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Bolsonaro e o abraço na 'velha política'

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Por Rodrigo Augusto Prando
Atualização:
Rodrigo Augusto Prando. FOTO: DIVULGAÇÃO  

Não faz muito, o presidente Jair Bolsonaro reuniu-se com líderes partidários. Segundo seu ministro, Onyx Lorenzoni, Bolsonaro, com humildade, desculpou-se por suas "caneladas" iniciais e, depois, até, pediu desculpas pelo uso constante do termo "velha política".

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Ao que parece - por enquanto só parece -, o presidente decidiu abandonar a retórica de candidato, que insistiu em dar continuidade após sua eleição, para assumir, efetivamente, a liderança política que a função e o país reclamam dele.

Não se sabe ainda se essa mudança de postura foi por decisão própria ou por influência dos núcleos que tentam dar a mínima racionalidade ao governo em voga. Bolsonaro, sabidamente, sente-se à vontade nas redes sociais, comportamento reforçado pelos filhos, ministros e seus já consolidados apoiadores.

E, aí, reside um problema: continuar inflamando as redes sociais é ter uma audiência que já lhe é cativa e o considera um "mito". As redes são bolhas, que aproximam os que comungam, muitas vezes, de visão, sentimentos e ações no mesmo campo ideológico.

Vejamos, por exemplo, os termos "nova" e "velha" política. Na campanha, ao se apresentar como representante da "nova política", Bolsonaro usa de eficaz estratégia para se diferenciar dos adversários, todos, todinhos, representantes da "velha política" (do "toma-lá-dá-cá", do fisiologismo, patrimonialismo e corrupção).

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Se, durante a campanha, esse slogan tem validade comunicacional, depois de eleito, com necessidade de governar, por a máquina para rodar, insistir nisso só traz prejuízo e animosidades.

Bolsonaro sempre foi do chamado "baixo clero" parlamentar, teve trajetória considerara corporativista, estatizante e intervencionista no que tange ao Estado brasileiro.

Conseguiu, muito graças às redes sociais e a se colocar contra a esquerda no geral e ao PT e Lula em particular, se descolar de sua carreira política. Ponto para ele.

Agora, continuar a chamar todos os demais de "velha política" e, com isso, considerar apenas a si próprio e aos seus como puros, é rotular toda e qualquer negociação como espúria e suja. Na política a negociação, o diálogo e o convencimento são fundamentais. A negociação, o diálogo e o convencimento só desparecem em situações autoritárias com as liberdades cassadas pelos poderosos, num Estado de exceção.

Talvez o imbróglio com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tenha pesado na decisão de Bolsonaro de sair a campo em prol de sua governabilidade e da reforma da presidência. E as falas de Maia não foram nada agradáveis aos ouvidos presidenciais.

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Sem Maia e desprezando a tal da "velha política", o governo estaria, em pouco tempo, fadado a colher derrotas em cima de derrotas no parlamento, como, por exemplo, na recente PEC que engessa parcela substancial do orçamento e torna obrigatório o pagamento de despesas hoje passíveis de adiamento. Ali, houve um claro recado ao Planalto: ou param com essa retórica beligerante ou os resultados serão péssimos ao governo.

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Outro ponto que pode ter feito Bolsonaro iniciar o diálogo com os líderes partidários foram as pesquisas que indicam o aumento da desaprovação do governo e a diminuição dos que consideram o governo ótimo ou bom.

Como de costume, governo e apoiadores preferiram atirar no carteiro do que entender o conteúdo da mensagem, desprezando os dados da pesquisa realizada pelo Ibope no mês de março, cuja queda, desde janeiro, foi de 15%. Popularidade em queda e rusgas com Maia e demais atores políticos fez o sinal de alerta tocar, ou seja, não bastaria apenas boa performance nas redes sociais e sim necessidade de liderar para governar.

Todas as crises que o governo vivenciou, até agora, nasceram e foram alimentadas dentro do próprio governo.

Não se pode afirmar que exista uma oposição política vigorosa e nem que a mídia esteja numa luta incansável contra o governo ou o presidente. A mídia, no caso, continua noticiando e investigando os que estão sob os holofotes.

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Fez isso com Temer, Dilma, Lula e FHC. Nesse cenário de crises auto gestadas, destacou-se a figura ponderada, lúcida, do Vice-Presidente Hamilton Mourão. Mourão que, durante a campanha, parecia confirmar as ideias caricatas de Bolsonaro, dando algumas declarações no mesmo sentido das de Bolsonaro, depois de findada as eleições, assumiu, rapidamente, a postura que a liturgia do cargo exige.

Quando o presidente não apresenta força política, capacidade intelectual e liderança, os vice-presidentes são mais notados. Não há muitas lembranças de Marco Maciel, vice de FHC ou de José de Alencar, vice de Lula.

Há, contudo, forte lembrança de Temer, vice de Dilma, que assumiu após o impeachment, e, agora, a presença tranquilizante de Mourão. E, por impressionante que possa parecer, atores políticos de esquerda teceram elogios ao vice General enquanto estão aflitos com as falas e decisões do presidente capitão.

Um último evento que pode, também, ter contribuído para Bolsonaro arregaçar as mangas e buscar interlocução, foi a presença de Paulo Guedes no Parlamento. Guedes, que não é político, estava jogado às "feras", desprotegido, até mesmo pelos membros do partido do presidente, o PSL. Guedes até que respondeu às críticas, ironias ou chistes, todavia, ficou patente a ausência de uma estratégia governamental junto à sua base aliada.

Como afirmei, acima, essa mudança de postura, por ora, do presidente Bolsonaro, pode ser cosmética e, em breve, ele pode voltar a atacar tudo e a todos, criando animosidade e riscos à governabilidade.

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No entanto, se o seu comportamento for, realmente, de se abrir à negociação, enfim, de fazer política, nem nova, nem velha, apenas, fazer política, os rumos podem, ainda, ser corrigidos e os resultados serão aguardados.

Para o bem do país, especialmente, mas para o governo também, se Bolsonaro se afastar do discurso eleitoral, das redes sociais e ouvir mais os núcleos racionais de seu governo, há boas expectativas no médio prazo. Bolsonaro não abraçou a "velha política" ele, talvez, pela primeira vez desde eleito, tenha abraçado "a política", como a arte do diálogo e da negociação, mirando na harmonia entre os Poderes da República.

*Rodrigo Augusto Prando, professor e pesquisador do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas, da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduado em Ciências Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp

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