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Réu confesso, Duque obtém direito a sair da cadeia após 5 anos de pena

Juiz da Lava Jato deu benefício da progressão de regime de prisão para ex-diretor da Petrobrás, condenado há mais de 50 anos em 4 processos, mas alertou defesa que acordos de colaboração devem ser feitos com MPF e não com o juízo

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Foto do author Luiz Vassallo
Por Ricardo Brandt , Fausto Macedo e Luiz Vassallo
Atualização:

Renato Duque, em depoimento a Moro que confessou crimes. Foto: Reprodução

Condenado a mais de 50 anos de prisão em três processos da Operação Lava Jato, o ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato de Souza Duque conseguiu com a confissão dos crimes na Justiça o benefício de ter sua pena de prisão em regime fechado limitada a 5 anos - ele está detidos desde abril de 2015.

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"Considerando, cumulativamente, a elevada culpabilidade do condenado, o papel central dele no esquema criminoso, a colaboração tardia, a convergência do depoimento prestado com o restante da prova dos autos e a renúncia aos saldos das contas bloqueadas, é o caso de não impor ao condenado, como condição para progressão de regime, a completa devolução do produto do crime, mas apenas daqueles valores em sua posse, como os mantidos em contas no exterior ou convertidos em bens no Brasil, e admitir a progressão de regime de cumprimento de pena depois do cumprimento de cinco anos no regime fechado, isso independentemente do total de pena somada, o que exigiria mais tempo de cumprimento de pena."

A decisão é o juiz federal Sérgio Moro, das ações da Lava Jato em primeira instância, em Curitiba, que condenou pela quarta vez Duque no escândalo Petrobrás. O ex-diretor foi sentenciado a uma pena de 5 anos e 4 meses de prisão, por crime de corrupção passiva, nesta segunda-feira, 26, no processo em que foi condenado o ex-ministro Antonio Palocci - 12 anos e 2 meses.

Na prática, passados os 5 anos de regime fechado, ele pode começar a progredir para o regime semi-aberto, em que fica na cadeia, mas com direito a sair durante o dia, ou até mesmo para o regime de prisão domiciliar.

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Os acusados teriam se envolvido no pagamento de US$ 10,2 milhões em propinas da Odebrecht para o PT. O dinheiro foi pago entre 2012 e 2013 para o marqueteiro do partido João Santana e estaria relacionado ao contrato do Estaleiro Enseada Paraguaçu - do grupo - para fornecimento de plataforma de petróleo para a Petrobrás, via empresa Sete Brasil.

Em sua terceira tentativa de fechar um acordo de delação premiada com a força-tarefa da Operação Lava Jato, Duque confessou em juízo (veja vídeos), em maio, que era homem do PT no esquema de apadrinhamento de diretores da Petrobrás para arrecadação de propinas em grandes contratos da estatal.

A estratégia da defesa do ex-diretor foi buscar benefícios de redução de pena diretamente com o juiz. No processo, o criminalista Antonio Figueiredo Basto, que defende Duque, pediu uma redução de 2/3 da pena, com base na lei de lavagem de dinheiro, de 1998.

O advogado argumentou que o cliente reconheceu as suas responsabilidades no acerto de corrupção e que, mesmo sem acordo de colaboração, contribuiu para o esclarecimento dos fatos, identificação dos responsáveis pelos crimes e recuperação do produto do crime e que "prestou informações relevantes para outras ações penais".

 Foto: Estadão

Atenuante. Duque obteve ainda uma redução de seis meses em sua pena pelo crime de corrupção passiva, inicialmente calculada em 4 anos e 6 meses de prisão, e redução no valor a ser ressarcido pelos crimes.

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"Considerando duas vetoriais negativas, de especial reprovação, fixo, para o crime de corrupção passiva, pena de quatro anos e seis meses de reclusão. Reconheço a atenuante da confissão, reduzindo a pena para quatro anos de reclusão", escreveu Moro.

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Ao todo, sua condenação foi fixada em 5 anos e 4 meses de prisão. Negativamente, pesou contra ele o fato de o valor "bastante expresssivo", de USD 10,2 milhões, em corrupção ter sido pago dentro de um esquema maior, de "conta corrente geral de propinas" com acertos de até R$ 200 milhões.

Outro elemento negativo que elevou a pena foi que a propina pagou, sem registro, "serviços prestados em campanhas eleitorais". A contaminação com recursos do crime do processo político democrático é o elemento mais reprovável do esquema criminoso da Petrobrás.

