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Auditor da Receita ocultava propinas no 'Mont Blanc Home e Office Itaguaí', diz Lava Jato

Transações imobiliárias de Marco Aurélio Canal e círculos familiares seriam usadas para lavagem de dinheiro tomado de empresários e até de delatores

Por Pedro Prata
Atualização:

O auditor da Receita Marco Aurélio Canal, preso na Operação Armadeira na manhã desta quarta, 2, lavava o dinheiro oriundo de propina com a aquisição de imóveis registrados em nome de terceiros, pessoas próximas e outros auditores envolvidos no esquema, para dificultar a identificação das irregularidades por parte dos órgãos de controle, diz o Ministério Público Federal.

O auditor Marco Aurélio Canal, preso nesta manhã pela Polícia Federal. Foto: Wilton Junior / Estadão

A Operação Armadeira investiga esquema de cobrança de propina e extorsão de réus da Operação Lava Jato e delatores por auditores do Fisco. Canal foi preso por ordem do juiz Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Federal no Rio.

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O empreendimento 'Mont Blanc Home e Office Itaguaí'

O inquérito da Polícia Federal revela que a mulher de Marco Aurélio Canal, Adriana, é sócia de uma tia do auditor fiscal na empresa Eluana Empreendimentos Imobiliários Ltda, criada em julho de 2014, inicialmente com o capital social de R$ 450 mil.

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Três meses depois, a empresa adquiriu parte de um terreno em Itaguaí no valor de R$ 750 mil.

Empreendimento 'Mont Blanc Home e Office Itaguaí'. Foto: MPF/Reprodução

A vendedora foi Sueli Gentil, mãe do também fiscal da Receita Daniel Gentil, sócia da Eureli Imóveis, que teria sido usada para lavar capitais pelo clã Canal.

O terreno teria sido adquirido por Sueli, juntamente com a construtora Azevedo e Cotrik Construções e Incorporações Ltda., pelo valor de R$ 2 milhões.

A parte do terreno adquirida pela empresa Eluana também passaria a ter como co-proprietária a Azevedo e Cotrik. No local, está sendo construído o empreendimento 'Mont Blanc Home e Office Itaguaí', com shopping, torre comercial e torre de flats residenciais.

Documento

Armadeira parte 1

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Até o momento, as investigações não permitem afirmar que houve e quanto foi o aporte de recursos da Eluana Empreendimentos, da mulher de Marco Aurélio, diz a Procuradoria.

Documento

Armadeira parte 2

"Entretanto, é evidente que a demanda de recursos foi vultosa, tudo apontando que tais aportes exigidos não seriam compatíveis com o capital da empresa Eluana Empreendimentos."

Por mais que o terreno pudesse ter sido adquirido a prazo, o que não caracterizaria a priori uma inconsistência patrimoninal, a Procuradoria destaca que só foi feito um novo aporte em 2015 no valor de R$ 275 mil por parte de Marco Aurélio.

Empreendimento 'Mont Blanc Home e Office Itaguaí'. Foto: MPF/Reprodução

"Admitindo-se que a outra sócia também aportou R$ 275 mil, o capital social passou a ser R$ 1 milhão. Dessa maneira, tendo em vista todo o capital que foi aportado na empresa, haveria R$ 1 milhão de capital social integralizado da empresa, e o gasto de R$ 750 mil, por parte do terreno, restando apenas R$ 250 mil para desembolsar nas obras do empreendimento. Dada a dimensão do empreendimento, seu tamanho e nível de sofisticação, tal valor seria bastante inferior ao necessário para uma participação, ainda que não tão grande, na construção do empreendimento."

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Procuradoria revelou intrincada trama entre auditores

Por meio de afastamento do sigilo telemático do também auditor-fiscal Daniel Gentil, foi possível encontrar, segundo a Procuradoria, uma mensagem de áudio entre ele e a mãe, Sueli Gentil, 'que comprovam o esquema de lavagem de dinheiro oriundo de práticas ilícitas'.

"Pelo contexto da conversa, vê-se que a empresa B.MAGTS Administradora de Eireli Imóveis, tem como sócia a mãe de Daniel, Sueli, mas era usada por ele para fazer transações imobiliárias", diz o Ministério Público Federal.

Empresa em nome de Sueli Gentil era usada por Daniel Gentil para fazer transações imobiliárias. Foto: MPF/Reprodução

Em uma ocasião, a Eireli Imóveis foi usada para comprar um imóvel em Petrópolis no valor de R$ 200 mil.

"Sueli ficou preocupada com a possibilidade do alto valor chamar a atenção, uma vez que seria muito acima do capital social da Eireli. Daniel, no entanto, diz que o valor seria dividido em 20 parcelas de R$ 10 mil, o que afastaria suspeitas dos órgãos de controle."

