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A proteção às famílias e a licença-maternidade

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Por Claudia Abdul Ahad Securato
Atualização:
Claudia Abdul Ahad Securato. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Recentemente chegou ao Supremo Tribunal Federal para julgamento o caso de um servidor público, solteiro, e pai biológico de crianças gêmeas geradas mediante procedimento de fertilização in vitro e utilização de barriga de aluguel nos Estados Unidos. O funcionário público pretendia receber do INSS os mesmos benefícios de licença maternidade que atualmente são concedidos às mães e pais por adoção.

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A princípio, o Poder Judiciário concedeu o pedido, contudo, o INSS recorreu às instâncias superiores, afirmando que não haveria previsão na lei permitindo esse benefício, e, portanto, seria ilegal conceder essas benesses sem que a lei preveja uma origem específica do dinheiro a ser gasto.

O caso está prestes a ser julgado, e por se tratar de um assunto bem mais amplo do que o do funcionário específico, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que há repercussão geral no tema, isto é, a decisão desse caso específico poderá ser multiplicada e distribuída para todos os processos semelhantes no país.

Por um lado, o pano de fundo do processo a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal é o caso individual desse pai solteiro, que por ser servidor público precisa lidar com todas as implicações decorrentes da origem pública do dinheiro a ser gasto com esse benefício.

Porém, de forma mais aprofundada, a controvérsia do tema na mais alta corte do país abre um enorme panorama para discussões a respeito da licença maternidade e paternidade como existem hoje, e das melhorias que são por muitos necessárias para toda a sociedade, que já evoluiu bastante desde a época em que foram criados esses benefícios.

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Para compreender a importância desse assunto, vale relembrar que a justificativa tradicional para a existência da licença maternidade é privilegiar o aleitamento materno, e recuperar a mãe da gravidez e do parto.

Bem por isso, o benefício antigamente era concedido apenas às mães biológicas, e por cento e vinte dias ao redor do nascimento da criança, com o recebimento de salário maternidade para que pudessem se dedicar integralmente à criança. Ao pai biológico, era concedido apenas o direito de se ausentar do cinco dias do trabalho, sem prejuízo à remuneração, porém sem recebimentos adicionais. Apenas em 2002 benefícios semelhantes foram atribuídos aos pais adotantes.

O formato de licença existente hoje ainda reflete a ideia de uma família nuclear, com uma mãe, alguns filhos sob sua principal responsabilidade, e um pai sem obrigação prioritária de ser o cuidador.

Porém, a realidade revela que as famílias podem ter várias formas, e a lei ainda não acompanhou a evolução da sociedade. Por exemplo, no momento ainda não há lei que esclareça como fica a situação dos casais homoafetivos. As famílias com duas mães ou dois pais precisam acessar a Justiça para receberem licença e benefícios previdenciários, e as decisões não são uniformes.

Os juízes tendem a dar a uma das mães o benefício completo de licença maternidade, e à outra o benefício idêntico ao da licença paternidade. Para as famílias com dois pais, um deles pode receber a licença de cento e vinte dias, e o outro, apenas cinco dias. Ou seja, a concessão dos benefícios acaba passando pela ideia de que a criança será encarregada em especial a um dos pais, e o outro precisa dedicar menos tempo aos seus cuidados.

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A lei por si só é insuficiente e precisa ser atualizada para acompanhar a realidade e amparar as famílias, incentivando os cuidados e a formação de laços. Casos como esse recém chegado no Supremo Tribunal Federal podem servir como indicativo do que se considera justo, e o quão compromissado o Estado está em garantir com que as famílias, que são a base da sociedade protegida constitucionalmente, efetivamente sejam amparadas como precisam.

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O caminho a ser percorrido para melhor atender as famílias deve ser pensar que a licença maternidade ou paternidade não dizem respeito ao estado civil ou ao gênero dos pais, se as crianças foram geradas biologicamente ou chegaram à família por adoção, mas sim à proteção da parentalidade em si.

O foco central deve ser a criança recém chegada, suas necessidades e cuidados que podem e devem ser atendidos e priorizados igualmente por seus responsáveis, independentemente de seus gêneros. E cabe ao Estado permitir igualmente aos pais e mães essa dedicação.

Espera-se que o Supremo Tribunal Federal tenha isso em mente ao julgar o caso, e que a boa solução privilegie a proteção integral às crianças e sirva como bússola para políticas públicas e iniciativas privadas mais justas e adaptadas aos novos modelos de famílias.

*Claudia Abdul Ahad Securato, sócia de Oliveira, Vale, Securato e Abdul Ahad Advogados

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