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'As urgências do momento requerem soluções estatais', pedem entidades ao Supremo

Grupo de 14 centrais de trabalhadores e associações de classe que reúnem também juízes e auditores do Trabalho expõem preocupações às vésperas do julgamento de medidas cautelares no âmbito das ADIs 6342 e 6363 no STF, marcado para quinta, 16

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Por Redação
Atualização:

A estátua da Justiça, em frente ao Supremo Tribunal Federal. Foto: Dida Sampaio / Estadão

Às vésperas de julgamento no Supremo Tribunal Federal sobre as medidas provisórias trabalhistas editadas em meio a pandemia do novo coronavírus, entidades de trabalhadores, advogados, juízes, procuradores e sindicatos afirmam 'as urgências do momento requerem soluções estatais, não soluções que fragilizem ainda mais trabalhadores e trabalhadoras'. Na pauta da sessão por videoconferência do STF desta quinta, 16, está o referendo de liminar do ministro Ricardo Lewandowski que determinou a manifestação dos sindicatos em acordos de redução de salário e jornada de trabalho.

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Em nota, 14 entidades dizem 'esperar do Supremo Tribunal Federal a preservação da integridade do ordenamento jurídico-constitucional em vigor' e julgue procedente ação contra dispositivos de medidas provisórias trabalhistas editadas em meio a pandemia do novo coronavírus.

A nota

Assinam o texto a Central dos Trabalhadores e das Trabalhadoras do Brasil, a Associação Brasileira de advogados trabalhistas, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, Central dos Sindicatos Brasileiros, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, a Federação Interestadual dos Trabalhadores e pesquisadores em serviços de telecomunicações, a Nova Central Sindical de Trabalhadores Associação Luso-Brasileira de juristas do trabalho, a Força Sindical, a União Geral dos Trabalhadores, a Central Única dos Trabalhadores, a Associação Juízes para a Democracia, a Associação Americana de Juristas e a Rede Nacional de Pesquisas e Estudos em Direito do Trabalho e da Seguridade Social.

A nota afirma que a Constituição assegurou aos trabalhadores 'o direito à irredutibilidade de seus salários, fazendo ressalva, unicamente, à negociação coletiva'. Segundo o texto, 'mesmo nas duas únicas hipóteses de excepcionalidade constitucional - estado de sítio e defesa - as restrições só podem ser tomadas quanto a direitos e garantias diversos dos previstos no artigo 7º da Constituição'.

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"Logo, se é certo que as hipóteses constitucionais de suspensão ou constrição de direitos fundamentais demandam necessária interpretação restritiva, não é admissível estender tais restrições aos direitos e garantias do art. 7º, como a do seu inciso VI - 'irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo'", ressalta a nota.

Referendo de Liminar

Entre as ações que serão discutidas na sessão plenária do Supremo desta quinta, 16, está a liminar deferida pelo ministro Ricardo Lewandowski que determinou a manifestação dos sindicatos em acordos de redução de salário e jornada de trabalho. A possibilidade está prevista na MP 936, do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, do governo Jair Bolsonaro.

Nesta segunda, 13, o ministro negou negou recurso apresentado pela Advocacia-Geral da União (AGU) contra a decisão.

A medida, na prática, mantém um trâmite adicional para que empresas possam fazer acordos pela redução de salários dos funcionários durante a crise do coronavírus. O ministro permite que acordos individuais feitos entre patrões e empregados sejam revistos por sindicatos e utilizados para negociação coletiva da categoria. Em caso de omissão do sindicato, o acordo individual fica valendo.

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Lewandowski destacou que os acordos individuais já celebrados e ainda por serem firmados produzem efeitos imediatos, inclusive para o pagamento do benefício emergencial. Os tratados só poderiam ser modificados, então, por negociação coletiva da categoria.

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Confira a íntegra da nota

As entidades abaixo subscritas, ante a sessão de julgamento designada para o dia 16/4 p.f., quando serão apreciadas pelo Pleno do C. Supremo Tribunal Federal as medidas cautelares requeridas nas ADIs ns. 6342 e 6363, relativas às medidas trabalhistas previstas, respectivamente, nas Medidas Provisórias ns. 927/2020 e 936/2020, vêm a público externar e exortar como segue.

1. Na história mais recente do Brasil, firmou-se um pacto em torno do Estado Social, notabilizado pela consagração da dignidade humana como princípio fundamental da República e pela elevação dos direitos sociais à categoria dos direitos fundamentais, gerando como efeito a positivação constitucional do valor social da livre iniciativa, da função social da propriedade - e, portanto, de todo o processo produtivo - e o primado de que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, deve ter por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (art. 170).

2. Neste momento crítico, diante do quadro da pandemia mundial da Covid-19 - que instaura uma profunda crise humanitária de caráter difuso e globalizado, tendente a golpear mais rudemente os enfermos, os idosos e os economicamente desfavorecidos - e na sequência da decretação do estado de calamidade pública pelo DL n. 6/2020, vieram a lume as Medidas Provisórias ns. 927/2020 e 936/2020, com medidas trabalhistas das mais diversas ordens, a merecer um olhar atento e crítico do Congresso Nacional, da comunidade jurídica e da sociedade em geral. Quanto aos temas em debate no próximo dia 16/4, é de rigor reafirmar publicamente que a Constituição, baseada no princípio da melhoria progressiva da condição social dos trabalhadores e trabalhadoras, assegurou a estes o direito à irredutibilidade de seus salários, fazendo ressalva, unicamente, à negociação coletiva, cuja regularidade, como em todo negócio jurídico, depende de concessões recíprocas e da observância dos princípios da paridade de armas e da boa-fé objetiva, dentre outros.

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3. As urgências do momento requerem soluções estatais, não soluções que fragilizem ainda mais trabalhadores e trabalhadoras, submetendo-os à formalização, em estado de necessidade, de acordos individuais com seus empregadores. As propostas contidas nas MPs 927/2020 e 936/2020, quanto às negociações individuais para rebaixamento de salários, são flagrantemente inconstitucionais, já que alijam os sindicatos do necessário diálogo social.

4. De outra parte, cabe ver que, mesmo nas duas únicas hipóteses de excepcionalidade constitucional - estado de sítio e defesa (CF, arts. 136 e 137) -, as restrições, em rol textualmente exaustivo ("[...] só poderão ser tomadas [...]"), dizem respeito a direitos e garantias diversos daqueles previstos no art. 7º da Constituição. Logo, se é certo que as hipóteses constitucionais de suspensão ou constrição de direitos fundamentais demandam necessária interpretação restritiva, não é admissível estender tais restrições aos direitos e garantias do art. 7º, como a do seu inciso VI ("irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo"). Isso é tanto mais verdadeiro em caso de "estado de calamidade pública", que não deita raízes na Constituição da República, mas na Lei de Responsabilidade Fiscal (LC n. 101/2000, art. 65).

5. Nessa linha, como forma de se preservar a Constituição e garantir a eficácia dos direitos humanos e fundamentais, conferindo viabilidade concreta à ordem econômica, sendo esta uma das principais urgências do momento, a solução jurídica necessária é a da declaração da procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade dos dispositivos das MPs 927 e 936 que permitem acordo individual para redução de salários.

6. A sociedade civil espera do Supremo Tribunal Federal a preservação da integridade do ordenamento jurídico-constitucional em vigor, fazendo valer a literalidade do texto constitucional. Caminhar noutro sentido e admitir quaisquer relativizações para quaisquer excepcionalidades, ao alvedrio do intérprete e fora dos estritos lindes da letra constitucional, seria instaurar perigoso precedente para o regime democrático.

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