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Segundo a Operação Armadeira, 'os investigados invertem a lógica prevista pela lei para o instituto jurídico do capital social'.

"Em vez de usar o capital social, somado a eventual rendimento da empresa, para então adquirir bens imóveis, os investigados primeiro adquirem bens imóveis, para depois saber se tais bens possuem lastro ou não no capital social da empresa, isso é, se haveria ou não incompatibilidade patrimonial da empresa."

Na conversa interceptada, Daniel Gentil se refere a três imóveis seus que estariam sob o nome da Eireli Imóveis - um apartamento na avenida Lúcio Costa, no valor de R$ 1 milhão; aquele que seria adquirido em Petrópolis, por R$ 200 mil; e um terceiro imóvel, no Recreio.

Na análise da Procuradoria, os imóveis citados teriam relação com o clã Canal, também investigado no esquema.

O apartamento de R$ 1 milhão na avenida Lúcio Costa

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Com relação ao imóvel da avenida Lúcio Costa, este foi vendido pelo cunhado de Fabio Cury, Leonardo Paciello, à Eureli Imóveis. No entanto, quem seria o verdadeiro beneficiado por ele seria o círculo familiar de Marco Aurélio Canal.

Essa intrincada trama, diz a Procuradoria, indicaria 'fortes indícios desse negócio imobiliário se tratar de uma das etapas de distanciamento e ocultação de valores ilícitos recebidos, configurando lavagem de capitais'.

Notas fiscais da compra de produtos orgânicos e de ração de gato em nome de Adriana Canal, mulher de Marco Aurélio, aumentaram as suspeitas de que eles eram os verdadeiros proprietários do imóvel.

Clã Canal estava registrado como morador do prédio de R$ 1 mi. Foto: MPF/Reprodução

Por fim, como os integrantes da família Canal eram os únicos registrados como moradores do condomínio, os investigadores ficaram mais certos de que eles seriam os reais proprietários.

Outra pessoa que remetia suas notas fiscais para o apartamento de R$ 1 milhão era Glicério Deprá, pessoa próxima a Canal.

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Deprá ele era sócio do estacionamento 'Amigo do Caminhoneiro Ltda'., que formalmente é dono de um carro Gol que, na verdade, era utilizado por Marco Aurélio Canal.

O apartamento de Petrópolis

O apartamento de Petrópolis que seria adquirido pela Eureli Imóveis em 20 parcelas de R$ 10 mil foi vendido por Sociedade de Propósito Específico (SPE) Prodígio Empreendimentos Imobiliários Ltda., de propriedade também de Leonardo Paciello, cunhado de Fabio Cury.

Segundo o Ministério Público Federal 'há indícios, portanto, de que novamente se repete o modus operandi da lavagem de ativos, sendo primeiro um imóvel adquirido por Leonardo Paciello, em seu nome próprio ou de empresa a ele pertencente, para depois se transferir para a empresa individual B.Magts Administradora de Imóveis Eireli, em nome de Sueli Gentil, mas que, como comprovam os áudios, é usada ao menos em parte para abarcar imóveis 'do lado' de Daniel Gentil'.

Ainda, outro sócio da SPE seria a CP-2 Engenharia Limitada, de propriedade dos sogros de Fabio Cury, Cezar Paciello e Maria Cristina Paciello.

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O imóvel do Recreio

Os investigadores ainda identificaram o uso da administradora Eureli Imóveis para lavagem de valores recebidos ilicitamente por meio de transações imobiliárias para a compra de mais um apartamento.

O apartamento no Recreio foi adquirido pela Eureli Imóveis em 2015 por R$ 300 mil, e vendida no ano seguinte para João Batista Silva e Eluiza da Silva, tios de Marco Aurélio Canal.

No entanto, a Receita Federal não encontrou 'movimentações financeiras nas contas de Maria Cristina compatíveis com a alienação do apartamento localizado na Estrada do Pontal'.

COM A PALAVRA, A DEFESA DE MARCO AURÉLIO CANAL

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A defesa do auditor fiscal da Receita Federal Marco Aurélio Canal classificou a prisão de seu cliente como "ilegal", "de viés exclusivamente político" e "pautada em supostas informações obtidas através de 'ouvi dizer'".

O advogado Fernando Martins, responsável pela defesa de Canal, declarou, por meio de nota, "que se trata de mais uma prisão ilegal praticada no âmbito da denominada operação Lava Jato, eis que de viés exclusivamente político, atribuindo a Marco Canal responsabilidades e condutas estranhas à sua atribuição funcional e pautada exclusivamente em supostas informações obtidas através de 'ouvi dizer' de delatores".

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