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Bitcoin: desinformação, riscos e oportunidades

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Por Safiri Felix
Atualização:
Safiri Felix. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Nos últimos meses, foram veiculadas reportagens na imprensa sobre pirâmides financeiras e o vínculo dessa prática criminosa com criptoativos, especialmente bitcoin. As notícias costumam retratar a situação de investidores que não conseguem ter acesso a seus recursos sob custódia de empresas suspeitas de operações fraudulentas. Quase sempre as vítimas são atraídas por promessas de lucro fácil e perspectivas de alto retorno financeirogeralmente atrelados a indicação de novos investidores.

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Para o público leigo, essas informações podem levar ao entendimento errôneo de que toda atividade relacionada com bitcoin ou outros criptoativos é ligada a esquemas de pirâmides ou outras práticas ilícitas.

Tamanha desinformação ignora o fato de que, por natureza, a tecnologia blockchain e os principais criptoativos são descentralizados como a própria internet, não sendo controlados por nenhuma empresa ou agente estatal.

É fundamental salientar que esse mercado nascente é formado em sua maioria por empresas sérias, que respeitam a legislação e prezam pelo dever fiduciário de proteger os recursos custodiados dos clientes.

De 2017 para cá, o mercado de criptoativos vem crescendo exponencialmente no Brasil e no mundo. Segundo os primeiros dados da Receita Federal depois que a Instrução Normativa 1888/2019 entrou em vigor - exigindo que pessoas físicas e jurídicas informem todas as transações com ativos digitais -, os criptoativos movimentaram quase R$ 14 bilhões no Brasil, em agosto e setembro. Os números sinalizam o grande potencial e o avanço dos ativos - e mostram a disseminação do bitcoin no Brasil. O país tem potencial para ser um player cada vez mais relevante no mercado de criptoativos.

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Com uma trajetória tão forte de valorização, muita gente passou a se interessar pelo mercado, o que acabou sendo um campo fértil para agentes mal-intencionados.

As pirâmides financeiras são um fenômeno de enorme proporção e crescem baseados na falta de educação financeira, explorando a ganância de pessoas em todo o mundo. Os criminosos tiram proveito da facilidade de se movimentar recursos de forma privada, através de bitcoin, para utilizar os ativos digitais como forma de pagamento de negócios ilícitos.

Quase sempre, os operadores utilizam empresas de fachada e estruturas offshore na tentativa de dificultar o trabalho das autoridades e permitir que esses esquemas tenham braços internacionais espalhados simultaneamente em diversos países.

Não se deve acreditar em promessas de alta rentabilidade garantida de curto prazo. Investimentos voláteis como o bitcoin tendem a apresentar grande valorização, especialmente a médio e longo prazos.

As corretoras de criptoativos filiadas à ABCripto já colaboram com as autoridades na identificação de transações suspeitas e adotam rígidos controles de segurança e compliance. Visando fortalecer o mercado, a associação promove iniciativas educacionais para informar o público sobre as peculiaridades do mercado.

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É preciso aumentar a luz sobre o setor; separar o joio do trigo. O mercado brasileiro de criptoativos é composto por empresas que adotam boas práticas de governança e já investem na educação financeira como ferramenta-chave.

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Estamos diante de um mercado em fase de amadurecimento e disseminação de novos produtos de investimento para o público, com enormes oportunidades, mas também riscos específicos. O bitcoin deve ser uma ferramenta de diversificação, representando uma fatia pequena do portfólio de investimentos, com alocação entre 1 e 5%, visando à construção de patrimônio de forma responsável e consistente, ao permitir exposição à valorização potencial ao mesmo tempo proteger o investidor de eventuais substanciais.

A elaboração de um marco regulatório no país é um movimento natural para legitimação dessa nova classe de ativos e tem potencial de contribuir para o desenvolvimento do setor. O Brasil pode se espelhar em países com regulações mais avançadas como Estados Unidos, Suíça, Japão e Cingapura. O primeiro passo foi a IN 1888, que entrou em vigor dia 1/8/19. Em linha com o processo de desenvolvimento do setor no Brasil, a norma exige que as exchanges - empresas que fazem compra e venda de criptoativos - reportem à RF informação sobre as transações realizadas através das plataformas.

A determinação vale também para pessoas físicas que movimentarem mais de 30 mil reais por mês por conta própria ou se utilizando de corretoras internacionais. A IN alinha o país com determinações de órgãos globais de monitoramento e combate a práticas de evasão fiscal, lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo.

Tramitam no Congresso Nacional quatro projetos de lei que com objetivo de regular o uso de criptoativos no Brasil: PL 2303/2015 (Câmara), PL 2060/2019 (Câmara), PL 3825/2019 (Senado) e PL 3949/2019 (Senado). O PL 2303/2015 encontra-se em fase de audiências públicas na comissão especial e tem ouvido especialistas, reguladores e representantes do setor.

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Mais importante do que a celeridade na construção desse importante marco regulatório é que o processo seja construído a partir do diálogo com o setor e da aplicação das melhores práticas internacionais. A ABCripto defende a criação de uma CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) específica para o setor, para ampliar a segurança jurídica e servir como filtro de consulta da base de empresas autorizadas a operar. Outra demanda é a obrigatoriedade de informação de transações suspeitas e o estabelecimento de um canal de comunicação oficial com a Unidade de Inteligência Financeira (antigo COAF), atualmente sob alçada do Banco Central. Por fim, defendemos a inclusão dos criptoativos no arranjo de pagamentos brasileiro, permitindo a disseminação da tecnologia como meio de pagamento.

A regulamentação deve contemplar regras que garantam instrumentos de proteção ao consumidor e responsabilização clara das empresas intermediadoras. conjunto de regras não pode intimidar a inovação e deve ao mesmo tempo fomentar um ambiente de negócios amigável, sólido e atrativo para investimentos em novas startups. Desta maneira, o setor poderá desenvolver todo o seu potencial, ajudando a economia brasileira a crescer e dando cada vez mais acesso a instrumentos alternativos de construção de patrimônio.

O bitcoin e os ativos digitais representam uma evolução na forma como nos relacionamos com dinheiro, capaz de impactar bilhões de pessoas nos próximos anos. O Brasil não pode correr o risco de ficar de fora de um mercado tão disruptivo.

*Safiri Felix, diretor-executivo da Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABCripto)

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