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A nova preocupação da Justiça com direitos dos animais

Por Vanessa Salem Eid e Julia Fernandes Guimarães
Atualização:
Julia Fernandes Guimarães e Vanessa Salem Eid. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Mesmo com a crise econômica que atingiu o país nesses últimos anos, desde 2013 o mercado de produtos e serviços para pets cresce muito no Brasil. Chegou a atingir, em 2018, a segunda posição do mundo.

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Esse crescimento decorre do fato de o Brasil ser o quarto país no ranking mundial com mais animais domésticos, contando com aproximadamente 132 milhões de animais. São 53 milhões de cães, 38 milhões de aves, 22 milhões de gatos e 18 milhões de peixes ornamentais.

Com tantos animais domésticos residindo em todos os tipos de residências (sítios, casas ou apartamentos), o Poder Judiciário precisou voltar seus olhos para garantir uma boa convivência dos donos de animais e seus vizinhos.

Como se sabe, a convivência dentro dos condomínios é estabelecida pelo Regimento interno ou a Convenção de Condomínio, devendo sempre ser preservado o direito do proprietário de uso, gozo e disposição da unidade condominial. Entretanto, tais direitos não podem prevalecer em relação aos direitos dos demais condôminos, tais como o direito ao sossego, a salubridade, a segurança, etc.

Na tentativa de assegurar um equilíbrio entre os direitos apontados, regulados pelo Código Civil, o Superior Tribunal de Justiça, em sede Recurso Especial nº 1.783.076/DF, entendeu que a "norma condominial que proíbe indistintamente qualquer tipo de animal dentro do apartamento consiste em excesso normativo que fere o direito de propriedade". Ou seja, os estatutos condominiais não podem proibir - genericamente - seus condôminos de possuir animais de estimação.

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O Superior Tribunal de Justiça apontou que, tratando-se do convívio em condomínio, pelas regras não possuírem critérios muito objetivos, o bom senso deverá ser utilizado para solucionar os conflitos, caso a caso.

Recentemente, uma decisão proferida no Juizado Especial Cível da Comarca de Florianópolis (Processo 0300636-04.2019.8.24.0091) causou estranheza ao determinar que uma moradora se desfizesse de dois de seus quatro cães, por entender que o direito ao sossego dos vizinhos estava sendo violado.

A moradora, uma pessoa idosa, com transtornos depressivos comprovados, ajuizou ação indenizatória contra o condomínio e seu vizinho de lado. Alegou que encontra em seus quatro animais (cachorros da espécie Lulu da Pomerânia) uma forma a minimizar seu sofrimento.

Por sua vez, o vizinho da moradora, alegando que não consegue ter sossego, em pedido contraposto, pleiteou que os quatro cachorros fossem retirados do apartamento.

A Justiça entendeu que os quatro animais, que latem por instinto, estavam comprometendo o direito de sossego dos demais condôminos e, por isso, determinou que a moradora se desfizesse de dois deles, sob pena de multa diária, arbitrada em R$ 300 (trezentos reais). A decisão foi objeto de recurso pela moradora. O recurso está pendente de julgamento pelo Colégio Recursal do Estado de Santa Catarina.

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No caso em tela, temos um conflito aparente de direitos. De um lado, está o direito da moradora de ter seus animais domésticos. De outro, o direito de sossego de seus vizinhos. Acertadamente, a Justiça entendeu que não é razoável, em um apartamento com de 50m², existir quatro cachorros, até porque esses animais precisam de espaço para latir e brincar.

Apesar de a decisão determinar a retirada de dois animais, a fim de garantir o sossego dos demais moradores do prédio, ao garantir a permanência de outros dois, a sentença acaba refletindo essa nova preocupação do Judiciário com o direito dos animais, que hoje em dia estão longe de serem considerados simples coisas.

*Vanessa Salem Eid é advogada com atuação em Direito Civil e Família do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados; Julia Fernandes Guimarães é advogada com atuação em Direito Civil e Consumidor do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados

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