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Análise de viabilidade econômico-financeira no tratamento biológico de resíduos orgânicos

Por Athaydes Leite
Atualização:
Athaydes Leite. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O tratamento biológico de resíduos orgânicos vem sendo muito aplicado mundialmente principalmente por conta das atrativas possibilidades econômico-financeiras de implementação dos projetos. Os resultados do estudo de caso em uma agroindústria brasileira com a produção de biogás e conversão em energia elétrica mostram além de algumas variáveis no modelo econômico-financeiro também como pagar o financiamento e os custos operacionais e ainda ter lucros como projeto de tratamento.

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A crescente ascensão econômica da agroindústria brasileira e o aumento populacional urbano desencadearam a geração de grandes quantidades de resíduos orgânicos (1; 2). O aumento na demanda por tratamento destes resíduos orgânicos se tornou muito forte recentemente com uma maior imposição governamental através de regulamentações (2; 3) e também por meio de exigências de mercado para garantir a produção segura e sustentável de produtos (4).

As diferentes formas de tratamento biológico como a compostagem e a digestão anaeróbica são uma das alternativas muito procuradas para a destinação dos resíduos orgânicos, principalmente na agroindústria (5; 6). Esta preferência está na maioria dos casos relacionada ao potencial de utilização dos produtos gerados por este tipo de tratamento, pois a comercialização deles geram receitas recorrentes. A versatilidade de utilização por exemplo do biogás pode tornar a viabilidade econômico-financeira do projeto de tratamento de resíduos muito mais atrativa para investimentos dependendo do local de aplicação.

Os possíveis produtos de uma usina de biogás como por exemplo energia elétrica e térmica, biometano como combustível ou equivalente a gás natural, gás carbônico para indústria de bebidas e biofertilizante são gerados dependendo do preço de mercado de cada um deles. No desenvolvimento do projeto são calculados os custos-benefícios dos investimentos necessários para a conversão do biogás nos determinados produtos.

O investimento elevado em uma determinada tecnologia pode ser justificada pelo alto valor agregado no preço final do produto, em que se considera qual preço local de mercado traz mais receita para o projeto. A exemplo, o investimento em um sistema de cogeração de energia é geralmente mais acessível economicamente do que em um sistema de purificação a biogás, porém o valor agregado da energia elétrica e térmica pode ser menor em comparação com o biometano.

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Por sua vez, no caso da purificação do biogás a biometano o projeto pode ser mais favorável economicamente quando o biometano é utilizado como biocombustível, se este proporciona um rendimento lucrativo maior comparado com aplicação do biometano em um gasoduto de gás natural.

O objetivo deste estudo é demostrar de forma simples e sucinta como um projeto de uma usina de biogás com fins energéticos poder ser lucrativo para o tratamento biológico de resíduos mesmo com os contínuos custos operacionais e também com um financiamento a longo prazo. Além disto, as variáveis que mais impactam o desenvolvimento do modelo econômico-financeiro do projeto de uma usina de biogás com produção de energia elétrica serão avaliadas.

No intuito de apresentar dados referentes ao mercado brasileiro o efluente líquido da agroindústria de produção de biodiesel foi utilizado como substrato de referência para a usina de energia. O design da usina de energia foi baseado na quantidade de 30 m³/dia do efluente líquido com uma concentração de sólidos totais de 20%. O preço prospectado de destinação final do efluente líquido foi de R$75,00/m³. Um tanque bioprocessador com o volume de 2.000 m³ foi planejado juntamente com o sistema de cogeração de 500 kW. O preço de energia elétrica a ser considerado neste estudo de caso é de R$650/MWh. Para efeitos de cálculo de viabilidade econômico-financeira foi considerado um investimento de 12 milhões de reais na usina de energia, em que 100% do valor deve ser financiado com juros de 6% ao ano por uma duração 10 anos.

De acordo com as características do efluente líquido da indústria de biodiesel como substrato para a produção de biogás é esperado uma geração de energia elétrica de 4.150.000 kWh por ano. Por sua vez, a compensação desta energia elétrica no sistema de Geração Distribuída[1] dentro da própria indústria de biodiesel gera uma economia anual de R$ 2.697.500,00, pois os gastos com a compra de energia serão evitados. Junto a esta receita há também o valor anual de R$ 821.250,00 que é economizado com a prática de destinação anterior do efluente líquido. Outras possíveis formas de receitas podem ser incluídas nos projetos de usinas de energias, como por exemplo a comercialização do calor e do digestato como fertilizante. Todavia elas foram deixadas de fora do estudo de caso, pois variam muito localmente em relação utilização e venda.

