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Ano eleitoral: transparência pública é promessa de campanha?

Por Murilo Borsio Bataglia
Atualização:

Murilo Borsio Bataglia. FOTO: INAC/DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Recentemente, a ONG Transparência Internacional divulgou o Índice de Percepção da Corrupção (IPC) do ano de 2021. Trata-se de índice publicado anualmente que, a partir de pesquisas, mede a percepção da corrupção em um país. Quanto mais próximo da nota 100, menor é a sensação de corrupção naquele local. O Brasil obteve nota 38, igual ao ano anterior (2020), porém caiu 2 posições (da posição 94 em 2020 para a 96 em 2021), ficando abaixo da média da América Latina (41 pontos). Contribuíram para esse desempenho ruim uma série de atitudes governamentais que questionam o efetivo combate à corrupção nos últimos anos.

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Tendo isso em vista, e considerando que a transparência pública é uma forma essencial de enfrentar esse fenômeno, o objetivo desse artigo é chamar atenção para esse debate. Como pergunta que norteia essa análise, temos: onde posicionar a transparência pública em um ano eleitoral?

Para responder essa pergunta, é preciso entender o que é transparência pública. A literatura aponta que transparência pode ser sinônimo de acesso à informação. Trata-se de uma abertura governamental que permite à sociedade saber de ações e dados do governo. Refere-se à "condição de exercício da autoridade pública sob o controle cognitivo alargado dos cidadãos e de instituições externas ao Estado" (GOMES et al, 2018, p. 05). Essa mesma transparência é um dos elementos que se relacionam com a democracia: mais informação e melhor possibilidade de tomadas de decisão e de participação social.

Além disso, no cenário internacional, as convenções anticorrupção da OEA e da ONU apontam que ela é um meio de prevenção da corrupção e dispõem em seus artigos ações de transparência para que os países as adotem em áreas como: licitação e concursos públicos, declarações de ganhos de funcionários públicos e suas funções, arrecadação estatal, abertura de canais para participação da sociedade. Percebe-se um forte apelo pela divulgação de informações governamentais em diferentes procedimentos (art. 10, Decreto 5.687/2006).

Quando combinada com o emprego de tecnologias, pode ampliar seu alcance. Nos últimos meses, percebemos o papel da informação e a necessidade de que dados estejam disponíveis e sejam comunicáveis para a população. Além de revelarem verbas investidas em obras e serviços, há dados importantes que repercutem porcentagens de pessoas em busca de emprego, em necessidade alimentar, que recebem benefícios governamentais, formação escolar, questões de saúde (internações, contaminação de doenças, pessoas recuperadas), por exemplo.

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Nesse sentido, uma vez verificados o conceito e a importância da transparência, precisamos apontar mecanismos para que ela possa ser garantida. E as eleições são um momento essencial para isso. Em 2018, os presidenciáveis adotaram em seus planos de governo narrativas sobre o enfrentamento à corrupção. Dentre os diferentes vieses, encontraram-se: alguns que contextualizaram o problema, e apontaram medidas genéricas de combate, carecendo de maior especificação para tal questão; outros enveredaram para perspectiva punitivista (prisão, punição severa); outros para o simples discurso de "combater a corrupção" - sem dizer como; e houve quem focou no caráter preventivo, pregando adoção de transparência para isso, contextualizando leis e apontando algumas medidas específicas, mas sem muito detalhamento. (BIASON; BATAGLIA, 2019).

E neste ano eleitoral de 2022? Como o enfrentamento da corrupção, em especial a promoção da transparência pública será abordado nas campanhas?

É necessário ter consciência de que o Brasil assumiu compromissos internacionais para prevenir a corrupção por meio da transparência. Ademais, há diversas leis internas que determinam adoção dessa perspectiva. E isso precisa ser preservado e observado pelos futuros candidatos e governantes.

São primordiais propostas e ações que:

- não tentem restringir o alcance da Lei de Acesso à Informação

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- não classifiquem como sigilosas as operações ou documentos de natureza pública

- não reduzam participação social em conselhos de políticas públicas (FARRANHA et al, 2022)

- ampliem o uso de tecnologias para facilitar a divulgação de informações e atos dos governos,

- promovam e aperfeiçoem canais de participação e controle social,

- atendam às manifestações de ouvidoria e aos pedidos de acesso à informação

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- combatam a desinformação ou fake news

- publiquem dados públicos de forma acessível, estruturada e comunicável à população

- tracem estratégias e metas para cumprimento das convenções internacionais e das próprias leis.

Desse modo, "a transparência e clareza nas propostas também são princípios que devem ser adotados seja nos pleitos eleitorais, seja no gerenciamento do governo, quando eleitos, como fundamento de regimes democráticos e que valorizam o papel social" (BIASON; BATAGLIA, 2019, p.23). É necessário, enfim, posicionar a transparência como uma promessa de campanha a ser cumprida, revelando o seu papel de oxigenar e reafirmar a democracia.

REFERÊNCIAS

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BATAGLIA, M.B.; BIASON, R.C. A campanha eleitoral do Brasil 2018: análise de propostas anticorrupção de candidatos à Presidência. In: ALACIP - Asociación Latinoamericana de Ciencia Politica 2019. Disponível em: https://alacip.org/cong19/330-borsio-19.pdf

BRASIL. Decreto n. 5.687, de 31 de janeiro de 2006. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5687.htm.

FARRANHA, A.C.; BATAGLIA, M.B.; PAULA, A.P.P.  Democracy and participation: changes and challenges in Bolsonaro's government -- analyzing brazilian federal decree 9.759/2019

Revista Videre. Disponível em: https://ojs.ufgd.edu.br/index.php/videre/article/view/15272/8502

GOMES, W., AMORIM, P. K. D. F., & ALMADA, M. P. Novos desafios para a ideia de transparência pública. E-Compós, n. 21 v. 2. Disponível em: https://doi.org/10.30962/ec.1446

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TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL - BRASIL. Retrospectiva Brasil 2021. Disponível em: https://comunidade.transparenciainternacional.org.br/retrospectiva-brasil-2021

*Murilo Borsio Bataglia, professor da Universidade de Brasília (CEAM/IPOL/UnB). Doutorando e Mestre em Direito pela UnB (PPGD/UnB)

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção

Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Acesse aqui todos os artigos, que têm publicação periódica

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