Ana Carolina B. Audi e Talbert I. Navia*
22 de abril de 2021 | 09h00
Ana Carolina B. Audi e Talbert I. Navia. FOTOS: DIVULGAÇÃO
Companhias americanas e latino-americanas, gestores de fundos de investimento e indivíduos com sólida reputação na América Latina estão olhando cada vez mais para as Empresas de Aquisição de Propósito Específico, comumente conhecidas como SPACs, como uma fonte de capital para financiar aquisições na América Latina.
Spacs miram o Brasil e podem trazer oportunidades para investidores e empresas em busca de capital
As SPACs são sociedades recém-constituídas, sem ativos e sem operações, que levantam capital por meio de uma oferta pública inicial de ações (IPO) baseadas na reputação do gestor (sponsor) e da equipe de administração, no seu conhecimento de um setor, indústria e/ou região, e na sua habilidade de identificar alvos para aquisição e concretizar uma combinação de negócios dentro de até 24 meses a partir da data do IPO. Após a combinação, a target se torna pública e passa a ter valores mobiliários negociados na bolsa de valores dos EUA.
Ao contrário dos EUA, desde 2019, a América Latina viu menos de uma dúzia de SPACs anunciadas. Menos da metade delas concluíram combinações de negócios. Algumas acessaram apenas o mercado dos EUA, enquanto outras fizeram ofertas globais que incluem captação nos países de origem, notadamente o México e em alguma medida também no Brasil. A partir de abril de 2021, duas ofertas globais no México (Promecap e Vista) captaram US$300 milhões e US$650 milhões, respectivamente. No Brasil, embora não tenha havido nenhuma oferta pública local de SPACs até o momento, foram captados localmente valores expressivos no âmbito de SPACs com foco no Brasil (sponsor brasileiro ou potencial busca por ativos locais).
Entre 2020 e 2021, foram realizadas nos EUA ofertas públicas de SPACs geridas por brasileiros, como HPX, Waldencast (da gestora Dynamo), Itiquira e Patria Acquisition. Os valores levantados por cada uma estão, em média, entre US$200 e US$350 milhões, tendo havido também sucesso na captação local no Brasil por meio de estruturas como fundos de investimento. Tais veículos têm como objetivo a aquisição de ativos nas áreas de área de tecnologia, healthcare, beleza, farmácia, educação, entre outros.
DESMISTIFICANDO O PROCESSO DE IPO DA SPAC
Abaixo as principais etapas sobre o processo de IPO da SPAC nos EUA, que leva aproximadamente 3 meses:
DE-SPACing: COMBINAÇÃO DE NEGÓCIOS
Esse processo de M&A da SPAC com uma empresa-alvo privada é conhecido como de-SPACing. As normas da SEC exigem que o valor justo de mercado da empresa-alvo não seja inferior a 80% do valor depositado na conta-garantia. O processo de de-SPACing leva em média 6 meses desde a identificação da empresa-alvo até o encerramento da combinação de negócios:
As razões significativas para o aumento de interesse por SPACs na América Latina após a explosiva atividade nos EUA é explicado principalmente porque as SPACs oferecem aos sponsors um processo mais simples e seguro para levantar capital publicamente a fim de financiar aquisições de empresas de alto crescimento ou similarmente atrativas, ao mesmo tempo que reduzem o risco de abertura de capital das empresas-alvo por meio de um IPO tradicional, tendo em vista que o preço pré-negociado elimina a incerteza na precificação inerente ao processo de IPO.
Os sponsors globais focados em adquirir empresas-alvo na América Latina podem ter interesse prioritário na captação no mercado americano ou em seus países de origem. O Brasil, por exemplo, possui em seu arcabouço regulatório os mecanismos necessários a permitir captações por meio de uma SPAC incorporada de forma doméstica, desde que conforme discussões e alinhamento prévios com o regulador. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) já se manifestou nesse sentido no âmbito da discussão em curso sobre ofertas públicas, independentemente de haver legislação específica para o produto.
*Ana Carolina B. Audi é sócia nas áreas de Fusões e Aquisições, Private Equity e Venture Capital no escritório Demarest. Possui mestrado pela Universidade da Pensilvânia e Wharton Business School (EUA), graduação e mestrado em Direito Civil pela PUC-SP, e licenciatura para exercer a advocacia tanto no Brasil como no estado de Nova Iorque
*Talbert I. Navia, graduado pela Faculdade de Direito de Harvard, é copresidente da prática latino-americana e membro do Comitê Executivo do escritório Winston & Strawn LLP
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