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A realidade das PPPs e das concessões no Brasil. Como mudá-la?

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Por Mario Guimarães
Atualização:
Mario Guimarães. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

As parcerias público-privadas (PPPs) e as concessões são um importante caminho para melhorar a gestão de serviços públicos no País. A capacidade dos governos em entregar serviços de qualidade tem sido reduzida devido, em grande parte, às restrições fiscais. No entanto, um ponto que chama a atenção é o baixo número de contratos assinados, onde temos enormes desafios de infraestrutura, como os 100 milhões de brasileiros sem acesso a tratamento de esgoto ou os 60 milhões sem acesso à água potável, para citar apenas dois exemplos. Especialistas apontam várias dificuldades como insegurança jurídica, marco legal necessitando de revisão, inviabilidade econômico-financeira de projetos, estrutura de garantias inadequada ou insuficiente e alocação de riscos mal elaborada.

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Um ponto fundamental e pouco abordado nestas discussões é a questão da incapacidade institucional dos entes federados, em especial, dos entes municipais. Em um hipotético município com graves problemas em áreas como iluminação pública, gestão de resíduos sólidos, mobilidade urbana e abastecimento de água e tratamento de esgoto sanitário, qual é a explicação para que não haja nenhum contrato de PPP ou concessão assinado? Uma hipótese a ser levantada seria o porte do município. Para estas quatro áreas levantadas, muito provavelmente um contrato desse tipo seria inviável devido baixo número de pontos de iluminação pública ou o baixo número de usuários do transporte coletivo ou do estacionamento rotativo, por exemplo, não havendo economias de rede significativas que pudessem viabilizar o negócio, mesmo em formato de PPP.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dos 5.570 municípios brasileiros, apenas 324 possuem mais de 100 mil habitantes. E segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a escolaridade dos prefeitos eleitos em 2012 e 2016 estava muito aquém da esperada. Para se ter uma ideia deste cenário, menos de 1% declararam, na época, saber ler e escrever (0,8% em 2012 e 0,7% em 2016), um percentual muito pequeno tinha o ensino fundamental completo (6,5% em 2012 e 6,6% em 2016) e um número percentual próximo da metade havia concluído o ensino superior (48,9% em 2012 e 52,2% em 2016). Em 2.663 municípios brasileiros, o prefeito não possui curso superior, sendo que em 1.449 destes têm apenas ensino médio completo.

Entre os vereadores, o quadro segue aquém do esperado. Embora houvesse um percentual um pouco superior entre os que leem e escrevem (2,3% em 2012 e 1,8% em 2016), os índices são muito baixos se analisarmos os candidatos com ensino superior completo, sendo 23,7% em 2012 e 26,1% em 2016. Isso significa que, em um país com 56 mil vereadores, há 41.384 que não possuem curso superior.

Prefeitos e vereadores têm um papel central e incontornável no desenvolvimento de PPPs e concessões. Nesta temática, a tomada de decisão para um projeto bem modelado passa, necessariamente, pela alta capacidade técnico-institucional do município para análise e avaliação das alternativas propostas. Os números referentes à escolaridade aqui apresentados buscam não criticar ou julgar, mas sim apontar caminhos, soluções e alternativas para que a ponte entre ideias e contratos assinados seja cada vez mais sólida.

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Embora instituições como a Caixa Econômica Federal, o BNDES e o Ministério da Economia, via Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), tenham iniciativas importantes para aceleração de PPPs e concessões, ainda há muito a ser feito. Uma alternativa seria a criação de uma formação sólida e aprofundada nesse tema, de modo que os municípios com mais de 100 mil habitantes indicariam uma equipe para participar. Ele seria custeado por uma das três instituições aqui citadas e seu valor teria uma contrapartida de 10% pelo município.

Estados e consórcios que quisessem participar também seriam bem-vindos. Aqueles que concluíssem o curso seriam credenciados a avançar para um segundo módulo, dividido por temáticas de infraestrutura social, e estariam aptos pelo Governo Federal, em uma espécie de cadastro positivo, a receber recursos para infraestrutura via convênio ou termos de cooperação. Tudo de acordo com as regras do Tesouro Nacional sobre empréstimos e endividamento, tanto nacionais quanto de organismos internacionais.

Os editais para contratação dos serviços de consultoria seriam padrão, com exigência de atestação técnica consistente, para preservar a qualidade dos serviços e evitar escolhas por critérios baseados no menor preço. Quanto aos custos, supondo que um curso online de 100 horas custasse R$ 50 mil reais por município - com um valor hora/homem de R$ 500 reais. Considerando que todos os 324 municípios participassem do treinamento, o valor total seria de R$ 16,2 milhões, sendo R$ 14,6 milhões arcados pelo Governo Federal e cada município ou ente bancando R$ 5 mil como contrapartida.

Transformar o tema PPPs e concessões nas esferas locais pode mudar o panorama de vários setores no País. O período 2021-2024 será de grandes desafios para as novas administrações municipais, com incertezas no horizonte, mas com as permanentes demandas e necessidades do cidadão. A elaboração e execução de políticas públicas voltadas à qualificação formal e especializada dos quadros municipais nessa área é fundamental e essencial para que haja um avanço tanto no setor público quanto no privado.

*Mario Guimarães, gerente de Governo e Infraestrutura da EY

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