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Bases constitucionais do combate à corrupção no Brasil (III)

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Por Fernando Menezes de Almeida
Atualização:
Fernando Menezes de Almeida. FOTO: INAC/DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Em continuação aos dois artigos anteriores que publiquei neste espaço, apresento agora as seguintes ideias. Como da última vez, para facilitar ao leitor, retomo a ligação com o que havia dito anteriormente.

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Em suma, a proposta desenvolvida sustentava que o tratamento da moralidade administrativa e seus desdobramentos no sistema constitucional brasileiro ganhou ênfase especial sob a vigência da Constituição de 1988, marco na retomada da redemocratização do País. A Constituição de 1988 reproduziu, com ligeiras adaptações, o tratamento já consolidado no direito constitucional brasileiro em matéria de responsabilidade de agentes públicos em casos de corrupção e de outros desvios em relação à boa administração, incluindo o crime de responsabilidade de certas autoridades. No entanto, dois aspectos do regime constitucional vigente marcam sua principal diferença em relação à prática dos regimes anteriores: (i) uma diretriz principiológica mais expressa, no tocante ao tratamento da ética no exercício da função pública; e (ii) a criação de novos instrumentos de controle da administração pública, acompanhada da ampliação do alcance de instrumentos existentes.

O tópico (i) foi explorado em meu último artigo. Passo então a fazer considerações sobre o tópico (ii).

A Constituição de 1988 não apenas reforçou as atribuições e a autonomia dos órgãos de controle, como também expandiu os mecanismos para efetivação desse controle.

A ação civil pública, principal instrumento de atuação do ministério público, ganhou menção expressa no artigo 129, inciso III. Por meio dela, o ministério público pode pleitear a anulação de atos administrativos; a condenação do Estado de pessoas privadas a obrigações de fazer ou não fazer; e ainda a condenação de agentes público ou de pessoas privadas a indenizar prejuízos causados ao patrimônio público, ou a direitos difusos e coletivos. Assim sendo, por meio da ação civil pública, além de defender o patrimônio público, o ministério público tutela a moralidade administrativa, o meio ambiente, a ordem econômica, a ordem urbanística e outros interesses ou direitos difusos ou coletivos.

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Ao lado da ação civil pública, a Constituição de 1988 manteve a ação popular (art. 5º, LXXIII) - existente no Brasil desde 1965 - que pode ser ajuizada por qualquer cidadão, visando à anulação de atos administrativos lesivos ao patrimônio público (Lei n. 4.717, de 29 de junho de 1965). Ocorre que a Constituição ainda alargou o cabimento da ação popular, a qual agora passou a abranger também a anulação de atos administrativos lesivos à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.

A Constituição previu ainda no art. 37, § 4º que "os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível". A implementação dessa regra deu-se por meio da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992), que tipificou os atos de improbidade administrativa e previu ação judicial para sua apuração e punição, de competência do ministério público (e das pessoas jurídicas integrantes da administração pública).

A ação de improbidade administrativa segue procedimento muito similar ao previsto para a ação civil pública podendo resultar em sanções de: perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios (art. 12). Tais sanções, nos termos da Lei n. 8.429/92, não excluem eventuais outras sanções civis, penais ou administrativas pelos mesmos fatos ilícitos, sendo certo que não se cumulam sanções iguais.

Na prática, a ação de improbidade administrativa, dadas a severidade de suas sanções e a desenvoltura com que o ministério público a tem manejado, logo tornou-se um dos principais instrumento de combate à corrupção política no Brasil.

Em meu próximo texto, pretendo explorar outro aspecto da ampliação dos controles quanto à moralidade na Constituição de 1988: o reforço das competências e da autonomia dos órgãos de controle.

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*Fernando Menezes de Almeida, professor titular da Faculdade de Direito da USP

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção

Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Acesse aqui todos os artigos, que têm publicação periódica

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