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Audiência de custódia em tempos de pandemia do coronavírus

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Por Thaís Bratifich Ribeiro
Atualização:
Thaís Bratifich Ribeiro. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Iniciadas no ano de 2015 por iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as audiências de custódia foram implementadas no Brasil com o propósito de assegurar o cumprimento de pactos e tratados internacionais de direitos humanos, que previam a necessidade de apresentação imediata do preso perante um juiz.

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As audiências de custódia estabelecem que, no prazo de até 24 horas da prisão em flagrante, será garantido o contato pessoal do preso com um juiz, a fim de que seja analisada a legalidade da prisão em flagrante, a ocorrência de eventuais práticas de maus tratos e tortura, bem como a necessidade da prisão preventiva do conduzido, ou da concessão de liberdade provisória, com a aplicação ou não de outras medidas cautelares diversas da prisão.

A efetiva implementação das audiências de custódias é uma forma eficiente de combater a superlotação carcerária, uma vez que, antes da execução dessa medida, muitos presos aguardavam meses até que sua prisão fosse analisada por um magistrado.

Desde a declaração de pandemia global do novo coronavírus (covid-19) pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o problema do encarceramento em massa ganhou contornos ainda mais dramáticos, razão pela qual o efetivo controle da necessidade da prisão preventiva, através das audiências de custódia, torna-se ainda mais crucial sob uma ótica sanitária e humanitária.

As audiências de custódia, antes realizadas com o contato pessoal entre o preso, juiz, defensor e membro do Ministério Público, poderão ser realizadas, excepcionalmente, por meio de videoconferência, a fim de evitar a disseminação do vírus, segundo as determinações de cada Tribunal.

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No entanto, não podemos deixar de apontar que a ausência de pessoalidade do ato descaracteriza a própria essência da audiência de custódia. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário, dispõe que toda pessoa detida deve ser conduzida, sem demora, "à presença" de um juiz.

Somente a apresentação física do preso garante ao juiz a exata captação das emoções, gestos e veracidade de eventuais relatos de maus-tratos. Afinal, como esperar que o preso detido nas próprias dependências da delegacia relate, sem medo de represálias, as circunstâncias de sua prisão?

A importância da audiência de custódia reside, precisamente, na pessoalidade do ato, permitindo que o preso seja retirado de um contexto que poderia viciar a voluntariedade e veracidade do seu relato, e seja conduzido à presença física do juiz, promotor e seu defensor.

Portanto, as audiências de custódia por meio de videoconferência, em época de pandemia do novo coronavírus, devem ser conduzidas com cuidado redobrado, de modo a não frustrar os objetivos para os quais foi criada, devendo ser adotada de modo absolutamente excepcional.

Atento à necessidade de reforçar ainda mais a excepcionalidade da prisão preventiva em tempos de pandemia pelo novo coronavírus, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a  Recomendação nº 62, de 17 de março de 2020, trazendo como orientação para as audiências de custódia "a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias."

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Sabe-se que a máxima excepcionalidade da prisão preventiva já deveria ser a regra do nosso sistema processual penal, que tem a liberdade como regra máxima, e a prisão provisória como medida cautelar excepcional. Entretanto, a orientação do Conselho Nacional de Justiça é bastante oportuna diante do número excessivo de presos provisórios no Brasil, fruto da histórica banalização da prisão preventiva pelos juízes e Tribunais do país.

Com efeito, diante do alto índice de transmissibilidade do vírus, da superlotação carcerária, das condições insalubres dos cárceres e, por fim, da escassez de recursos médicos nos estabelecimentos prisionais, espera-se que a audiência de custódia seja conduzida de modo a mitigar, ao máximo, os riscos sanitários e humanitários inerentes à prisão em temos de pandemia.

*Thaís Bratifich Ribeiro, especialista em Direito Penal e Criminologia do escritório Vilela, Silva Gomes & Miranda Advogados

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