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Acolher a trabalhadora-mãe: um desafio ao mercado e a cada uma de nós

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Por Laura Rocha Barros
Atualização:
Laura Rocha Barros. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Minha história é parecida com a de muitas mulheres. Depois que me formei na faculdade, decidi investir a maior parte do meu tempo e minha energia na construção da minha carreira -- e, com isso, fui postergando a decisão de me tornar mãe até o limite do possível. No entanto, enquanto a maioria das mulheres se aproxima desse limite à beira dos 40 anos, para mim ele chegou logo após os 30.

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Há pouco mais de dois anos, fui diagnosticada com endometriose, uma doença grave no tecido que reveste a parede do útero e acomoda o feto durante a gestação. Precisei passar um mês no hospital e ser submetida a uma cirurgia. Bem no início da recuperação, a obstetra me disse que eu teria um prazo máximo de seis meses se quisesse engravidar; depois disso, as complicações decorrentes da doença praticamente anulariam as minhas chances de ser mãe.

A maternidade sempre me atraiu, mas a perspectiva de assumir uma responsabilidade tão grande me assombrava, bem como as consequências que isso traria para a minha vida profissional. Como executiva no setor da tecnologia, onde as mulheres não são mais de 20% da força de trabalho, eu havia recebido uma mensagem consistente ao logo da minha carreira de que maternidade e trabalho eram incompatíveis; que ter um filho implicaria, necessariamente, renunciar ou adiar à realização profissional. Certa vez, vi a diretora de uma multinacional cancelar um compromisso porque precisaria levar o filho a uma consulta. Foi algo que me marcou: nunca ouvi a mesma justificativa saída da boca de um homem.

A despeito dessa ambivalência, o ultimato imposto pela doença me obrigou a tomar uma decisão -- a de ir atrás do meu desejo por mais inviável que ele pudesse parecer. Hoje, sou mãe de um menino de um ano e cinco meses e tenho a certeza de que tomei a decisão certa. Apesar dos desafios que isso trouxe para o gerenciamento do meu tempo, tenho a sorte de contar com o apoio do meu marido na divisão de tarefas e com o respaldo da empresa em que trabalho para conciliar a maternidade com uma posição de liderança.

No entanto, o fato de a minha história ter terminado bem só reforça o quanto ela é uma exceção. Se minha decisão pela maternidade e minha licença encontraram abrigo e respaldo em um ambiente profissional onde os atributos "advogada e mãe" agregam - em vez de subtraírem - qualidades ao desempenho da função, para grande parte das mulheres a maternidade representa, de fato, uma renúncia, já quem nem todo ambiente empresarial se mostra simpático à ideia de colaboradoras que tenham também em seus filhos reais prioridades de vida.

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Aplicar e fazer valer a licença-maternidade estendida de seis meses, como a empresa em que atuo me proporcionou, é um grato sinal de mudança nessa mentalidade: além de permitir à mãe a tranquilidade da dedicação perene ao bebê, possibilita ainda à trabalhadora a acolhida de volta ao mercado de trabalho muito mais preparada e com novas possibilidades e responsabilidades renascidas ante a nova condição. No meu caso, no retorno da licença, recebi também a responsabilidade de atuar não mais apenas como colaboradora da empresa, mas também como sócia. Tal reconhecimento ainda não é a regra no mercado, mas as iniciativas que já existem certamente florescerão para que cada vez mais empresas compreendam e reconheçam a importância da força de trabalho feminina.

Neste mês das mulheres, que possamos todos, como sociedade, trabalhar para permitir, no futuro, que todas nós tenhamos o direito de experimentar a maternidade pelo que ela é: não um sacrifício penoso, mas uma das maiores alegrias que a vida pode proporcionar.

*Laura Rocha Barros, 33 anos, executiva do núcleo jurídico da FS Security e mãe de Gabriel, de um ano e cinco meses

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