Mauro Teixeira Pinto*
08 de janeiro de 2021 | 08h00
Mauro Teixeira Pinto. FOTO: DIVULGAÇÃO
O adensamento populacional nas regiões centrais da cidade gera retorno certo. A aproximação de moradia e emprego e a intensificação do uso da infraestrutura já instalada levam ao aumento da produtividade do trabalho e das possibilidades de ascensão social, democratizam o acesso à equipamentos públicos e culturais e diminuem agressões ao meio ambiente. Além disso promovem determinadas atividades econômicas ligadas ao setor de serviços, como turismo e comércio, criando novos empregos.
A Lei da Operação Urbana Centro (OUC) de 1997 veio neste sentido. Depois de pífio impacto inicial, fruto de questões decorrentes de acomodação macroeconômica pós Plano Real, progressivamente a Lei foi “pegando”. Nos últimos anos ocorreram diversos lançamentos imobiliários e recuperações de prédios antigos a atrair novos habitantes para a região.
Não se tratou de um boom, evidentemente. Aqueles que ali pretendem empreender ou habitar ainda precisam enfrentar adversidades específicas, sendo a maior e mais desapontante as graves deficiências na zeladoria urbana.
Ainda que imatura, apesar de tantos anos já decorridos, o progresso na reocupação da região motivou o poder público a revisar seus marcos legais, exigência contida já no Plano Diretor Estratégico de 2014, por meio da elaboração do Projeto de Intervenção Urbana do Setor Central (PIU-SCE), encaminhado à Câmara no final do ano passado.
O PIU, porém, possui estímulos contraditórios. Por um lado, contém diversos pontos positivos, como a ampliação da área de escopo da OUC para os distritos de Belém, Bom Retiro, Pari e Santa Cecília, mecanismos de estímulo à habitação de interesse social, retrofits, preservação/recuperação de bens tombados, regularização de edifícios existentes e parcerias com o setor privado e ênfase na afirmação da função social da propriedade.
Abrange também um plano de intervenções urbanísticas bem definido. Mas como este exige recursos, é proposta a cobrança de outorgas onerosas sobre as novas construções, direcionando os valores então arrecadados para sua execução.
Revela-se aí a primeira incoerência. A legislação, desejando acelerar o desenvolvimento e ocupação de determinada região, naturalmente deveria torná-la mais acessível, e não menos.
Se o centro histórico não se desenvolveu na velocidade esperada sem o pagamento de outorga, por que mudaria com o pagamento? Por que alguém investiria no Pari ou no Belém se em regiões mais estabelecidas o retorno e a segurança do investimento são maiores? A região para a qual se deseja deslocar o público não deveria ter incentivos maiores do que a região de origem do público, como nos bairros periféricos, e não menores, como incorpora o texto?
O problema é conceitual. O projeto desconsidera o retorno devido aos fatores elencados no primeiro parágrafo acima, que certamente em muito ultrapassam os valores a serem cobrados através da outorga. E ignora que o aumento nos custos será repassado aos preços finais, o que reduz a competitividade da região central face o restante da cidade. Difícil apostar que apenas as futuras intervenções contidas no plano seriam suficientes para compensar os danos da cobrança.
Outro ponto negativo é a inserção de desnecessárias cláusulas intervencionistas que impõe tipologias e limitações ineficazes.
Por fim, o PIU mantém a aposta no estilo “cidade-paliteiro”. Perde-se ótima oportunidade de ousar promovendo uma urbanização realmente adensada e moderna como tanto admira-se mundo afora.
Vale ressaltar que a proposta contempla a duração de suas regras por 20 anos, sem previsão de revisão.
*Mauro Teixeira Pinto é economista e sócio-diretor da TPA Empreendimentos
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