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Brasil e Cuba

Por Ney Lopes
Atualização:
FOTO: EVA MARIE UZCATEGUI/AFP  

Tema que suscita debates são os protestos repetidos em Cuba, rompendo a magia dos mitos revolucionários. O governo cubano acusa o embargo econômico imposto pelos Estados Unidos, desde 1962. Há informações, de que os americanos vendem alguns produtos ao país e exigem que o pagamento seja em dinheiro.

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A insurreição na ilha influi na polarização política entre Lula e Bolsonaro. Ambos aproveitaram a oportunidade para radicalizarem a disputa presidencial de 2022, que é o desejo recíproco. A crise complica a candidatura de Lula, pois o regime comunista cubano é um mau exemplo para qualquer candidato democrata. O boicote americano não é a única causa do problema econômico da ilha. O maior exemplo é a China, que "fez o dever de casa", modernizou-se e cresceu, após o massacre dos estudantes na Praça da Paz celestial. Cuba não se reformou. Viveu dos favores da União Soviética, que acabaram. Hoje, usufrui "migalhas" da falida Venezuela. O governo para manter-se paga salários astronômicos aos militares (exemplo de Maduro) e falta comida para a população. Em decorrência dos protestos há mais de 200 pessoas presas, ou desaparecidas.

O ex-presidente Lula evita falar no assunto, diante do risco de posicionar-se favorável à esquerda radical e dificultar os acenos ao empresariado e a chamada "direita civilizada". Porém, na última semana, manifestou-se a favor de Cuba. Em nota, o PT pregou "apoio e solidariedade incondicionais ao povo e governo de Cuba".

Bolsonaro, nas redes sociais, declarou que a população cubana "pede o fim de uma ditadura cruel que por décadas massacra a sua liberdade". No período de FHC, a política externa brasileira foi crítica da posição norte-americana no embargo econômico e defendia a reinserção de Cuba na comunidade hemisférica, com respeito aos direitos humanos e democráticos.

São antigos os embargos econômicos, adotados pelos países. No ano 433 a.C, Péricles na Grécia Antiga, decretou o primeiro embargo comercial da história contra a cidade de Megara. A medida revelou-se ineficaz e deu causa a Guerra do Peloponeso.

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No mundo contemporâneo, os embargos decretam o corte de relações comerciais, visando eliminar conflitos, ou derrubar governos autoritários. Há vários exemplos. A Venezuela, sofre embargos econômicos dos Estados Unidos, desde 2013. A economia é afetada, pois depende da importação de produtos vitais.

O Iraque em 1990 sofreu embargos econômicos de parte da ONU, devido à invasão realizada ao Kuwait, que causou a deflagração da Guerra do Golfo, em 1991. O embargo ainda é mantido quanto à produção de armas químicas, biológicas e nucleares. A Rússia sofreu embargos, decretado pela União Europeia em resposta à anexação ilegal da região da Crimeia ao território russo. Em represália, Putin prolongou até final de 2021 o embargo alimentar (laticínios, carnes, pescado, verduras, frutas etc.) imposto aos Estados Unidos e União Europeia.

A história mostra, que raramente os embargos surtem os efeitos desejados e sempre se transformam em meios de punição à coletividade e não aos governos. No caso específico de Cuba, a sanção econômica em nada contribuiu para uma abertura política interna. Pelo contrário, ajudou muito mais Fidel Castro, do que o atrapalhou. Por isso, esse embargo americano é formalmente condenado pela ONU há mais de 25 anos.

Seria encobrir o "sol com uma peneira" negar que Cuba enfrenta cenário sem precedentes de manifestações e repressão policial. Caracteriza-se como típica ditadura política fossilizada, que restringe as liberdades individuais. Mesmo assim, o embargo americano poderia ser substituído por outras sanções, já adotadas pelos americanos, na China, Irã, Rússia. O maior sofrimento atual não é da cúpula dirigente. É do povo indefeso, os mais humildes, que pagam a conta final.

Em relação a influência dos protestos cubanos na política brasileira, poderá ocorrer fratura na "frente democrática", que Lula e o PT montam contra Bolsonaro. A maioria dos partidos reage aos governos autoritários. Será que o "feitiço vira contra o feiticeiro" e a consequência política sejam benefícios para a reeleição de Bolsonaro? Ou, surge o espaço ideal para a "terceira via" defender o multilateralismo, através de política externa independente, sem alinhamento automático, voltada para o interesse nacional?

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*Ney Lopes, jornalista, ex-deputado federal, ex-presidente da Comissão de Constituição e Justiça da CF; presidente do Parlamento Latino Americano; professor de Direito Constitucional da UFRN e advogado

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