Tarde. A decisão é uma vitória para a defesa de Duque. Considerado um dos alvos da Lava Jato que terá a maior pena cumulativa no escândalo - pode ultrapassar os 100 anos de cadeia -, o ex-diretor busca o acordo com o procuradors desde o final de 2016, sem sucesso.

"Pretende a defesa de Renato de Souza Duque o reconhecimento da colaboração do condenado com a Justiça e, por conseguinte, a redução da pena ou modulação da pena para regime mais favorável", observou Moro, em sua sentença.

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Para o juiz, "a colaboração foi tardia, já ao final do processo, e não trouxe informações totalmente novas, já que o esquema criminoso já havia sido revelado por outros" e que "o maior problema" é a falta de um acordo formal com o Ministério Público Federal.

"O problema maior em reconhecer a colaboração é a falta de acordo de colaboração com o MPF e a celebração deste envolve um aspecto discricionário que compete ao MPF, pois não serve à persecução realizar acordo com todos os envolvidos no crime, o que seria sinônimo de impunidade."

 Foto: Estadão

Impunidade. Com pouco mais de 3 anos de Lava Jato e 154 acordos de delação homologados, Moro afirmou em sua sentença que "cabe também ao MPF avaliar se os ganhos obtidos com a colaboração, como a qualidade da prova providenciada pelo colaborador, justificam o benefício concedido ao criminoso".

"Por envolver elemento discricionário, salvo casos extremos, não cabe, princípio, ao Judiciário reconhecer benefício decorrente de colaboração se não for ela precedida de acordo com o MPF na forma da Lei nº 12.850/2013."

O juiz destaca que o ex-diretor foi condenado em outros processoes em que não houve colaboração. "Nesse caso, não pode ser considerada a colaboração em um único processo, sendo necessária uma abordagem abrangente e completa, com a revelação de todos os crimes."

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Segundo ele, por essa necessidade de uma abordagem abrangente e completa dos crimes praticados e de outros que ele tem conhecimento, "é necessário que a colaboração e a eventual concessão de benefícios sejam objeto de um acordo de colaboração com o Ministério Público, sendo inviável a este Juízo concedê-lo diretamente".

Em maio, quando falou pela primeira vez como candidato a colaborador, Duque citou Lula e seu suposto papel de mando no bilionário esquema de cartel e corrupção instalado na estatal, desbaratado pela Lava Jato, que desviou em dez anos, mais de R$ 40 bilhões para bancar PT, PMDB e PP, e outros partidos da base.

O ex-diretor relatou três encontros com Lula, após ele deixar a Petrobrás, em 2012, em que foi tratado de temas de contratos da estatal, em que houve pagamento de propinas - em especial, das sondas de exploração de petróleo da empresa Sete Brasil.

"Ficou claro para mim que ele conhecia tudo."

 Foto: Estadão

Reconhecimento. Moro afirmou não se opor à colaboração do réu e reconheceu sua confissão e as informações relevantes prestadas por Duque.

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"Apesar dessas considerações e da recomendação ao condenado e sua Defesa para que procurem o Ministério Público Federal, é o caso de reconhecer, não só a confissão do condenado acima já valorada, mas que ele também prestou algumas informações relevantes sobre o esquema criminoso por parte de terceiros."

O juiz registrou ainda: "esclareça-se que este Juízo não se opõe a eventual colaboração do condenado em questão". "Mas ele e o seu defensor devem procurar a instituição legitimada a sua celebração, o Ministério Público, e não perseguir o benefício diretamente em Juízo."

Para Moro, "na incerteza que haverá viabilidade de um acordo na forma da Lei nº 12.850/2013, é o caso de algum reconhecimento do valor da colaboração do condenado e da concessão de algum benefício".

O juiz destaca que a lei de combate à lavagem de dinheiro permite "a concessão de amplos benefícios, como perdão judicial, redução de pena ou modulação de regime de cumprimento da pena, a réus colaboradores". Mas ressalta que "não faz sentido conceder, porém, esse benefício isoladamente a pessoa que já foi condenada em várias ações penais".

Moro estendeu o benefício às penas unificadas nos demais processos julgados por ele "e fica condicionado à continuidade da colaboração, apenas com a verdade dos fatos, e a renúncia pelo condenado a todos os bens provenientes do crime."

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O juiz deu dez dias para Duque entregar petição subscrita por ele abrindo mão dos valores encontrados em quatro contas secretas mantidas fora do Brasil. Em duas delas, a Milzart Overseas e a Pamore Assets, no Banco Julius Baer, no Principado de Monaco, tem saldo de cerca de 20.568.654,12 euros - já bloqueados.

"Caso constatado, supevenientemente, falta de colaboração ou que o condenado tenha faltado com a verdade, o benefício deverá ser cassado."

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