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'Apontaram uma arma pra mim', diz mulher negra sobre seguranças de mercado onde jovem foi chicoteado

Em depoimento à Polícia Civil em abril, ela disse ter pensado 'estar sendo assaltada', e que seguranças do supermercado Ricoy a pegaram pelo braço e abriram sua bolsa

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Por Luiz Vassallo
Atualização:

Reprodução do Boletim de ocorrência Foto: Estadão

Uma mulher negra denunciou à Polícia Civil uma abordagem de seguranças do supermercado Ricoy que a fez 'imaginar estar sendo assaltada'. O estabelecimento é o mesmo em que seguranças torturaram um jovem negro de 17 anos. Ela diz que seguraram seu braço e chegaram a apontar uma arma em sua direção.

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O caso teria ocorrido em abril. A mulher prestou depoimento ao 98º Distrito Policial, do Jardim Miriam, zona Sul de São Paulo.

A abordagem ocorreu, segundo a vítima, em uma unidade do Ricoy que fica na mesma avenida daquela em que o rapaz foi chicoteado. A rede tem duas unidades na mesma avenida, na Vila Joaniza, zona Sul de São Paulo.

Segundo ela, quando estava de saída do mercado, 'foi abordada por dois indivíduos, os quais exigiram que a vítima abrisse a sua bolsa'. "Imaginando estar sendo assaltada, correu por cerca de dez metros, sendo seguida pelos dois referidos indivíduos que após alcançá-la, a seguraram pelo braço".

"Um deles apontando arma de fogo, tirou as duas bolsas de suas mãos e passou a revistá-las; que decidiu retornar ao mercado para certificar-se que as duas pessoas que a abordaram era funcionários do local", consta no Boletim de Ocorrência.

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Ela afirma que, no mercado, 'encontrou duas pessoas que presenciaram a cena e se propuseram a ser suas testemunhas' e que 'pôde constatar que os dois indivíduos que a abordaram era funcionários do estabelecimento'. Relatou ainda ter 'capacidade de reconhecê-los.

O depoimento é de abril deste ano.

Os seguranças da rede Ricoy são terceirizados da empresa KRP. A rede Ricoy afirma que 'condena e repudia todos os casos de violência, discriminação ou violação dos direitos humanos envolvendo direta ou indiretamente suas lojas'.

Prisão

Nesta sexta, 5, a juíza Tatiana Saes Valverde Ormeleze determinou a prisão temporária de Davi de Oliveira Fernandes, 37 anos, e Valdir Bispo dos Santos, 49 anos, seguranças que chicotearam o jovem negro dentro do supermercado Ricoy

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Eles foram identificados pela Polícia Civil a partir de depoimentos da própria vítima, do gerente do estabelecimento e outras testemunhas. A magistrada também autorizou buscas e apreensões contra os investigados pelo crime de tortura.

O caso foi filmado. O jovem recebe ameaças de morte na própria gravação.

O rapaz afirmou que, no mês passado, 'em data que não recorda, 'dentro do Supermercado Ricoy, instalado no local dos fatos, onde apanhou das gôndolas uma barra de chocolate e tentou sair sem efetuar o pagamento'. "Foi abordado na saída pela pessoa de Santos, segurança do local, o qual conhece já há algum tempo".

"Ele foi auxiliado por Neto que juntos levaram a vítima até um quarto nos fundos da loja", narrou.

O jovem acrescentou. "Ali a vítima foi despida, amordaçada, amarrada e passou a ser torturada com um chicote de fios elétricos trançados. Ali, permaneceu por cerca de quarenta minutos, sendo agredido o tempo todo".

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Direitos Humanos

Ao Estado, o advogado Ariel de Castro Alves, conselheiro do Condepe (Conselho Estadual de Direitos Humanos), afirmou que 'esse é mais um caso que precisa ser apurado pela Polícia Civil'. "Inclusive quanto aos crimes de racismo, ameaça é constrangimento ilegal envolvendo funcionários da mesma rede de supermercados".

COM A PALAVRA, A ADVOGADA ANA PAULA FREITAS, QUE DEFENDE A MULHER

"Me assusta o fato da situação só receber atenção quando chegou ao extremo. É importante combater o racismo estrutural em toda a sociedade. Negros são perseguidos e ao entrarem em um supermercado já recebem os olhares, pois, existe a presunção de que somos perigosos. O caso da minha cliente, do adolescente e do terceiro caso, não são exceções, mas sim a prática habitual do sistema racial que vigora no país. Estamos em 2019, mas o tratamentos aos negros ainda é de do 1830."

COM A PALAVRA, RICOY

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"O Ricoy Supermercados apura todo e qualquer caso de violência. Mais do que isso, sempre vai colaborar com as investigações e as autoridades para garantir que todos os fatos sejam esclarecidos. E enfatizamos que somos contrários e não compactuamos com qualquer tipo de discriminação ou violação de direitos humanos. Por isso, o Ricoy espera que sejam punidos no rigor da lei sempre que o crime for comprovado."

"Em relação aos fatos lamentáveis registrados em vídeo divulgado amplamente, o Ricoy Supermercados esclarece o seguinte: 1 - Ficamos chocados com o conteúdo da tortura em cima do adolescente vítima da violência. 2 - O Ricoy desde sua fundação na década de 1970 exerce os princípios mais rígidos de valorização do ser humano, seja em nossas lojas ou em nossa comunidade. Ficamos muito abalados com a notícia que nos causou repulsa imediata. 3 - Os dois seguranças acusados de praticarem os atos são de empresa contratada terceirizada e não prestam mais serviço para nossos supermercados. 4 - Para manter a coerência em contribuir com as investigações, nesta terça-feira (3), um funcionário da loja Yervant Kissajikian, 3384, prestou depoimento no 80º Distrito Policial. 5 - O Ricoy já disponibilizou uma assistente social para conversar com a vítima e a família. E dará todo o suporte que for necessário.

O Ricoy Supermercados condena e repudia todos os casos de violência, discriminação ou violação dos direitos humanos envolvendo direta ou indiretamente suas lojas. O Ricoy Supermercados acredita que para a construção de um país mais justo é preciso uma sociedade mais igualitária, mais tolerante com as diferenças e sem preconceitos. Não por acaso é importante enfatizar que desde a sua fundação o Ricoy Supermercados reflete em seu corpo de colaboradores a grande diversidade dos brasileiros. E diante das notícias dos últimos dias, enfatiza: espera que todos sejam punidos no rigor da lei sempre que o crime for comprovado."

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