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Após Justiça colocar Vital do Rêgo no banco dos réus, 2ª Turma do STF suspende ação penal

Na prática, o entendimento da 2ª Turma impõe revés à Lava Jato ao sustar a decisão tomada pelo juiz Luiz Antônio Bonat, que havia recebido a denúncia contra ministro do TCU por corrupção e lavagem de dinheiro. Empates já favoreceram réus 9 vezes

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Por Rafael Moraes Moura/ BRASÍLIA
Atualização:

O ex-senador e ministro do Tribunal de Contas da União Vital do Rêgo. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Um dia depois de o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo ser colocado no banco dos réus da Lava Jato, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (1) suspender o caso até a conclusão do julgamento de um recurso no STF.

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Na prática, o entendimento da 2ª Turma impõe mais um revés à Operação Lava Jato ao sustar a decisão tomada pelo juiz Luiz Antônio Bonat, da 13.ª Vara Federal de Curitiba, que havia recebido a denúncia contra Vital do Rêgo por corrupção e lavagem de dinheiro. A decisão também suspende ação penal aberta contra o ex-deputado Marco Maia, no ano passado, no mesmo caso.

Levantamento feito pelo Estadão/Broadcast nos principais julgamentos da 2ª Turma realizados ao longo deste ano aponta que em nove vezes réus foram favorecidos com empates no colegiado, desfalcado com a ausência do decano, Celso de Mello, que se recupera de cirurgia médica.

Ex-senador, Vital do Rêgo é acusado pelos procuradores de receber R$3 milhões em propinas do ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, em troca da obstrução dos trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Petrobrás. A CPMI, que investigou casos de corrupção na estatal, foi presidida pelo emedebista e jamais convocou executivos de empreiteiras posteriormente denunciadas por desvios.

No ano passado, o relator da Lava Jato do STF, Edson Fachin, enviou o caso à Justiça Federal do Paraná, já que as investigações não se enquadravam nos atuais critérios do foro privilegiado - que só vale para os crimes cometidos no exercício do mandato e em função do cargo. Os fatos investigados ocorreram em 2014, quando Vital do Rêgo ocupava ainda o cargo de senador. O atual ministro do TCU entrou depois com um recurso contra a decisão de Fachin que encaminhou o inquérito para a primeira instância. A denúncia foi recebida por Bonat antes que o julgamento do recurso de Vital do Rêgo fosse concluído no STF.

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"Não foram apresentados quaisquer indícios de provas ou diligências capazes de comprovar participação de Vital do Rêgo na prática de atos. O inquérito se baseia em provas e indícios indiretos e em conjecturas e ilações que não podem sustentar o prosseguimento da investigação", disse Gilmar Mendes, um dos expoentes da ala mais crítica à Lava Jato, ao defender o arquivamento do caso.

"Não se pode permitir o prosseguimento das investigações e o recebimento da denúncia com base apenas nos depoimentos de delatores."

Para a força-tarefa da Lava Jato, foi arquitetada uma "blindagem" das construtoras em troca de propinas negociadas entre abril e dezembro de 2014. No mesmo ano, a Lava Jato iniciava a primeira fase dos trabalhos que, desde então, têm revelado camadas de esquemas de corrupção montados para desviar recursos da estatal e de suas subsidiárias.

"A investigação se arrasta há mais de quatro anos. Se está diante de um constrangimento ilegal", criticou Ricardo Lewandowski, também integrante da ala mais crítica à Lava Jato.

O ministro Edson Fachin, relator do caso, decidiu pedir vista (mais tempo para análise) para examinar melhor as questões levantadas no voto de Gilmar Mendes. Com o julgamento interrompido, por 2 a 2, a Segunda Turma acabou decidindo suspender a ação penal aberta contra Vital do Rêgo até que a discussão do caso fosse concluída no STF. Não há previsão de quando Fachin vai devolver o processo para julgamento.

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Em outro caso, também julgado nesta terça-feira, a Segunda Turma decidiu retirar da Justiça Federal de São Paulo e enviar para a Justiça Eleitoral (onde as penas são mais brandas) uma investigação de corrupção contra o deputado federal Marcos Pereira (Republicanos-SP), presidente nacional do Republicanos. Novamente, a turma se dividiu: Fachin e Cármen Lúcia votaram para manter o caso na Justiça Federal de São Paulo; Lewandowski e Gilmar Mendes, para encaminhá-lo à Justiça Eleitoral do DF, atendendo ao pedido do investigado.

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Marcos Pereira é acusado por delatores da Odebrecht de receber valores da empreiteira em troca de apoio e tempo televisivo do PRB à campanha de reeleição de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) em 2014. Ele teria negociado um repasse de R$ 7 milhões da Odebrecht para o PRB na campanha de 2014.

Empates. Levantamento do Estadão/Broadcast feito em sessões do colegiado neste ano aponta que, em oito julgamentos realizados sem a presença do decano, o placar foi de 2 a 2, aplicando assim o princípio jurídico de que, em casos de empate, os réus devem ser beneficiados.

A Segunda Turma é composta por cinco dos 11 ministros do STF. Entre os casos que aguardam uma definição do colegiado está o habeas corpus em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acusa Moro de ser parcial ao condená-lo na ação do tríplex do Guarujá - esse julgamento foi iniciado em dezembro de 2018 e até hoje não foi concluído. Outro processo sem previsão de julgamento na Turma é a ação em que o Ministério Público do Rio contesta a decisão do Tribunal de Justiça local que garantiu foro privilegiado ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no caso Queiroz, revelado pelo Estadão/Broadcast.

Responsável por julgar casos da Lava Jato, a Segunda Turma expõe as divisões internas do Supremo quando se trata da operação que desbaratou um esquema bilionário de corrupção. De um lado, Fachin e Cármen são considerados magistrados mais "punitivistas", linha-dura, tendendo a votar pela condenação de réus e a favor dos interesses de investigadores. De outro, Gilmar e Lewandowski são ministros garantistas, mais críticos à atuação do Ministério Público e mais inclinados a ficar do lado dos direitos dos investigados. Com essa divisão, muitas vezes cabe a Celso de Mello definir o placar do resultado.

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COM A PALAVRA, O ADVOGADO DANIEL GERBER, QUE DEFENDE MARCO MAIA

"Era o esperado. Por anos a investigação nada trouxe de concreto aos autos, com o MPF oferecendo uma denúncia desamparada de quaisquer elementos que não a vontade do acusador em valorar a palavra de determinados delatores que negociaram suas liberdades ao preço de fantasias. Fez-se a ordem, no caso concreto, e o que se espera é que o novo posicionamento do STF sobre a possibilidade de análise dos acordos de delação por parte dos delatados amplie a percepção de que muito do que foi dito não passa de especulação negocial em interesse próprio, e nada mais".

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