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Após Bolsonaro não entregar exame, 'Estadão' pede apuração de descumprimento de ordem

Na segunda-feira, "O Estado de S. Paulo" garantiu o direito de obter os testes de covid-19 feitos pelo presidente Jair Bolsonaro. Por decisão judicial, União teve um prazo de 48 horas para fornecer "os laudos de todos os exames" feitos pelo presidente da República.

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Foto do author Lorenna Rodrigues
Por Rafael Moraes Moura e Lorenna Rodrigues (Broadcast)
Atualização:

Jair Bolsonaro e apoiadores em frente ao Palácio do Planalto. FOTO: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO Foto: Estadão

O Estadão decidiu pedir nesta quinta-feira (30) à Justiça Federal de São Paulo uma apuração de descumprimento de ordem judicial, após a Advocacia-Geral da União (AGU) não encaminhar os "laudos de todos os exames" do novo coronavírus feitos pelo presidente Jair Bolsonaro.

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A assessoria de comunicação da AGU informou à reportagem que encaminhou à Justiça Federal de São Paulo um relatório médico de 18 de março no qual atesta que o presidente Jair Bolsonaro se encontra "assintomático" e teve resultado negativo para os testes do novo coronavírus realizados no mês passado - mas não enviou a cópia dos exames. Esse relatório já havia sido divulgado pelo site de notícias UOL.

O Estadão está tentando obter a íntegra da manifestação da AGU.

Na última segunda-feira, o Estadão garantiu o direito de obter os testes de covid-19 feitos por Bolsonaro. Por decisão da juíza Ana Lúcia Petri Betto, foi fixado um prazo de 48 horas para a União fornecer "os laudos de todos os exames" feitos pelo presidente da República para identificar a infecção ou não pelo novo coronavírus. Bolsonaro já disse que o resultado dos exames deu negativo, mas se recusou até hoje divulgar os papéis.

"A falta de transparência é absoluta. Estamos requerendo que a União seja intimada formalmente sobre isso. A decisão da Justiça mandou juntar resultado de exame. Ao que se sabe não há nenhum resultado de exame juntado, portanto, a decisão foi descumprida", disse o advogado do Estadão Afranio Affonso Ferreira Neto.

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Ferreira Neto aponta que o descumprimento de decisão judicial configura prática de crime de desobediência.

A juíza federal Ana Lúcia Petri Betto havia estabelecido um prazo de 48 horas para que a União apresente os resultados dos exames e fixou uma multa de R$ 5 mil por dia de omissão injustificada. O Estadão também pediu agora que o valor da multa seja aumentado.

Declaração. Hoje pela manhã, Bolsonaro disse que a lei lhe garante o direito de não apresentar o resultado dos exames de covid-19 que realizou para saber se estava com a doença. Em declaração em frente ao Palácio da Alvorada, o presidente observou, no entanto, que se a decisão judicial que garante a divulgação for mantida, não terá alternativa.

"A AGU (Advocacia-Geral da União) deve ter recorrido. E, se nós perdermos o recurso, daí vai ser apresentado. E vou me sentir violentado. A lei vale para o presidente e mais humilde cidadão brasileiro", disse o presidente antes de embarcar para Porto Alegre, onde participará de solenidade do Exército.

A juíza federal Ana Lúcia Petri Betto fixou um prazo de 48 horas para que a União apresente os resultados dos exames. "Repise-se que 'todo poder emana do povo'(art. 1º, parágrafo único, da CF/88), de modo que os mandantes do poder têm o direito de serem informados quanto ao real estado de saúde do representante eleito", concluiu a juíza, ao atender ao pedido do Estadão.

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Antes mesmo de ser oficialmente notificada, a AGU enviou à Justiça Federal uma manifestação em que se opõe à divulgação do resultado do exame de Bolsonaro. Em seis páginas, a AGU diz que o pedido deve ser negado, sob a alegação de que a "intimidade e a privacidade são direitos individuais".

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Na última terça-feira, Bolsonaro disse que quer defender na Justiça o direito de não mostrar o resultado dos exames de covid-19 que realizou.

"Da minha parte, não tem problema mostrar (o resultado), mas eu quero mostrar que eu tenho o direito de não mostrar. Pra que isso? Daqui a pouco quer saber se eu sou virgem ou não, vou ter de apresentar exame de virgindade para você. Dá positivo ou negativo, o que vocês acham aí?", disse o presidente na porta do Palácio da Alvorada ao falar com a imprensa.

Juristas, no entanto, discordam do entendimento de Bolsonaro. O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto considerou "juridicamente correta" a decisão da Justiça. Na avaliação do ex-magistrado, o Brasil tem o direito de saber da saúde do presidente.

"O País tem o direito de saber da saúde do seu presidente, até porque se trata de doença transmissível e, ao que se sabe, o presidente não se submeteu a nenhum isolamento físico", afirmou Ayres Britto. "No momento em que vivemos planetariamente, a matéria não se inscreve no âmbito da intimidade, nem mesmo da vida privada do presidente. O próprio presidente antecipou o interesse coletivo no resultado do exame a que se submeteu ao tornar pública a realização desse mesmo exame", completou.

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Bolsonaro fez o exame para o vírus duas vezes, em 12 e 17 de março, após voltar de missão oficial nos Estados Unidos, onde se encontrou com o presidente Donald Trump. Nas duas ocasiões, o chefe do Executivo informou, via redes sociais, que testou negativo para a doença, mas não exibiu cópia dos resultados. Pelo menos 23 pessoas que acompanharam o presidente na visita aos Estados Unidos, incluindo auxiliares próximos, foram diagnosticadas posteriormente com a doença.

Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, é "injustificável" Bolsonaro ainda não ter divulgado os exames. "Em especial em uma situação de epidemia, torna-se relevante que o presidente seja transparente e divulgue o resultado oficial do seu exame, a exemplo do que fizeram vários líderes de países democráticos."

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