Os custos operacionais são flexíveis durante a operação da usina e influenciam diretamente no modelo econômico-financeiro da mesma, pois somados às parcelas de financiamento e juros e na sequência subtraídos às receitas resultam no lucro líquido. Os diferentes custos operacionais como consumo de energia elétrica da usina, manutenção do sistema de cogeração e também da usina, e provisões futuras para substituições tecnológicas (Figura 1) em conjunto representam R$429.087,00.  Considerando as condições de financiamento referentes a este estudo de caso, a soma da dívida anual em relação ao empréstimo é de R$1.630.415,00, sendo que R$1.200.000,00 corresponde a parcela de quitação do valor financiado e R$430.415,00 ao pagamento dos juros. Estes custos referentes ao financiamento são fixos e somados aos custos variáveis de operação da usina constituem o valor total de subtração às receitas.

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Portanto, o valor as receitas geradas no período de um ano (R$ 3.518.750,00) subtraído pelos custos totais (R$ 2.059.502,00) resultam em um lucro líquido anual de R$ 1.459.248,00. Desta forma, durante o pagamento do financiamento por 10 anos a usina de energia ainda gera uma receita líquida equivalente a R$ 121.604,00 por mês, isto já descontando os custos operacionais. Nos sequentes 10 anos a receita anual liquida passará a ser de R$ 3.089.663,00 (ou R$ 257.471,00/mês), pois assim o financiamento está já pago.

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Foi demostrado no estudo de caso que é possível se obter um alto rendimento lucrativo com uma usina de energia na agroindústria mesmo durante os anos de pagamento do financiamento. Por vias de fato, uma análise crítica da viabilidade econômico-financeiro é primordial para o sucesso do projeto de tratamento biológico, em que a sustentabilidade econômica do projeto determina as diretrizes de projeto tendo como consequência o impacto social e ambiental para a sociedade.

*Athaydes Leite, graduado em Química Agroindustrial pelo Instituto Federal de Goiás, mestre em Gerenciamento do Fluxo de Matéria pela Universidade de Ciências Aplicada de Trier, Campus Ambiental de Birkenfeld, Alemanha. Doutor em Biologia e Ciências Naturais pela Universidade de Leipzig, Alemanha. Autor de 15 artigos científicos publicados em renomadas revistas científicas internacionais. Professor do MBA Recuperação Energética e Tratamento de Resíduos da FGV

Referências

  1. Viana, Leandro Gomes e Cruz, Patrícia Silva. Reaproveitamanto de resíduos agroindustriais. IV Congresso Baiano de Engenharia Sanitária e Ambiental. 2016.
  2. Zago, Valéria Cristina Palmeira e Barros, Raphael Tobias de Vasconcelos. Gestão dos resíduos sólidos orgânicos urbanos no Brasil: do ordenamento jurídico à realidade. Engenharia Sanitaria e Ambiental, 24(2), 219-228. 2019.
  3. Oliveira, Amanda Borges Ribeiro de e Schalch, Valdir . Estudo sobre a viabilidade de processos de tratamento da fração orgânica de resíduos sólidos gerados em municípios brasileiros. IBEAS - Instituto Brasileiro de Estudos Ambientais. 3° Congresso Sul-Americano de Resíduos Sólidos e Sustentabilidade. Gramado RS. 2020.
  4. Hasan, Camila , et al. Redução das cargas orgânicas de biomassas residuais de uma indústria alimentícia por meio de tratamento anaeróbio. R. gest. sust. ambient., Florianópolis, v. 7, n. 2, p.465-483, abr./jun. 2018.
  5. Leite, Athaydes, et al. Assessment of the variations in characteristics and methane potential of major waste products from the Brazilian bioethanol industry along an operating season. Energy Fuels, 29, 4022-4029. 2015.
  6. Siqueira, Thais Menina Oliveira de e Assad, Maria Leonor Ribeiro Casimiro Lopes. Compostagem de resíduos sólidos urbanos no estado de São Paulo (Brasil). Ambiente & Sociedade, 18(4), 243-264. 2015.

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[1] (https://www.aneel.gov.br/geracao-distribuida)

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