucional sobre o alegado na petição".

A cobrança de informações é a terceira decisão em dois dias que o Supremo profere contra o governo. Nesta segunda, o ministro Edson Fachin suspendeu resolução do Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior, secretaria vinculada ao Ministério da Economia, que zerava a alíquota de imposto de importação sobre revólveres e pistolas. No domingo, o ministro Ricardo Lewandowski cobrou explicações do Ministério da Saúde sobre o prazo de vacinação contra a covid-19.

A ministra Cármen Lúcia articulou a 'pauta verde' do STF. Foto: Gabriela Biló / Estadão

Assistência. As orientações da Abin à defesa de Flávio teriam sido enviadas pelo WhatsApp. São dois textos digitados diretamente no aplicativo e não compartilhados como relatórios de inteligência em arquivo timbrado da Abin ou papel digitalizado.

Além das sugestões envolvendo a demissão de servidores, os relatórios orientam a defesa de Flávio a busca de acesso a dados de uma "apuração especial" no âmbito do Serpro, para garantir registros de acesso a dados fiscais na Receita. Os advogados do senador apresentaram o pedido de Lei de Acesso para obter essas informações.

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Em outro trecho, uma advogada de Flávio é aconselhada a conseguir uma audiência para "tomar um cafezinho" com o chefe da Receita Federal do Brasil (RFB), José Tostes Neto. Ela deveria, então, exigir de Tostes informações e avisar que ajuizaria uma ação para obter acesso a relatórios internos da Receita que, no entendimento da defesa, teriam potencial de demonstrar acessos anteriores indevidos aos dados do senador.

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Os relatórios são desdobramentos de uma reunião realizada em agosto entre a defesa de Flávio com Alexandre Ramagem, Augusto Heleno e o próprio presidente Bolsonaro, no Planalto. O encontro é alvo de uma apuração preliminar na PGR, que apura se há indícios suficientes para abrir inquérito contra Heleno e Ramagem.

O caso provocou reações de insatisfação entre associações de servidores da Abin. A ala dos oficiais e agentes de carreira vive um desconforto com ações supostamente atribuídas a servidores de fora, nomeados por Ramagem. O delegado era chefe da segurança de Bolsonaro em 2018 e ganhou intimidade com os filhos do presidente, com quem costuma confraternizar. Ele foi pivô da crise que culminou com a saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça. Bolsonaro queria emplacar Ramagem no comando da PF, o que o ex-juiz da Lava Jato considerou uma interferência para influenciar nas investigações contra filhos do presidente.

Em nota, o GSI reafirmou manifestação enviada após a revelação da reunião de Heleno com a defesa de Flávio e disse que a pasta 'não realizou qualquer ação decorrente, por entender que, dentro das suas atribuições legais, não lhe competia qualquer providência a respeito do tema'.  "As acusações são desprovidas de veracidade, se valem de falsas narrativas e abordam supostos documentos, que não foram produzidos pela Agência Brasileira de Inteligência", afirmou.

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