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A livre manifestação do pensamento e o Direito Penal. Breve resumo

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Por César Dario Mariano da Silva
Atualização:
César Dario Mariano da Silva. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Não defendo qualquer tipo de ataque a pessoas ou a Instituições, mas todos têm o direito constitucional de expressar sua opinião, dentro dos limites da razoabilidade, fazendo-o de forma proporcional, de modo a não incorrer em nenhuma figura típica, como crime de ameaça e contra a honra.

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O artigo 5º, inciso IV, da Carta Constitucional dispõe: "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato". É uma norma constitucional, que faz parte das chamadas liberdades públicas, integrante do núcleo intangível da Constituição por ser um dos direitos inerentes à cidadania e à personalidade.

Como esse direito é de cunho constitucional, sendo na realidade uma regra, ou existe ou não existe, vale ou não vale. Somente uma outra norma constitucional poderia reduzir esse direito.

Lembro, ainda, que o direito à livre manifestação do pensamento é o primeiro a ser suprimido ou limitado em países totalitários (censura).

Toda autoridade pública ao assumir cargo de relevo perde parcela de sua intimidade, vida privada e do direito à preservação da imagem. Mas nem por isso podem ser ofendidas ou ameaçadas.

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Contudo, deve ser realizado juízo concreto sobre o que é crime ou o exercício do direito de crítica, que muitas vezes é exercido de forma contundente, mas nem por isso deixa de ser crítica.

Qualquer pessoa ou Instituição, não estando livre disso o STF e chefes de Estado, podem ser criticados, cabendo ao Poder Judiciário realizar juízo de ponderação de valores para chegar à conclusão sobre a natureza jurídica da crítica (exercício de um direito ou crime), observando que medidas desproporcionais devem ser coibidas.

Até na Lei de Segurança Nacional há dispositivo expresso que permite a exposição, a crítica ou o debate de quaisquer doutrinas, dizendo que tais atos não constituem propaganda criminosa (art. 22, § 3º, da Lei nº 7.170/1983).

Referida lei tem como bens jurídicos protegidos a integridade territorial e a soberania nacional, o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito e a pessoa dos chefes dos Poderes da União (art. 1º, da Lei nº 7.170/1983).

Com efeito, para que seja aplicado qualquer um dos seus tipos penais, há necessidade de ato concreto que coloque em risco um desses bens jurídicos, lembrando que a mera crítica ou exposição de doutrinas (com exceção do nazismo, que é proibido por lei), são permitidas constitucionalmente e pela própria lei de segurança nacional.

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Todo delito de opinião deve possuir a finalidade criminosa, ou seja, de descumprir a lei de modo que se adeque a uma norma penal incriminadora que a puna, como os crimes contra a honra.

A simples crítica, debate de ideias, insatisfação com alguma coisa, intenção de corrigir ou de se defender, não são condutas típicas penalmente.

Qualquer crime contra a honra possui o elemento subjetivo do tipo específico de caluniar, de difamar ou de injuriar pessoa determinada, não bastando a mera conduta objetiva que se adeque a um tipo penal.

No que tange ao crime de ameaça, previsto no artigo 147 do Código Penal, a conduta praticada deve ter o potencial de causar medo ou intranquilidade e ser voltada para essa finalidade.

Ameaçar é, portanto, revelar à vítima o propósito de causar-lhe um mal injusto e grave, atual ou futuro. A promessa de mal pode ser da produção de dano ou perigo, pouco importando qual deles seja prenunciado pelo agente.

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A ameaça, que pode ser externada por qualquer meio (palavras, gestos ou simbólicos), deve ser injusta e portar potencialidade intimidativa, ou seja, ser séria e idônea à intimidação. Assim, aquele que ameaça colocar um título em protesto ou chamar a polícia, não comete crime, pois a ameaça não é injusta. Da mesma forma, a ameaça feita em tom de brincadeira não é idônea a intimidar o homem médio e não caracterizará o delito.

Destarte, sendo o mal prometido justo ou se não for grave, não haverá o delito por ausência de adequação típica. Já a ameaça sem potencialidade intimidativa, ou seja, que não seja capaz de amedrontar ou trazer intranquilidade à vítima é crime impossível.

Para a caracterização do delito é indiferente que o agente tivesse a intenção de cumprir o mal prometido ou que lhe fosse possível fazê-lo. É suficiente que possa causar à vítima intranquilidade ou medo.

Enfim, não se deve confundir o exercício de direito protegido constitucionalmente com a prática de crime, que o transborda e se adequa perfeitamente a uma norma penal incriminadora, anotando que a dúvida sempre se resolve em favor do acusado.

*César Dario Mariano da Silva, procurador de Justiça - SP. Mestre em Direito das Relações Sociais. Especialista em Direito Penal. Professor Universitário. Autor de vários livros, dentre eles Manual de Direito PenalLei de Execução Penal ComentadaProvas IlícitasEstatuto do Desarmamento Lei de Drogas Comentada, publicados pela Juruá Editora

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