Não bastasse o estado de vulnerabilidade dos brasileiros em razão do desemprego, da imensa informalidade do mercado de trabalho, da falta de crescimento econômico e, agora, da pandemia do coronavírus, a MP nº 927 tem o condão de instalar o caos no país.
Ao possibilitar a suspensão do contrato de trabalho por quatro meses por acordo individual com compensação não salarial definida "livremente entre empregado e empregador", está claro que o risco do negócio (leia-se, do prejuízo) foi transferido aos trabalhadores.
Fosse uma expansão econômica e lucrativa sem precedentes, como houve no passado, sabe-se bem para quem iriam essas divisas.
Nessa extrema condição de vulnerabilidade, qualquer um aceita qualquer coisa para não ir ao desemprego. Por esse motivo, historicamente, o Direito do Trabalho detém normas de caráter obrigatório e impunha limites à negociação individual, cada vez mais flexibilizados.
Não se pode pensar o Direito do Trabalho pelo eixo Paulista-Faria Lima, em que estão os trabalhadores mais qualificados e bem remunerados do país. O país é um continente de desigualdades sociais e essa tem que ser o foco das medidas governamentais.
Assim, sejamos bem claros: a MP 927 propõe que o empregador pague ao empregado o quanto quiser. Basta contratar um curso em EAD por R$ 9,99. O efeito social devastador para os demais trabalhadores (pois os informais já sofrem) que ficarão sem remuneração, sem alimentos e remédios em sua casa, pode se transformar em caos na segurança pública, ou pior, o que Nick Hanauer alerta há tempos.
Haveria necessidade, portanto, de que se assegurasse a estabilidade do emprego e renda mínima ao trabalhador; que o empregador fosse financiado sem juros por fundos públicos para conseguir passar esses períodos de crise.
O momento não é de restringir renda e de desestabilizar as famílias.
A socialização do risco do negócio, a garantia de emprego e renda, ainda que sejam pelo endividamento público, fomentariam um círculo econômico mínimo e maior estabilização social para evitar o pior.
*Farley Roberto R. de C. Ferreira, presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2a Região (AMATRA-2)