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A nova proteção judicial disponível para empresas

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Por Luiz Roberto Ayoub e Pablo Cerdeira
Atualização:
Luiz Roberto Ayoub e Pablo Cerdeira. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A Lei de Recuperação de Empresas, uma das mais importantes para um país tão acostumado a crises, em especial nesse momento de pandemia causada pelo coronavírus, foi aperfeiçoada. Na vigência da lei anterior, de 2005, passaram por recuperação empresas como Varig, OGX, Oi, Editora Abril, Queiróz Galvão Óleo e Gás, Odebrecht, João Fortes, dentre outras. Segundo a consultoria Alvarez e Marçal, somente até o ano de 2019, mais de 240 bilhões de reais estiveram envolvidos em processos recuperacionais. E engana-se quem pensa que o desaparecimento de algumas dessas marcas significa falta de êxito da lei. Muitos dos ativos, tecnologias e empregos gerados por elas continuam a funcionar, às vezes em novas empresas por meio de suas aquisições, às vezes com novos nomes.

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Mas, depois de 15 anos desde sua primeira versão, temos agora um novo e melhorado sistema que objetiva preservar e estimular a preservação de empresas, empregos, recolhimento de tributos. Enfim, toda a economia. E as novidades são muitas.

Algumas características permanecem. Dentre elas, talvez a mais importante seja a de que a Lei não é apenas de recuperação de empresas, mas de proteção das bases de nosso sistema econômico. Também permanece o fato de que ela é uma lei multidisciplinar, exigindo conhecimentos múltiplos de quem com ela trabalha, como economia, administração, contabilidade etc. A falta dessa conjunção de conhecimentos pelos operadores do direito sempre foi um desafio enorme à sua realização plena.

Dentre as novidades, o próprio processo de reforma da Lei de Recuperação merece destaque. Ela é resultado de um amplo processo de debates envolvendo incontáveis atores da sociedade. Não é uma lei elaborada apenas pelo Congresso. Imperfeita, sem dúvida, mas caberá agora ao Judiciário, aos advogados, ao Ministério Público e às empresas atuar para seu aperfeiçoamento.

Das numerosas alterações havidas no texto da lei, vale especial atenção à inovação trazida ao tratamento diferenciado àqueles credores que, apostando na recuperação da empresa, decidem investir, injetando recursos. Esse sempre foi um grande desafio na recuperação pois, em regra, as chances de sucesso são atreladas à existência de dinheiro novo no negócio. Nesse sentido, a lei, desde o seu nascedouro, vem sendo tratada como uma lei de estímulos, exatamente com o propósito de atrair todos que tem uma visão mais prospectiva.

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Apesar de esse tratamento diferenciado ser considerado, para alguns, uma violação de um dos principais pilares da Lei de Recuperação, qual seja, o tratamento igualitário de todos os credores, tanto a doutrina quanto a jurisprudência já vinham se debruçando sobre o tema. Na própria recuperação judicial da Varig, a primeira do país e que esteve sob meu comando quando magistrado, adotamos essa flexibilização para garantir o ingresso de recursos. Essa foi uma medida que garantiu que diversos ativos da Varig pudessem permanecer funcionado até sua incorporação por outras empresas. E o caminho adotado pela nova lei foi o de confirmar esse entendimento: sim, poderá ser dado tratamento diferenciado aos que investem na recuperação, em favor de todos, ao final. Trouxe mais segurança para os credores, para os investidores e para toda a sociedade.

Ainda dentro do escopo de incentivar a participação de diversos atores na busca da reorganização empresarial, a nova lei também inovou ao prever o que se chama de "Debtor-in-possession Finance", ou "DIP Finance". É o que se propôs recentemente no caso da recuperação da Avianca. Trata-se de mais um importante estímulo à injeção de recursos em empresas estranguladas, ao mesmo tempo em que oferece prioridade ao e transparência ao financiador, já que todo o processo se dá sob supervisão do Judiciário, do administrador judicial, do ministério público e da sociedade. Em uma recuperação judicial todas as contas, contratações e investimentos da empresa passam a ser públicos. Tal medida tem o potencial de criar todo um novo mercado de crédito para empresas em dificuldades, que esperamos oferte dinheiro novo a custos mais baixos.

Esses são apenas dois dos muitos pontos aperfeiçoados com a nova Lei de Recuperação de Empresas. Há muitos outros e muitos também dependentes de interpretações a serem realizadas pelo Judiciário, pelos advogados e pelo ministério público. E é nesse momento que todos os atores envolvidos devem estar cientes de que, ao tratar de uma recuperação judicial, em jogo estão muito mais do que as contas da empresa. Estão empregos, negócios, tributos e toda nossa economia. O Congresso fez o seu papel e não poderia ter feito em melhor momento. Com as novas regras, um jogo novo se inicia. Agora a bola está conosco, atores do direito, do sistema financeiro e da sociedade.

*Luiz Roberto Ayoub e Pablo Cerdeira são sócios do Galdino & Coelho Advogados

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