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A PEC do Teto não requer calote nos precatórios

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Por Renato de Mello Silveira
Atualização:
Renato de Mello Jorge Silveira. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

E eis que o Congresso Nacional encontra o caminho que dispensa o calote nos precatórios ao promulgar parte da PEC 23/2021 da qual decorre espaço orçamentário, para 2022, de R$ 60 bilhões, como apontado por Miriam Leitão (https://blogs.oglobo.globo.com/miriam-leitao/post/pec-dos-precatorios-quem-diria-nao-e-mais-dos-precatorios.html)

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O texto promulgado prevê regra que assegura espaço adicional mais do que suficiente a que o Executivo assuma as despesas do Auxílio Brasil, de R$ 46,9 bilhões (Relatório da Instituição Fiscal Independente - IFI, n. 58) e ainda outras que lhe aprouver sobre o teto de gastos. Trata-se da tal "sincronização", pela qual, o Teto de Gastos passará a ser corrigido pelo IPCA de janeiro a dezembro e não mais, de julho a junho. Essa regra assegura espaço de R$60 bilhões acima apontado de liberdade para o Governo gastar em 2022.

Como se os aproximados R$60 bilhões para 2022 não bastassem, a regra da "sincronização" da PEC do Teto gera, para 2021, adicionais R$15 bilhões vinculados a gastos com a pandemia. O orçamento passou, portanto, a suportar com larga folga o espaço adicional de R$ 46,9 bilhões par ao Auxílio Brasil.

A despeito desse robusto espaço fiscal, persiste em tramitação a PEC do Calote que, para assegurar algo em torno R$26 bilhões sob o teto de gastos, pretende autorizar a União a deixar de pagar, até 2026, mais da metade dos precatórios, com potencial de gerar dívida que, segundo a mesma IFI (Comentário n.  14), pode chegar a R$ 744,1 bilhões.

O pretexto - que sempre foi ilegítimo e insuficiente - para que o Brasil "pedale" os precatórios devidos, gerando dívida de quase R$ 1 trilhão, não sobreviveu à promulgação da PEC do Teto. Em outras palavras, a PEC do Teto não requer calote nos precatórios.

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Desde o início dessa novela sobre os precatórios, estamos nós, eu, você e os que serão assistidos pelo Auxílio Brasil, a "pagar o pato". Houve aumento na taxa de juros de longo de prazo (de 9% para 12%)[1], elevação da taxa SELIC (2,0% para 9,25% entre e março e dezembro de 2021) na frustrada tentativa de conter a inflação, desvalorização em 8,25% do real em relação ao dólar[2], e incremento em 24% do índice CDS[3], a demonstrar a perda de credibilidade do país e a deterioração da economia nacional.

É de espantar que o Congresso Nacional disponha de recursos públicos e do tempo de seus membros para prosseguir com a pretensão de dar um calote nos detentores dos precatórios sob a pecha de que tal trambique seria necessário a garantir o Auxílio Brasil, já assegurado, e com larga margem, pelo texto desmembrado da malfadada PEC 23/2021, promulgado na tarde ontem. Qual seria o uso a ser dado a esse espaço orçamentário que se busca obter à custa do calote? Os fins não justificam os meios. Mas, ainda que assim não fosse, e pudesse, o Estado deixar de pagar uma dívida para escolher gastar com o que lhe parece mais favorável, há um custo - político, econômico, financeiro e fiscal - nessa escolha. Esperamos que economia estagnada e a inflação na casa de 2 dígitos sensibilize o Legislativo, tanto quanto impacta no nosso dia a dia, a fazê-los rejeitar o imoral caminho da insolvência., Se o Congresso persistir nesse descalabro injustificado, restará ao Supremo Tribunal Federal restabelecer a credibilidade de nosso país.

*Renato de Mello Silveira é presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP)

[1] "As taxas de maturac?a?o mais longas tambe?m aumentaram de maneira expressiva, representando um aperto nas condic?o?es de financiamento" (Relatório IFI 58, pág. 6)

[2] https://www.poder360.com.br/economia/real-foi-a-16a-moeda-que-mais-desvalorizou-em-2021-diz-austin-rating/

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[3] https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/10/risco-brasil-tem-alta-de-24-no-ano-e-reforca-piora-do-cenario-para-investidores.shtml

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