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A energia que vem do lixo -- e por que ela deve ser aproveitada

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Por Jorge Rogério Elias
Atualização:
Jorge Rogério Elias. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Em meio à crise hídrica e às discussões sobre as alternativas para se evitar um novo apagão - risco iminente no país, dizem os especialistas -, há um potencial de aproveitamento energético ainda pouco explorado, mas que pode fazer uma diferença relevante. Falo do potencial de energia limpa, gerada a partir do tratamento e da valorização dos resíduos sólidos urbanos, que podem vir a representar entre 3% a 5% da matriz elétrica brasileira.

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A atual capacidade instalada de geração de energia no país fica ao redor de 180 GW e o consumo elétrico, de 70 GW médios. A nossa capacidade de geração é bem abrangente, podendo ser considerada dentre as mais diversificadas e limpas do mundo. Desta forma, na teoria, há uma capacidade instalada de geração de energia elétrica suficiente para atender ao mercado consumidor, mesmo nos períodos de restrição hídrica.

Entretanto, a situação não é tão simples como parece. Historicamente, existe uma predominância de geração hidrelétrica na matriz elétrica brasileira. Ao longo dos últimos 15 anos, mesmo com o incremento de grandes aproveitamentos hidrelétricos, a capacidade de armazenagem de energia está proporcionalmente menor em relação a produção e ao consumo de energia elétrica do país. Isso porque os novos empreendimentos têm sido implantados no modelo "fio d´água", isto é, sem reservatório. Simultaneamente, parte expressiva do crescimento do parque de geração brasileiro, nos últimos 10 anos, se deu através de fontes renováveis intermitentes, que dependem de questões climáticas, com destaque para as fontes eólica e solar.

Desta forma, apesar da matriz diversificada, do uso intensivo de fontes renováveis e da predominância da geração hidrelétrica, existe a necessidade da utilização de termelétricas de maneira a permitir um maior equilíbrio entre as fontes e prover segurança energética para o país. A ampliação do parque termoelétrico trouxe maior segurança energética ao mesmo tempo que ocasiona o aumento do custo médio da energia. Ou seja, não é uma equação de solução fácil.

Neste contexto, qual o preço da segurança energética? Qual o preço da falta de energia elétrica? É preciso questionar ainda o custo ambiental com a utilização de combustíveis fósseis na geração de energia e com a disposição inadequada do resíduo sólido urbano. E para evitarmos o racionamento, quanto devemos pagar pela energia? R$ 1 mil/Mwh? R$ 2 mil/Mwh, R$ 3 mil/MWh...este é o ponto!

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Felizmente temos um parque de geração e um sistema de transmissão bem mais robusto e diversificado que em 2001, o qual possibilita manobras de carga e transferência de energia, entre as diferentes regiões do país, permitindo maior segurança. Ainda assim, a atual crise é pelo menos tão grave quanto à anterior, senão maior.

Nesta linha, apesar da energia que vem do lixo não ser a solução energética definitiva para o Brasil, pode vir a ser uma alternativa inteligente. Atualmente, o setor de resíduos sólidos urbanos, contribui com um percentual de cerca de 0,5% do consumo elétrico médio do Brasil. Trata-se de um sistema com tecnologia madura, segura, de funcionamento contínuo, que contribui com a redução da emissão de metano para a atmosfera, além de ser proveniente de fonte renovável. Nas condições adequadas de contratação, o setor pode multiplicar por dez a atual contribuição à matriz elétrica, através do uso de novas tecnologias.

Dadas as características de localização dos aterros sanitários, distribuídos de forma estratégica e proporcional à distribuição demográfica da população, a ampliação da geração de energia a partir do lixo tem o potencial de reduzir as perdas nas linhas de transmissão e distribuição, garantir maior segurança energética, com geração de energia estável, sem dependência das condições do clima e com uma pegada positiva quanto a captura de carbono.

O setor de resíduos sólidos urbanos possui condição de gerar energia elétrica 12 meses por ano, 24h/dia. Geração contínua e próxima aos pontos de consumo.

O melhor aproveitamento do potencial da recuperação energética do lixo possibilitará maior competitividade à indústria nacional, com geração de emprego de qualidade, a exemplo do que já ocorre na Europa, nos Estados Unidos e na Ásia. A indústria brasileira de bens e serviços também se beneficiará através da fabricação de máquinas e equipamentos, desenvolvimento de tecnologia e prestação de serviço.

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O país produz anualmente cerca de 80 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos, segundo a ABRELPE, e cerca de 60% são destinados em locais ambientalmente adequados (aterros sanitários), mas outros 40% são depositados em espaços inadequados (aterros controlados e lixões).

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Especificamente para enfrentamento da crise hídrica e suas eventuais consequências no fornecimento de energia elétrica, encontra-se em andamento um chamamento público emergencial para contratação de energia elétrica adicional, proveniente de quaisquer fontes despacháveis, com fornecimento até dezembro do ano de 2022. Trata-se de medida excepcional, com valores de contratação que podem superar o patamar de R$ 2.000,00/Mwh. O objetivo é preservar a segurança energética no sentido de que medidas mais duras não tenham que ser tomadas nos próximos meses.

No final de setembro será realizado um leilão para contratação de energia elétrica, promovido pelo Governo Federal, que contará com um produto específico para a recuperação energética de resíduos sólidos urbanos. Esta é uma importante sinalização para setor e demonstra que a sociedade está mais madura, preocupada com as questões ambientais, com as questões sanitárias e com o preço da falta da energia elétrica. É um bom sinal de evolução.

*Jorge Rogério Elias é engenheiro mecânico, formado pela UFSC, pós-graduado pela FGV, especialista em processos industriais, fontes de energia, eficiência energética, mercado de energia e administração de negócios. Diretor de Engenharia e Implantação da Orizon Valorização de Resíduos

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