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A curiosa conversão extrema do PTB

Por Sílvio Ribas
Atualização:
Sílvio Ribas. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Caso vingasse o sonho do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) de filiar Jair Bolsonaro ao partido que preside, a história política brasileira ganharia mais um disparate. O atual chefe da Nação é o mais notório e influente defensor do regime militar desde a redemocratização consagrada nas urnas de 1989. E, curiosamente, essa ditadura se instalou no país em 1º de abril de 1964 com a derrubada do governo de João Goulart, um petebista. Em resumo: a maior legenda de esquerda da época do golpe hoje apoia a reeleição de um fã dos golpistas.

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O hipotético amálgama de contrastantes passado e presente só cristalizaria o progressivo afastamento da legenda de Jango das suas origens, culminado numa conversão extrema à direita. Desde o racha dos trabalhistas há exatos 40 anos até hoje, o velho PTB, fundado em 1945, no fim do Estado Novo, por Getúlio Vargas, vem se metamorfoseando no novo PTB, de Jefferson, Fadi Faraj e Oswaldo Eustáquio. Bolsonaro filiado serve de ponto final extra.

Renascido em 1981, o Partido Trabalhista Brasileiro sob a liderança de Ivete Vargas, sobrinha de Gegê, firmou-se numa seara conservadora, deixando o trabalhismo raiz para os dissidentes capitaneados por Leonel Brizola, que fundaria o PDT logo em seguida. Prova disso foram filiações ao PTB dos não-getulistas Jânio Quadros (SP) e Sandra Cavalcanti (RJ). Na Constituinte, o líder Gastone Righi (SP) defendia o assalariado, mas coordenava o Centrão.

Na sua cartilha de berço, o PTB lutava por soberania nacional, indústria forte e pelo socialismo ancorado em sindicatos de trabalhadores. Com o tempo, a forte inspiração no Labour Party do Reino Unido que o primeiro partido de massas do Brasil tinha se apagou por completo. A disputa com a UDN e PSD pelo posto de principal força do Congresso avançou com as reformas de base de Goulart e morreu no bipartidarismo imposto em 1965.

A partir da Anistia de 1979, líderes trabalhistas voltaram e refundam o PTB com apoio da Internacional Socialista, então destaque na Europa. Contudo, manobra do general Golbery tirou o partido do mando de Brizola, fato que o levou às lágrimas em público. O quadro hoje tem outro patamar. Preso por ameaçar a democracia e às instituições, Jefferson prega povo armado, sublevação e ataque homofóbico até contra aliados das últimas eleições.

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Aberto hoje a bolsonaristas e a integralistas, o PTB começou a dar sinais de afinidade maior com a direita ainda no governo de Michel Temer (MDB), quando, em março de 2018, a indicação da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), filha de Jefferson, para o Ministério do Trabalho gerou impasse. A indicada se defendia de reclamações trabalhistas de dois ex-funcionários e sua nomeação foi suspensa temporariamente pela presidente e ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia. Os fatos a inviabilizaram.

O partido que criou a Justiça do Trabalho há oito décadas defendia agora sua extinção, além de apoiar ampla reforma da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O atual processo de consolidação do quadro partidário do país poderá ajudar a dar mais consistência ideológica às agremiações, para tornar as siglas ao menos coerentes com suas visões programáticas.

*Sílvio Ribas, jornalista, escritor, consultor em relações institucionais e assessor parlamentar no Senado Federal

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