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A (in)eficácia do bloqueio do telegram e os limites da liberdade de expressão

Por Leonardo Tajaribe Jr.
Atualização:
Leonardo Tajaribe Jr. FOTO: ARQUIVO PESSOAL  

A liberdade de expressão é, notadamente, um dos principais pressupostos que sustentam o Estado Democrático de Direito, ao passo que este caracteriza-se, sobretudo, pelo livre exercício das liberdades individuais dos cidadãos, submetendo-se às barreiras existentes na liberdade do próximo.

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Noutras palavras: A liberdade do indivíduo encontra seus limites no momento em que ofende as liberdades do grupo a que pertence e de seus integrantes, de forma que nenhum direito constitucionalmente atribuído é absoluto, devendo ser reprimido pelos desvios no seu exercício.

Desta forma, a liberdade de expressão, garantida pelo Art.5º, inciso IX da Constituição Federal, é uma das garantias essenciais para a solidificação da liberdade que um indivíduo deve ter dentro de um grupo social, de forma que não pode ser suprimida por censuras, como ocorria nos períodos ditatoriais, os quais marcaram o desenvolvimento de nossa democracia.

E é neste contexto que surgem algumas limitações - talvez necessárias - ao exercício da liberdade de expressão, as quais aplicam-se não de forma direta, através da censura como ocorria em tempos idos mas, desta vez, por meio do impedimento de uso de veículos digitais comumente utilizados para a prática de infrações penais e propagação de falsas notícias.

Nesta linha, o bloqueio do Telegram - aplicativo de mensagens instantâneas semelhante ao WhatsApp - determinado na última semana por decisão monocrática do Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), destacou-se, a princípio, como uma polêmica restrição ao direito de liberdade de expressão.

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Dentre os fundamentos da decisão emanada da mais alta Corte - a quem cabe, inclusive, a guarda da constituição e de seus direitos e garantias - está a justificativa de que o aplicativo é conhecido por não cooperar com as autoridades judiciárias e com suas decisões, além de se destacar como um meio para a prática de crimes.

Além disto, salienta-se que a decisão de bloquear o Telegram alinha-se com as iniciativas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para mitigar a disseminação de Fake News no período eleitoral, as quais podem tipificar crimes contra a honra, além de embaraçar o processo legislativo democrático, através da propagação de desinformações sobre os candidatos e suas propostas, comprometendo a higidez necessária para as eleições.

Contudo, apesar dos esforços da Polícia Federal ao solicitar o bloqueio do aplicativo, e do STF ao determina-lo, a iniciativa pode se mostrar ineficaz na prática.

Isto porque, a despeito da ordem de bloqueio dos serviços, os usuários podem utilizar meios alternativos que burlem a proibição, como é o caso das redes VPN (Virtual Private Network), obtendo o acesso a serviços bloqueados através da criação de um endereço de IP (Internet Protocol, o endereço de internet de um servidor), fazendo com que os dados que passam pela rede deixem de ser identificáveis, através de um sistema de criptografia.

Pode-se mencionar, ainda, a utilização de Proxys, que geram endereços de IP de outras regiões para que possam ser utilizados em serviços bloqueados, fazendo com que o usuário possa utilizar o Telegram no Brasil, como se tivesse na Suiça, por exemplo, onde não há o bloqueio.

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No entanto, a determinação de bloqueio do Telegram também fixou, para fins de coerção, uma multa diária de R$100 mil para os que fizerem uso dos mencionados artifícios com a finalidade de burlar a proibição, além das providências criminais atinentes à desobediência da ordem judicial.

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Porém esta medida também aparenta ser ineficaz, uma vez que a aplicação das referidas reprimendas, de efeitos cíveis e criminais, dependeria da determinação e individualização dos "trapaceadores", o que é especialmente difícil, levando em consideração a adoção de criptografia nestes mecanismos, os quais objetivam, exatamente, burlar a identificação dos usuários.

Há, ainda, a possibilidade de utilização de outros mensageiros de grande abrangência, como o WhatsApp, ou até mesmo as plataformas do Facebook e Twitter.

Em conclusão, nota-se que a medida adotada pelo Supremo Tribunal Federal se apresenta mais como um ruído desesperado de combate à disseminação de Fake News e infrações penais praticadas por meios digitais do que como uma iniciativa eficaz, sendo importante que se adote um trabalho sério e comprometido de enfrentamento à propagação de informações falsas e aos crimes digitais, assumindo-se o fato de que suspensões temporárias e pouco sancionatórias não possuem o condão de impedir a prática delitiva.

*Leonardo Tajaribe Jr., advogado criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). Delegado de Prerrogativas da OAB/RJ e membro da Comissão de Direito Penal e Processual Penal da 32.ª Subseção da OAB/RJ

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