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Bastidores: Em conversa com Fux, Bolsonaro nega decretar estado de sítio após falar em 'ação dura'

Segundo o 'Estadão' apurou, a ligação partiu de Fux, que decidiu procurar Bolsonaro para esclarecer a posição do chefe do Executivo sobre o tema. Para Marco Aurélio, eventual decretação de medida é 'inadequada'

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Por Rafael Moraes Moura e André Borges/ BRASÍLIA
Atualização:

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, ao lado do presidente Jair Bolsonaro. Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

Atualizado às 21h55

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A escalada nas críticas do presidente Jair Bolsonaro a restrições adotadas por governadores para conter a pandemia levou o presidente do Supremo Tribunal (STF) Federal, Luiz Fux, a pedir nesta sexta-feira (19) explicações do chefe do Executivo sobre referências a um possível estado de sítio no País. Fux telefonou para Bolsonaro após o mandatário afirmar, pela manhã, que "vai chegar o momento" em que o governo federal terá de tomar "ações duras". Ao ministro, o presidente negou que estivesse tratando de medida de exceção.

Questionado por um apoiador como havia sido a conversa, Bolsonaro não quis dar detalhes. "Conversa reservada", disse ele, ao retornar ao Palácio do Alvorada na noite desta sexta.

A ameaça feita mais cedo por Bolsonaro ocorreu ao comparar o fechamento de comércios, escolas e toques de recolher adotados por Estados a um decreto de estado de sítio, medida que só pode ser tomada pelo presidente com aval do Congresso. Líderes do Legislativo, no entanto, rechaçaram ontem dar aval a qualquer iniciativa neste sentido.

Em conversa com apoiadores ao deixar o Alvorada, o presidente insinuou que o País caminha para um cenário de desobediência civil, em que a população se voltará contra os governos locais. "O caos vem aí", disse Bolsonaro.

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"Será que o governo federal vai ter que tomar uma decisão antes que isso aconteça? Será que a população está preparada para uma ação do governo federal dura no tocante a isso? O que  é 'dura'? É para dar liberdade para o povo. É para dar direito para o povo trabalhar. Não é ditadura, não", afirmou o presidente, chamando de "hipócritas" e "imbecis" quem atribui suas declarações a uma tentativa de ruptura democrática. "Um terreno fértil para a ditadura é exatamente a miséria, a fome e a pobreza. Onde um homem, com necessidade, perde a razão. Estão esperando o que? Vai chegar um momento, gostaria que não chegasse esse momento, mas vai acabar chegando."

A ofensiva de Bolsonaro contra os governadores também inclui uma ação no Supremo para derrubar decretos estaduais da Bahia, do Distrito Federal e do Rio Grande do Sul que preveem toques de recolher. O presidente tenta reverter as restrições no momento em que o País passa pelo pior momento da pandemia do novo coronavírus, com recordes sucessivos no número de óbitos diários.

Para o presidente, no entanto, as medidas são "uma decisão política desproporcional" e "subtraíram parcela importante do direito fundamental das pessoas à locomoção". Governadores criticaram a ação, assinada pelo próprio Bolsonaro.

Integrantes do governo federal admitem reservadamente que o "timing" da investida no Supremo não é favorável. A ação foi protocolada na última quinta-feira, no mesmo dia da morte do senador Major Olímpio (PSL-SP) por covid-19.

Estado de sítio. A Constituição prevê que o presidente da República pode solicitar ao Congresso autorização para decretar o estado de sítio nos casos de "comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa" e "declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira". Questionada pela reportagem se o governo já discute internamente a decretação de estado de sítio, a Advocacia-Geral da União (AGU) informou que "isso nunca foi assunto".

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O decano do STF, ministro Marco Aurélio Mello, por sua vez, considera a discussão levantada pelo presidente como "inadequada". "A crise é, ante a pandemia de saúde pública. Cabe ao Poder Central coordenar medidas, considerados Estados e municípios. Estes estão atuando. Estado de sítio é medida extrema e a quadra não o sugere", disse Marco Aurélio ao Estadão.

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Para o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), "não há mínima razão fática, política e jurídica, para sequer se cogitar o estado de sítio no Brasil". "O momento deve ser de união dos Poderes e ações efetivas para abertura de leitos, compras de medicamentos e vacinação", disse Pacheco.

O vice-presidente da Câmara, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), afirmou que a chance de um eventual decreto ter aval do Congresso é "zero". "O País sofrendo os efeitos sanitários, econômicos e sociais do momento mais duro da pandemia, precisando de um líder que una o País pela vacina, pelas empresas e pelos empregos e o presidente falando em estado de sítio e confrontando com discursos que dividem e dispersam energia", afirmou ele.

'Inadequada'.

Na avaliação do professor de direito administrativo da FGV São Paulo Carlos Ari Sundfeld, a decretação de estado de sítio não tem nada a ver com a situação que o Brasil está enfrentando. "Não temos multidões pelas ruas quebrando as coisas, não tem problema de ordem pública.  Não tem conflito social no presente momento. O que existe é uma pandemia que ameaça todas as pessoas", afirmou Sundfeld.

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"O que o presidente da República disse é uma medida absolutamente impertinente, não temos nenhum risco para paz social. Quem está criando algum tipo de confusão é o próprio presidente da República."/ COLABOROU PEPITA ORTEGA

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