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A Petrobrás, o agronegócio e os navios iranianos no Brasil

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Por Frederico Favacho e Ana Luiza Sanches
Atualização:
Frederico Favacho e Ana Luiza Sanches. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Dois navios de bandeira iraniana que aportaram no Brasil trazendo uma carga de ureia e que pretendem retornar ao Irã com milho brasileiro estão parados no Porto de Paranaguá impossibilitados de prosseguir viagem porque a Petrobrás recusa-se a vender-lhes combustível.

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O Irã é um dos maiores importadores de milho do Brasil e também um importante mercado para soja e carne bovina, então o que explica a recusa da Petrobrás?

A resposta passa por um tema sensível no comércio internacional que é aquela das restrições comerciais impostas pelos Estados Unidos, por meio do Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (Office of Foreign Assests Control - OFAC) do Departamento do Tesouro daquele país.

Estão sujeitas às políticas da OFAC todo cidadão norte-americano, nacional ou nacionalizado, independentemente de onde esteja localizado; todas as pessoas e entidades instaladas nos Estados Unidos; toda empresa incorporada por empresas norte-americanas e suas filiais no exterior, subsidiárias estrangeiras pertencentes ou controladas pelos Estados Unidos.

Segundo o OFAC, são transações proibidas todo comércio de mercadorias ou produtos financeiros ou ainda qualquer outro tipo de negociação em que estejam envolvidas pessoas norte americanas com pessoas embargadas ou restritas pelo governo dos Estados Unidos. De forma a tornar conhecidos os países e pessoas embargadas ou restritas, o OFAC publica uma lista regularmente, a conhecida SDN list - "Specially Designated Nationals" ou "SDNs.", em que constam esses indivíduos e empresas visadas.

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Há outra categoria de sanções, as chamadas sanções secundárias, destinadas a impedir certas atividades de pessoas não americanas e que não poderiam, em princípio, serem cobertas por aquelas sanções primárias acima descritas. São essas sanções que ameaçam as empresas brasileiras que façam negócios com países, pessoas e empresas incluídas na lista SDN.

Quando, em 2018, os EUA se retiraram do acordo conjunto entre aquele país, a União Europeia e o Irã, para controle do programa nuclear iraniano (em inglês o Joint Comprehensive Plan of Action JCPOA) o OFAC re-impôs uma séria de sanções secundárias destinadas a punir atores não americanos que se envolvam em certas transações relacionadas a setores específicos da economia iraniana que incluem a proibição de transações em moeda estrangeira sujeitas à jurisdição dos EUA; a negação do Export-Import Bank Assistance; a negação de licenças de exportação dos EUA; a negação de certos empréstimos de instituições financeiras dos EUA; proibição de compras do governo dos EUA; entre outras sanções.

As sanções secundárias destinam-se principalmente a restringir a capacidade do Irã de acessar mercados, incluindo aqueles localizados fora dos EUA e visam principalmente as instituições financeiras não americanas que participem de certas transações relacionadas ao Irã, incluindo transações com o Banco Central do Irã e instituições financeiras iranianas designadas na Lista SDN.

Os dois navios mencionados no começo deste artigo, o MV Termeh e MV Bavand, bem como a empresa à qual eles pertencem, a Sepid Shipping Company Limited estão listadas na SDN e daí o temor da Petrobrás, que tem ações comercializadas nas bolsas americanas e transações financeiras que passam por bancos americanos, de entrar em uma transação comercial (venda de combustível) com estes navios.

Ocorre que, a mesma política americana que cria os embargos econômicos, prevê algumas exceções, ou seja, algumas operações que não estariam sujeitas aos embargos, em especial a importação pelo Irã de comida e medicamentos.

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É sob esta janela que as exportações brasileiras para o Irã se construíram nos últimos anos.

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Em princípio, a venda de combustível para os navios envolvidos naquelas operações excluídas do embargo deveria seguir o mesmo benefício, por isso, estranha-se a postura da Petrobrás neste caso específico. Não se deve afastar a possibilidade de a empresa estar apenas refletindo o alinhamento do atual governo aos desejos norte-americano, ainda quem em aparente detrimento às exportações do agronegócio brasileiro. Não podemos esquecer as primeiras manifestações do novo governo que geraram desconforto com os países árabes e com a China logo no início desta nova gestão.

Quanto à responsabilidade dos exportadores brasileiros em relação aos contratos de venda e compra do milho embarcado naqueles navios iranianos, a partir da assunção de que estes contratos tenham sido celebrados sob a cláusula FOB, acreditamos que não haverá maiores repercussões, salvo pela eventual perda de oportunidades futuras de novas negociações.

*Frederico Favacho e Ana Luiza Sanches, sócio e associada do Mattos Engelberg Advogados

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