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A reforma tributária e a conta do cigarro

Por Tania Cavalcante e Ana Cristina Pinho
Atualização:
Tania Cavalcante e Ana Cristina Pinho. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Espera-se que por meio da simplificação da tributação sobre bens e serviço, a Reforma Tributária propicie acesso a serviços públicos de qualidade, principalmente educação e saúde, e reduza as profundas desigualdades sociais no país.

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Sob essa ótica, a Reforma representa uma grande oportunidade para corrigir um desequilíbrio crônico entre o que o Brasil gasta com o tabagismo frente ao que arrecada com os tributos sobre produtos de tabaco e para reduzir as severas iniquidades sociais decorrentes desse mercado.

Estudos mostram que em nível global os governos gastam US$ 1,4 trilhões/ano com doenças do cigarro frente a uma arrecadação de impostos sobre esses produtos da ordem de US$ 270 bilhões/ano. No Brasil gastamos 57 bilhões de reais ao ano com doenças, incapacitações relacionadas ao tabagismo. Mas só arrecadamos cerca de R$ 13 bilhões/ano em impostos sobre cigarros.

Felizmente nas três propostas para Reforma Tributária se vislumbra tratamento diferenciado para produtos de tabaco, o que se alinha às diretrizes da Convenção-Quadro da OMS para Controle do Tabaco, tratado internacional de saúde ratificado pelo Congresso Nacional em 2005. Com o objetivo de proteger as gerações presentes e futuras das consequências sanitárias, sociais e econômicas do tabagismo, uma de principais medidas da Convenção trata da política tributária sobre tabaco como instrumento para reduzir o tabagismo e financiar o desenvolvimento.

Com esse objetivo, a Secretaria da Receita Federal tem ajustado a cobrança do IPI e instituiu uma política de preços mínimos para cigarros, contribuindo com importante redução da prevalência de fumantes, especialmente nas populações de menor renda e escolaridade. O potencial dessa medida para redução das iniquidades sociais é evidente pois são essas as populações que mais sofrem com as doenças crônicas e incapacitantes decorrentes do tabagismo que subtraem sua força de trabalho, principal fonte de seu sustento.

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Apesar da expressiva queda na prevalência de fumantes, cerca de 20 milhões brasileiros ainda fumam, o que equivale a quase duas vezes a população de Portugal. Além de estarem sob risco de graves doenças tabaco relacionadas já conhecidas, estudos recentes revelaram que o tabagismo aumenta o risco de formas graves da COVID-19 entre fumantes, o que certamente aumenta a pressão sobre os sistemas de saúde. Por isso, o governo precisa urgentemente ampliar os investimentos em medidas para prevenção e tratamento para cessação de fumar.

Dessa forma é fundamental que a Reforma adote uma abordagem tributária sobre cigarros e outros produtos de tabaco capaz de desestimular o seu consumo especialmente entre jovens e que vincule parte de sua arrecadação para a implementação plena das medidas da Convenção Quadro como já acontece em outros países.

Quando se fala em impostos sobre tabaco, logo surge uma oposição argumentando que a medida vai aumentar o contrabando e alimentar o crime organizado. Importante aqui destacar as conclusões do Grupo de Trabalho criado em 2019 pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública para avaliar se a redução da tributação de cigarros fabricados no Brasil seria uma boa estratégia para diminuir o consumo de cigarros contrabandeados. Composto por especialistas de várias áreas o relatório final do grupo indicou que a melhor resposta para este problema é a implementação do Protocolo da Convenção Quadro para Eliminar o Mercado Ilegal de Produtos de Tabaco ratificado pelo Congresso Nacional em 2017, para o que também é importante um financiamento à altura dos seus desafios.

Portanto, esperamos que a Reforma Tributária possa aplicar o princípio do poluidor pagador aos tributos sobre tabaco para que o Brasil possa avançar mais ainda na redução do tabagismo e suas iniquidades sanitárias, sociais e econômicas.

*Tania Cavalcante, médica e secretária executiva da Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (Conicq)/Inca

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*Ana Cristina Pinho, médica e diretora-geral do Inca

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