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'Cão de guarda do presidente', diz Grupo Prerrogativas sobre ministro da Justiça, que determinou inquérito contra advogado por críticas a Bolsonaro

Coletivo de juristas saiu em defesa do criminalista Marcelo Feller, alvo de investigação aberta com base na Lei de Segurança Nacional a pedido de André Mendonça por declarações no quadro ‘O Grande Debate’, da CNN

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Foto do author Rayssa Motta
Foto do author Fausto Macedo
Por Rayssa Motta e Fausto Macedo
Atualização:

O Grupo Prerrogativas, que reúne cerca de 400 juristas e entidades representativas do Direito, reagiu nesta quinta-feira, 21, ao inquérito aberto contra o criminalista Marcelo Feller por críticas dirigidas ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido). A investigação foi determinada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, com base na Lei de Segurança Nacional, sancionada durante a ditadura militar.

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Em nota pública, o grupo saiu em defesa do advogado e criticou a atuação 'obscurantista' do ministro, a quem chamaram de 'cão de guarda do Presidente da República'.

"As críticas foram feitas dentro da regra democrática e do respeito, não se valendo o advogado de nenhum meio que colocasse em risco a segurança institucional do país, desafiada, sim, por Jair Bolsonaro, diuturnamente", diz um trecho na manifestação.

O grupo ainda adiantou que vai acionar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para tomar as medidas criminais cabíveis no caso.

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André Mendonça é o segundo indicado do presidente Jair Bolsonaro para o STF. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Entenda o inquérito

Marcelo Feller está sendo investigado por declarações feitas durante uma das edições do quadro 'O Grande Debate', da emissora CNN, por onde teve uma breve passagem. A atração reúne dois debatedores para defender posições contrárias sobre um tema previamente definido pela produção do programa. No dia 13 de julho, o assunto escolhido foi a atuação do governo federal na pandemia da covid-19 e o impacto dela sobre a imagem das Forças Armadas.

O tema foi definido na esteira da fala do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, de que Exército está se associando a um 'genocídio', em referência à presença de militares no Ministério da Saúde durante a crise sanitária provocada pelo novo coronavírus. O ministro comentava a ausência de um titular na pasta, então comandada interinamente pelo general Eduardo Pazuello desde a queda do médico Nelson Teich mais de 50 dias antes.

Na ocasião, o advogado citou o estudo Mais do que palavras: discurso de líderes e comportamento de risco durante a pandemia, desenvolvido em parceria por pesquisadores da Universidade de Cambridge e da Fundação Getúlio Vargas. A pesquisa concluiu que atos e discursos do presidente Jair Bolsonaro contra o isolamento social como estratégia de combate à pandemia podem estar por trás de pelo menos 10% dos casos e mesmo de mortes pela covid-19 registrados no Brasil.

Perfil do advogado Marcelo Feller elaborado pela Divisão de Contrainteligência Policial da PF. Foto: Reprodução

Durante o debate, o criminalista usou termos como 'genocida, politicamente falando', 'criminoso' e 'omisso' para se referir ao presidente. À reportagem do Estadão, Feller explicou que a menção a genocídio foi feita sob uma perspectiva político-social e que vê o inquérito como uma tentativa de silenciamento.

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"Eu fui instado ao debate público, jornalístico, e consignei o estudo. Expliquei como, ao meu modo de ver, pelo menos naquele momento, era um erro juridicamente se falar em genocídio. Mas que a palavra genocídio não pode só ser vista sob uma perspectiva jurídica. Tem uma construção político-social em torno da palavra. E aí, o que eu disse, e ainda acredito, é que política, antropológica e socialmente falando, baseado neste estudo, isso é um genocídio", disse.

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Para embasar a ofensiva jurídica, o governo federal artigo 26 da Lei de Segurança Nacional, que prevê como crime 'caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação'. A pena é de um a quatro anos de prisão. Desde o início da pandemia, a mesma lei foi encampada pelo governo em pelo menos quatro outras ocasiões, a maioria contra profissionais da imprensa. Especialistas ouvidos pelo Estadão classificam o uso como 'equivocado'.

O advogado Alberto Zacharias Toron, que defende Marcelo Feller no caso, informou que vai entrar com habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para trancar o inquérito.

Leia a íntegra da nota:

É insuportável. É inaceitável. É afrontoso.

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Jamais tivemos, na História de nossa República, um Ministro da Justiça que chegasse ao nível da mediocridade de se comportar como um cão de guarda de um Presidente da República, que passou seus dias estimulando que uma catástrofe sanitária assumisse ares de uma maldição, imposta pelo negacionismo mais primitivo, nunca autorizado a um Chefe de Poder, por mais ignaro que fosse.

Marcelo Feller é um advogado que representa o melhor de uma nova advocacia, altiva e garantista, que não se dobra aos temores reverenciais garantidores de tantas iniquidades e, nessa qualidade, teceu as críticas que se fazem ao Presidente em qualquer canto desse país que o elegeu. As críticas foram feitas dentro da regra democrática e do respeito, não se valendo o advogado de nenhum meio que colocasse em risco a segurança institucional do país, desafiada, sim, por Jair Bolsonaro, diuturnamente.

A iniciativa do Ministro da Justiça e Segurança Pública em requisitar inquérito policial contra Marcelo Feller é das mais baixas que se poderia ter e revela apenas o viés obscurantista de uma troupe que não consegue administrar a própria mediocridade. Nós, INTEGRANTES DO GRUPO PRERROGATIVAS, nos solidarizamos expressamente a nosso colega, MARCELO FELLER, repudiando a atitude ministerial e adiantando que provocaremos a OAB para que tome as medida criminais contra esse rugido fascista, que repudiamos com toda a veemência!

Marcelo Feller nos representa!

Marcelo Feller, presente!

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Prerrogativas, presente!

COM A PALAVRA, O MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

A reportagem entrou em contato com a pasta para comentar a nota do Grupo Prerrogativas e aguarda resposta. O espaço está aberto para manifestação.

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